quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

A falsa lógica do Dr. Lair Ribeiro

Resultado de imagem para dr. lair ribeiro
O poder não está nas mãos de quem controla a ciência mas sim de quem controla a cultura, o sistema de valores da sociedade e, me parece que essas campanhas mundiais acerca da alimentação sejam apenas uma espécie de laboratório de controlo social e não uma preocupação genuína com a saúde das pessoas, principalmente quando financiadas pelos governos ou pelos grandes think tanks cujo objectivo final, considerado do ponto de vista teleológico, é acumular poder.

O cardiologista brasileiro Lair Ribeiro, um conferencista de renome internacional que escreve livros de auto-ajuda na área de nutrição e outras como gestão de negócios, às vezes, chega a lançar mão de artifícios pseudo-lógicos que se não fossem erísticos, no mínimo, seriam pueris tal como tentar persuadir as pessoas a não comer margarina alegadamente porque nem as baratas comem-na (https://www.youtube.com/watch?v=iL-TcswloXQ)e tentar persuadí-las de que tomar leite faz mal à saúde porque o homem é o único animal que toma leite na fase adulta (https://www.youtube.com/watch?v=eZZD4cuvfd8).

Ora, não sei se o Dr. Lair sabe que as galinhas quando ficam velhas se tornam canibais. Sendo assim, porquê não dizer aos nossos avós que eles devem praticar o canibalismo, uma vez que até as galinhas velhas praticam o canibalismo?

Não sei se o Dr. Lair sabe que os macacos praticam pedofilia. Por quê raios não promover a pedofilia no seio familiar, uma vez que até os animais, vejam só, são pedófilos?

Os animais fazem sexo à vista de todo mundo, à vista dos filhotes. Ora, porquê não aconselhar os pais a fazerem uma suruba diante dos seus filhos na sala de jantar, no quintal da casa para os vizinhos verem? Oh, raios! Porquê é que somente os animais têm que ter esse privilégio tão saudável? Quanta opressão, meu Deus do céu, não é mesmo?

Há pessoas que estudam muito e, no entanto, são incapazes de fazer esse raciocínio elementar e passam a vida toda querendo animalizar todo o mundo. Quer dizer, agora, o exemplo que o ser humano tem que seguir são as macaquices dos orangotangos, o grunhido do porco-espinho, o cacarejar das galinhas d’Angola. O que é isso, afinal de contas? Quer dizer, perdeu-se completamente o senso de hierarquia e partiu-se para a profanação do humano.

Todos sabemos que o primeiro reino a aparecer neste baixo mundo é o reino mineral, depois vem o reino vegetal, depois o reino animal e por fim o reino hominal como o chamam os teósofos que, por sua vez, é o reino que abarca e subordina os demais reinos atrás mencionados.  Ora, o primeiro equívoco que o Dr. Lair comete é chamar o homem de animal. O homem não é um animal, ele é como um animal e, isso faz toda diferença. De facto, há diferença entre o homem e o animal. Leibniz dizia que a diferença entre o homem e o animal é que os animais têm consciência enquanto o homem tem autoconsciência.

Consciência significa saber que sabe e autoconsciência significa saber que sabe que sabe. É claro que o homem também tem consciência, ele também tem sensibilidade, ele também tem instintos, etc., assim como os animais os têm, porém, isso não significa que a diferença entre o homem e o animal seja específica, reduzida apenas a aquilo que um tem e o outro não tem, antes pelo contrário, como disse Xavier Zubir, a diferença entre o homem e o animal é total. Por outras palavras, a corporalidade do homem não é animal, é humana. Seus instintos, sua consciência etc., não são animais mas sim humanos.

Poderão alguns indivíduos versados em fisiologia humana dizer que do ponto de vista anátomo-fisiológico o homem e o animal são indistintos. Porém, se a essência de alguma coisa é aquilo em que ela se torna como dizia Hegel, temos, aqui, um problema. Ou seja, se a essência do ser humano é sua humanidade e esta só pode ser tomada incomutavelmente, vamos chegar a conclusão de que essa indistinção é apenas analógica e não rigorosa.  

By the way, se um determinado alimento faz bem ou se faz mal para a saúde, desse facto não se pode deduzir nenhum dever que imponha sobre as pessoas a obrigatoriedade legal de não consumi-los como está acontecendo com a campanha mundial contra os riscos de consumo da coca-cola em que determinados países como a Inglaterra chegaram mesmo a vetar o consumo da coca-cola para menores de idade, incluindo maioneses, manteigas de amendoim, sorvetes e uma lista adiante de coisas que o governo, sob a pontifícia autoridade científica, julga que faz mal a saúde das pobres crianças tão mal cuidadas pelos seus pais. O que seria das nossas crianças se o governo não interviesse, não é mesmo?

