domingo, 12 de fevereiro de 2017

John Lock e o mito da Tabula Rasa

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Quando um físico aquece os metais e vai vendo que eles dilatam, ele chega, por indução, a uma lei física geral de que o calor dilata os metais. Você aquecer os metais é experiência mas você induzir que o calor dilata os corpos também é experiência? De modo nenhum.
Veja, as maçãs não começaram a cair quando o Sir Isaac Newton estava sentado debaixo da massaleira. Porém, quantos chegaram ao conhecimento da gravitação universal? Somente Newton.
A observação e a experiência são importantíssimas para as ciências naturais, contudo, sem um esforço de pensar por cima dos dados da observação e da experiência nenhum conhecimento é possível.

O empirista John Locke no debate sobre a origem do conhecimento, disse que o conhecimento vem da experiência e que o homem nasce como uma tabula rasa. O empirismo e o racionalismo são daquelas teorias gerais que se refutam a si mesmas pela sua incapacidade de se auto-explicarem. Se todo conhecimento procede da experiência, segue-se que o conhecimento de que “o conhecimento procede da experiência” também procede da experiência e que J.Locke não teve que raciocinar para obtê-lo.

Se Locke nunca teve que raciocinar para obter os conhecimentos que ele obteve ao longo da sua vida, os quais foram obtidos por puro empirismo, então, nada impede que se conclua que Locke não era racional. Agora, se uma das notas que integram e definem o conceito homem é a nota da racionalidade, então, Locke não era homem. Se ele não era homem, então, ele não poderia ter tido nenhum conhecimento humano por experiência. Ponto. Isso é suficiente para colocar Locke no hospício com direito a camisa de força e tudo.

 Locke diz que o homem vem ao mundo como uma tabula rasa, porém, só isso já é suficiente para desmascará-lo porque a tabula rasa traz mais conhecimento em seu bojo do que Locke poderia imaginar, aliás, ele não tinha imaginação nenhuma e é por isso que confundiu o termo “rasa” com “nihil”, que seria o puro vazio.

Há riqueza enorme de conhecimento numa tábula rasa que vai desde o conhecimento de que ele é uma tabula; o conhecimento das propriedades físicas e químicas da própria tabula; o conhecimento geométrico decorrente do facto dela ser rasa, porque se ela é rasa, pelo menos sabemos que ela tem uma inclinação de 180 graus de ângulo; o conhecimento de que a tabula rasa é de género gramatical feminino, número singular até o conhecimento de que ela tem uma massa e ocupa espaço. Ora, se isso não é conhecimento, então, eu não sei o que é conhecimento.

 Nem o empirismo, nem o racionalismo são as únicas fontes do conhecimento. Porém, dizer que só existe conhecimento empírico e que todo mundo nasce como uma tabula rasa é de uma puerilidade atroz como acabei de demonstrar. Leibniz, um racionalista, dizia que o homem já nasce doptado de conhecimento só que é um conhecimento em potência que vai-se actualizando com a experiência. Isso, até, faz de Leibniz um racionalista-empirista. Porém, seja como for, me parece mais concreta essa proposta de Leibniz do que a de J.Locke, lembrando que concreto só quer dizer crescer junto.

Não sei se Locke leu Aristóteles, porém, de duas, uma: ou ele não tomou conhecimento das polaridades aristotélicas de acto-potência, essência-existência, forma-matéria, substância-acidente; ou ele tomou e jogou tudo no lixo por não ter compreendido ou por birra, caso contrário, ele não teria caído nessa infantilidade e como diziam os escolásticos: “tertium non datur”.

Sto. Tomás de Aquino diz que racionar é “pensar de um conhecimento conhecido para um conhecimento desconhecido” (sic). Quer dizer, tem que haver um ponto de partida para cada conhecimento e esse conhecimento é um outro conhecimento. Sto. Tomás de Aquino foi buscar isso em Aristóteles porque Aristóteles dizia que todo conhecimento novo vem de um conhecimento antigo. Tudo isso se dá em acto. Porém, onde estava o conhecimento da gravitação universal de Newton há 5.000 anos atrás? De qual conhecimento anterior ele tirou isso? De nenhum. Ele estava em potência. 

Onde estava todo o conhecimento da mineralogia antes que surgisse o primeiro mineralogista? Ele estava no mineral. Porém, se não houvesse em mim nada que permitisse actualizar esse conhecimento, eu não seria capaz de tê-lo. Isso não tem nada a ver com aquela tese de Kant de que nós conhecemos apenas as estruturas a priori da nossa mente e que não há conhecimento objectivo. De modo nenhum. Essa supressão do objecto pela chamada revolução kantiana é um excesso de dogmatismo abstraccionista.

Para haver conhecimento o sujeito tem de estar presente e o objecto também tem de estar presente. Diz o Olavo: “é essa presença mútua que é a origem do conhecimento” (sic). Agora, eu não conheço e não conhecerei nada que eu não posso conhecer. Quer dizer, antes que eu conheça a cor verde eu tenho que ter a priori a possibilidade de conhecer a cor verde, quer eu venha a conhecê-la ou não. Uma pedra não conhece a cor verde mesmo que você a pinte de verde ela nunca a conhecerá porque ela não tem essa potência do conhecimento da cor verde. Eu só conheço em acto aquilo que eu posso conhecer em potência.

Portanto, dizer que o homem nasce zero, zero, de conhecimento como pretende Locke e que ele só conhece em acto é uma palhaçada de deixar o Jimmy Carry morto de inveja porque ele tem que poder conhecer antes de conhecer. Ou seja, ele conhece em potência antes de conhecer em acto porque, na ordem do conhecer, a potência tem preeminência sobre o acto, enquanto na ordem do ser o acto tem preeminência sobre a potência como diz Mefistófeles em o Dr. Fausto de Goethe: “no princípio era o acto” (sic).

Agora, o filósofo Olavo de Carvalho diz que nem empirismo, nem racionalismo mas sim intuicionismo. Ele diz que não há conhecimento racional, que “todo conhecimento ou é intuitivo ou é nada” (sic) e, ele chama a isso de intuicionismo radical. O que ele entende por intuição é em suas palavras “a percepção imediata de uma presença” (sic), i.e., “um aqui e agora” (sic).

Seu fundamento é o seguinte: como é que você fecha um raciocínio lógico, um silogismo, por exemplo? É através de um outro raciocínio lógico? Por exemplo, você diz: “Todo homem é mortal/ Sócrates é homem/ Portanto, Sócrates é mortal”. Como é que você sabe que esse raciocínio está completo? É por um outro raciocínio e outro e outro indefinidamente? De modo nenhum porque aí você não terminaria nunca. É a intuição que fecha o esquema lógico de raciocínio.

Voltando para John Locke, quando um físico aquece o ferro e vê que ele dilata e depois aquece o bronze e vê que ele dilata e vai aquecendo outros metais e vai vendo que eles dilatam, ele chega, por indução, a uma lei física geral de que o calor dilata os metais. Você aquecer os metais é experiência mas você induzir que o calor dilata os corpos também é experiência? Também é um dado dos sentidos? De modo nenhum.

Veja, as maçãs não começaram a cair quando o Sir Isaac Newton estava sentado debaixo da massaleira, aliás, nessa altura, ele ainda nem era um Sir. As maçãs já caiam desde que Deus as criou. Porém, quantos chegaram ao conhecimento da gravitação universal? Somente Newton. Poderão dizer que Locke estava a falar de uma experiência controlada em laboratório como se faz nas ciências naturais. Pois bem? Quando é que surge a ciência experimental? Ela surge com Galileu a cerca de quatro, cinco séculos. Deste modo, podemos concluir que antes de Galileu não havia conhecimento? Isso seria um absurdo.

A observação e a experiência são importantíssimas para as ciências naturais, contudo, sem um esforço de pensar por cima dos dados da observação e da experiência nenhum conhecimento é possível. Quantos observatórios e quantos laboratórios existem no mundo? São milhares? Quantos deles produziram um conhecimento verdadeiramente novo nos últimos 100 anos? Talvez um ou dois. Mas porquê se eles fazem experiências todos os dias? Eis a questão. Não basta observar e experimentar é preciso mais do que isso, é preciso ter um Galileu, um Newton, um Planck, um Einstein, etc., para pensar por cima do que se observou e experimentou e um produzir um conhecimento novo.

Ps: Não confundir racionalismo com espiritismo que é uma outra confusão dos demónios.

ESCRITO POR|XADREQUE SOUSA|shathreksousa@gmail.com

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