O teísta diz: “Deus
não somente existe mas também é uma pessoa”. O deísta diz: “Deus existe mas não
é uma pessoa mas sim uma força impessoal da natureza. O agnóstico diz: “não é
possível saber se Deus existe ou se não existe”. O gnóstico diz: “Deus existe
mas ele é mau”.
Os cristãos têm uma visão teísta de Deus. Importa,
portanto, distinguir o teísmo do ateísmo, do deísmo e do agnosticismo.
Os teístas crêem num Deus pessoal que fez o cosmos e
ao qual eles podem dirigir as suas orações com uma fé firme de que Ele os ouve
e os responde. Essa é a crença que vemos no Cristianismo e em todas as religiões
superiores. Portanto, para os cristãos Deus é uma pessoa, aliás, três pessoas:
Pai, Filho e Espírito Santo, numa só Divindade.
Meditando bastante sobre esse tema acabei
descobrindo que muitos que se opõe a doutrina da trindade fazem-no apenasmente
por uma confusão de termos. Eles não entendem a diferença entre pessoa e ser.
Eles julgam que estão a falar da mesma realidade. Ora, pessoa vem de persona e quer dizer máscara, remontando
a sua origem as artes cénicas. Portanto, um mesmo ser pode representar no
teatro da vida uma ou mais personagens, uma ou mais personas. A palavra personagem vem de persona, pessoa, que quer dizer máscara como já fizemos questão de
nos referir há pouco tempo.
Como Pai, Deus é um personagem. Como Filho Êle é um
outro personagem e como o Espírito Santo Êle é um outro personagem. São três
personagens mas um mesmo actor que as representa. Na escolástica, o Pai era
símbolo da Vontade Divina. O Filho simbolizava a Razão Divina, o Logos. O Espírito Santo simbolizava o
amor. Porém, é o mesmo actor, o mesmo ser.
Na ontologia conforme já expusemos em outros
artigos, a última divisão do ser consiste em SER:
1)
A semetipsum et ab eterno
2)
Nec a semetipsum nec ab eterno
3)
Ab eterno sed non a semetipsum (Ab alius).
Deus tomado ontologicamente, ou seja, como ser
enquanto ser, Êle é um ser a semetipsum
et ab eterno. Diferentemente da
pessoa que é uma máscara e tem um começo e tem um fim porque não há um personagem
eterno. Por exemplo, Deus é Pai, Filho e Espírito Santo. Porém, como diz o Rev.
Branham, não há um filho eterno. Um filho tem princípio e tem fim. O mesmo
acontece com o pai. Porém, a paternidade já é diferente. A paternidade é
eterna. A maternidade é eterna, não, porém, a mãe. A filialidade é eterna, não,
porém, o filho.
O ser é imutável porque ele não tem extensão. Ele
não é corpóreo. Ou seja, ele não se dá cronotopicamente. Isso, contudo, não
significa que estejamos negando os factores predisponentes do ser, ou seja, os
factores externos que predispõe o ser a ser o que é. Porém, esses factores
predisponentes são apenas acidentais. Emergencialmente, ser é o que é por causa
dos factores tectónicos, intrínsecos.
Conforme vimos em outras meditações, os factores
emergentes ou tectónicos ou ainda intrínsecos do ser tomado no contexto beta
são a forma e a matéria. A forma vai dar-nos o factor eidético e a matéria vai
dar-nos o factor hilético. Então, os seres do contexto beta são entes que
hiletica e eideticamente pertencem ao contexto beta.
Deus não pode ser hiletica e eideticamente concebido
porque Êle não é um ente que pertence ao contexto beta. Deus não é composto de
forma e matéria. Aliás, Deus nem é mesmo composto. Deus é simples de modo que
em Deus não há dualidade, não há oposição. Deus é unidade de modo que podemos
concluir que o ser tomado enquanto ser e não enquanto ente é unidade.
Suarez diz que ser é ser apto a existir. Com isso
queremos dizer que embora Deus não seja composto de forma e matéria isso não é
uma prova contra a sua existência porque se ser é ser apto a existir, então Deus
existe, ou então, Êle não seria ser.
O termo existir vem de ex mais sistere. Ex=fora, sistere=situar-se. Daqui resulta que existir é situar-se fora de
si, ou seja, fora das suas causas. O si para Guenón é personalidade e para
Zubiri é personeidade. Ora, qual é a causa de Deus? A causa tem sido concebida
sempre como alguma coisa externa, porém, Deus é causa sui. Ele não tem uma causa externa. Deus como Pai é causa de
Deus como Filho mas esse Filho não é um outro que o Pai mas a afirmação do
mesmo Deus que é Pai. Se Deus tivesse uma causa externa Êle não seria Deus mas
sim a causa que a Êle deu o ser.