O que é tudo isso a não ser o bom e velho positivismo de Augusto Comte? E, a cada dia fico mais impressionado com a sentença de Hofmansthal de que “nada está na política de um país que não esteja primeiro na sua literatura”. É claro que Comte era francês mas sabemos do peso da cultura francesa na cultura universal com Descartes e, mormente desde a revolução jacobina de 1789. O que o Dr. Lair e o governo inglês e todos os positivistas do mundo ignoram é que eles cometem um erro lógico primário, ou seja, eles não sabem que de um facto não se deduz um dever. Ou seja, se comer manteiga faz mal a saúde, não se pode deduzir disso que não se deve comer manteiga. De modo algum. Antes, pelo contrário, o dever está vinculado a uma coisa chamada cultura, ou seja, está vinculado a um sistema de valores em torno do qual uma determinada comunidade constrói o seu imaginário colectivo. Por exemplo, o Dr. Lair diz que cozinhar os alimentos com banha de porco, banha de cordeiro, enfim, cozinhar com gordura animal é muito mais saudável do que cozinhar com óleo vegetal mas, desse facto, não se pode obrigar as pessoas a cozinhar com gordura animal ou proibi-las de cozinhar com óleo vegetal. Como é que você chegaria para um mussulmano e o aconselharia a cozinhar com banha de porco? Isso seria um pecado mortal. Como você chegaria para um judeu e o aconselharia a cozinhar com gordura de carneiro uma vez que o consumo de gorduras lhes foi vetado pela Torah?

Não quero entrar nessa discussão de se há alimentos que fazem mal e se há alimentos que fazem bem a saúde porque, na verdade, não há nada que não faz mal, até a água faz mal. By the way, estou inclinado a não crer que o mal e o bem estejam nos alimentos por mais venenosos que eles sejam, aliás, se eles são venenosos é porque não são alimentos mas uma outra coisa que tem uma outra utilidade, quiçá, no campo medicinal e assim por diante.

Doença tomada comutavelmente como objecto da nossa experiência é um mal físico e todo mal físico não é causa suis, antes pelo contrário é um mal causado por um outro mal, de uma outra natureza porque somente um mal pode mover o mal, e, neste caso, estou falando do mal moral, ou seja, o mal físico vem do mal moral como disse Sto Agostinho e este, por seu turno, resulta da incapacidade do ser humano de fazer julgamento moral, e essa dificuldade aparece quando as pessoas simplesmente não querem pensar, se contentando em ser uma espécie de peça dispensável no imenso maquinismo da sociedade onde elas são apenas uma espécie de demiurgo, um executor material, cumprindo ordens sem que estas tenham previamente passado pelo filtro da sua inteligência.

Alguns poderão dizer que isso é muito complicado porque o certo e o errado são relativos. Ora, a ideia de que tudo é relativo é, no final das contas, um flatus vocis. Quando Camões diz que “o amor é fogo que arde sem se ver” (sic) e um especialista em bioquímica diz que o amor é uma combinação das descargas de adrenalina, dopamina, oxitocina, etc., significa isso que o amor é relativo ou significa apenas que camões e o bioquímico estão a olhar para a mesma coisa só que sob perspectivas diferentes? É claro que o relativismo está na perspectiva do observador e não no objecto em si, de outro modo, o mesmo objecto teria que ser e não ser sob o mesmo aspecto o que seria contraditório com o principio de identidade. Ora, o relativismo sempre vai existir porque nenhuma perspectiva é completa em si mesma. Uma visão conjunta e unificada da realidade, só Deus a tem, ao passo que nós temos vários pontos de fuga enquanto Deus, como fundamento mesmo da realidade como disse Aristóteles, tem um só.

Ora, o certo e o errado se ligam ao axio antropológico mesmo da experiência humana e não do campo meramente especulativo que procura chegar ao juízo do verdadeiro e do falso. Contudo, não é o axio antropológico do verdadeiro e do falso que se subordina ao axio antropológico do certo e do errado mas o contrário. Por outras apalavras, o axio antropológico do verdadeiro e do falso abarca e subordina todo o axio antropológico do certo e do errado. Se um acto é moralmente certo no nível prático ou experimental, ele tem que ser moralmente verdadeiro no nível especulativo e assim por diante. Ou seja, roubar não pode ser especulativamente um falso valor e ser praticamente ou experimentalmente um acto certo. Por outras palavras, o que Kant chama de razão prática que é a moral tem que estar alinhada com a razão teórica, com a moral especulativa que é a ética pois que esta se funda em juízos mais rigorosos e permanentes.

Essa coisa de tentar inventar uma sociedade científica onde todas as discussões de ordem religiosa, moral, cultural, civilizacional são abolidas em nome da ciência, transformando todo mundo em burocrata do establishment, transformando todo mundo em executor material das teses científicas como um demiurgo é e sempre foi o pedestal de regimes ditatoriais e eles sempre acabam caindo porque se sustentam em pés de barro e a ciência é um pé de barro.

Na verdade, o poder não está nas mãos de quem controla a ciência mas sim de quem controla a cultura, o sistema de valores da sociedade e, me parece que essas campanhas mundiais acerca da alimentação sejam apenas uma espécie de laboratório de controlo social e não uma preocupação genuína com a saúde das pessoas, principalmente quando financiadas pelos governos ou pelos grandes think tanks cujo objectivo final, considerado do ponto de vista teleológico, é acumular poder.

ESCRITO POR|XADREQUE SOUSA|shathreksousa@gmail.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário