segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Intelectuais orgânicos e políticos apolíticos

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Quando um político é um homem de ideias, você pode prever e julgar suas acções em função do que ele diz mas, quando um político não é um homem de ideias, o que ele diz pouco importa, o que importa são os seus compromissos reais e a articulação desses compromissos no quadro da estratégia geral do seu partido e das forças que actuam no mundo, globalmente.


Por detrás de um político há sempre um intelectual, ou mais apropriadamente, um intelectual orgânico, conforme o linguajar de António Gramsci. Deste modo, quando um político dá um passo em falso, criticá-lo sem fazer um trabalho de desmascaramento dos intelectuais orgânicos por detrás dele é como querer limpar a bunda do elefante com cotonete. Isso simplesmente não funciona.

Um intelectual orgânico é, no final das contas, um propagandista, um activista e não um intelectual tout court, no mesmo sentido em que Aristóteles usava esse termo. Last but not least, as próprias organizações da sociedade civil da qual muitos desses intelectuais fazem parte não passam também daquilo que o mesmo Gramsci chamava de partido ampliado.

Uma diferença bastante demarcada entre intelectual orgânico e intelectual reside no discurso de cada um. O discurso do primeiro tem que ser interpretado como o discurso do agente, o qual é sempre retórico e visa o convencimento, a persuasão, tendo em vista uma acção da qual, o grupo que o intelectual orgânico representa sai sempre beneficiado. O discurso do segundo, i.e., o discurso do intelectual é sempre dialéctico e analítico e visa a intelecção.   

Não é preciso dizer que o discurso do segundo é mais confiável que o do primeiro pelo simples facto de que este, pelo menos do que se supõe, não tem nenhuma ambição de poder, se limitando simplesmente a tarefa de compreender a realidade e não a transformá-la a sua imagem e semelhança como é a pretensão do primeiro.

Em suma, a diferença entre intelectual e intelectual orgânico está dada na 12a tese de Marx contra Ludwig Feuerbach, ou seja, enquanto um procura descrever a realidade tal como ela é, o outro sonha em transformá-lo a imagem e semelhança do seu delírio de “igualdade cósmica” como diz Thomas Sowell.

Os exemplos de intelectuais orgânicos medram e abundam na história do pensamento universal. Toda escola de Frankfurt era composta de intelectuais orgânicos. O próprio Gramsci, inventor do termo, era um deles. Hoje em dia, se calhar, a nível internacional, o mais proeminente ou o mais incensado dentre eles seja o Noam Chomsky, se bem que o mais poderoso de todos eles somados seja o obscuro Alexander Duguin, que apesar de pouco conhecido é o próprio governo russo, chegando a ser apelidado de Rasputin de Putim.

No que tange ao nosso país, os intelectuais sois disant, na sua quase totalidade, são intelectuais orgânicos, activistas cuja tarefa, dada no próprio conceito de intelectual orgânico, não é compreender mas, sim, acumular poder nas mãos do seu grupo de interesse. Quer dizer, é aquele velho delírio auto-hipnótico de que o mundo vai mal porque nós não temos o poder e de que assim que todo o poder estiver concentrado na nossa mão, vai acontecer aquele click gramsciano e “tudo será mais belo” (sic).

A existência de intelectuais orgânicos não mostra apenas que as ideias que os políticos defendem em público são provenientes desses intelectuais que pontificam na televisão e nas cátedras universitárias, todos pagos a peso de ouro para dizer asneiras mas, também evidencia que esses políticos são homens sem convicção político-ideológica nenhuma, ou seja, são políticos apolíticos.

Num artigo postado neste blog com o título “o fim da política”, eu disse que, uma vez que a disputa política neste país se resumia a mera disputa de cargo e a troca de acusações de corrupção e má administração, a política havia acabado em Moçambique.

Um político apolítico que é o político que não quer fazer luta ideológica é um político de geleia ou de pudim, ou seja, ele não tem consistência como político. Resultado: ele acaba pendendo sempre para onde estiver doendo menos ou para aquele que estiver disposto a pagar um prémio mais alto e aí estabelece-se o clientelismo político dos “donos do poder” de que falou Raimundo Faoro.

É claro que, no meio de tudo isso, há excepções, elas são raras mas elas existem. Por exemplo, ao nível da história dos EUA, uma dessas excepções foi o Ronald Reagan. O presidente Reagan era um homem de ideias. Ele já sabia o que faria assim que se tornasse presidente dos EUA cerca de 40 anos antes de entrar para a política e nunca contou para ninguém, nem mesmo para a sua esposa. Ele era um homem cultíssimo apesar de não ter essa aparência que ele fazia questão de não ter. Mas, do lado oposto, temos o Franklin Roosevelt que era uma espécie de Maria-vai-com-as-outras.

Quando um político é um homem de ideias, você pode prever e julgar suas acções em função do que ele diz mas, quando um político não é um homem de ideias, o que ele diz pouco importa, o que importa são os seus compromissos reais e a articulação que esses compromissos têm no quadro da estratégia geral do seu partido e das forças que actuam no mundo, globalmente.

O papel dos intelectuais orgânicos torna-se muito mais importante na política porque os políticos, na sua maior parte, não são homens de ideias pelo que “bater” neles por proferirem insanidades ideológicas como abortismo, gaysismo, desarmanetismo, aquecimentismo, globalismo, etc., é, no final das contas, bater num espantalho, atacar um símbolo e não o substrato do poder mesmo, o qual até corre o risco de ser tornar mais poderoso sob o manto da invisibilidade como que a fazer jus a sentença de René Guenón de que “o segredo é da natureza do poder” (sic).

Não nos esqueçamos do que disse Gyorgy Lukács, a saber: “a política é um meio, o fim é a cultura”. Quem é que detém a hegemonia cultural em todos os países do mundo a não ser os intelectuais orgânicos? Seus livros superlotam as livrarias, eles dominam o debate na mídia, dominam as cátedras universitárias, moldam a opinião pública e assim por diante.

Ora, é claro que, enquanto essa gente não for desmascarada em público e sua ignorância e malícia for posta igualmente a execração pública, os olhos do povo não conseguirão enxergar as coisas de uma outra maneira porque o povo tem a ilusão de que esses senhores são o ersatz da verdade universal, quando não passam de uma caricatura grosseira da inteligência humana se comparados a um David Horowitz, Michael Horowitz, R.J. Rummel, Roger Scruton, Eric Voeglin, Hannah Arendt, Russel Kirk, Roger Kimball, Olavo de Carvalho, Thomas Sowell, e assim por diante.

ESCRITO POR|XADREQUE SOUSA|shathreksousa@gmail.com

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