Aristóteles classifica as causas em quatro, a saber:
1) Causa eficiente;
2) Causa material;
3) Causa formal e;
4) Causa final.
A causa material e a causa formal são causas
tectónicas ou intrínsecas que estão na emergência dos entes, ou seja dos seres
tomados em sendo. Elas compõe a causa
tectónica e são respectivamente causas hilética e eidética. Enquanto as causas
formal e material são as causas intrínsecas do ente, as causas eficiente e
final são suas causas externas, predisponentes.
Examinamos assim a visão teísta de Deus conforme ela
aparece nas religiões superiores e agora vamos examinar os conceitos de
ateísmo.
Ora, o ateísmo de a privativo + teísmo é
uma negação de Deus. O ateísta nega a ideia de Deus. Ele nega a existência de
Deus o que levanta uma questão muito grande no campo da teologia porque é a
teologia que cabe tratar dessa questão. Infelizmente, há muitos que
hipnotizados pelo naturalismo, pelo cientismo ou cientificismo querem reduzir
todas as questões teológicas apenasmente a meras questões biológicas,
psicológicas, ou físico-químicas como energicamente empreenderam Victor
Stenger, Richard Dawkins, Cristoffen Hicthens, Daniel Dennet, etc.
Imbuído de evolucionismo, Dawkins nega a existência
de Deus. Para ele, a religião é um erro da evolução e não um produto da revelação.
Isso só revela uma confusão mental muito grande. É claro que nem todas as
religiões são frutos da revelação, senão teríamos que admitir que todas as
religiões são verdadeiras, o que não procede porque sabemos existirem falsas
religiões apoiadas em falsas revelações como o Mormonismo, etc.
Então, temos uma religião revelada, que vamos chamar
de religião sagrada arraigada nos valores supremos do sagrado e do profano.
Temos também a religião natural que é aquele religar com o ser supremo a que o
homem procura chegar penetrando o transcendental com a luz natural da sua
razão.
Há muitos homens que por não pertencerem ao cristianismo,
ao islamismo, ao judaísmo, ao budismo, dizem que não têm religião, que são
homens sem religião. Entretanto, quando observamos a vida desses homens vemos
que eles, com a luz natural da sua razão, procuram sempre alcançar aquilo que os
transcendem como homens. Ora, inconscientemente esses homens são religiosos e
não o sabem. Eles praticam uma religião natural e não uma religião sagrada ou
revelada mas eles têm uma religião.
Os argumentos contra a existência de Deus são
muitos. Assim também, abundantes são os argumentos a favor da existência de
Deus vindo principalmente dos escolásticos com destaque para Sto. Anselmo, o
pai da escolástica (1) e Sto. Tomás de Aquino.
Argumentar, quer a favor, quer contra a existência
de Deus, não prova a sua existência ou inexistência. Da prova nós temos
perícia, peritos que é aquele que sabe por meio de provas. Que muitas são as
provas apresentadas quer a favor, quer contra a existência de Deus disso não
temos dúvidas.
Tentar afirmar ou negar a existência de Deus com
recurso ao método das ciências naturais que se assenta na observação e experimentação
é entrar de noite num quarto escuro a procura de um gato preto.
Já vimos acima que a disciplina do saber culto que
estuda o tema de Deus é a teologia. O que é teologia? É metafísica. Metafísica
especial. Então, a teologia vai debruçar-se sobre a existência de Deus, as
provas a favor e as provas contra. A metafísica, por sua vez, é um campo de
estudo que é abarcado e subordinado pela filosofia. Então, teologia é
filosofia. Já diziam os escolásticos que a filosofia é serva da teologia. Isso
não nega o que dissemos. É preciso perceber em que sentido é que ela é serva e
em que sentido ela é senhora da teologia.
Na idade média, a filosofia foi usada para provar a
doutrina cristã, portanto, ela estava ao serviço da teologia. Mas a filosofia
transcende o estudo da teologia. Então, tomada imanentemente, a teologia é
servida pela filosofia mas transcendentalmente ela é apenas um dos capítulos da
filosofia.
Em filosofia há apenas uma única autoridade. Ela não
é a observação nem a experimentação como procedem as ciências naturais. De modo
nenhum. A única autoridade na filosofia é a demonstração. Não importa quantos
autores de obras que se pretendem filosóficas você possa conhecer de cor e salteado.
Isso não significa que a sua tese decorre necessariamente. Você tem que
demonstrar.
A única autoridade em filosofia é a demonstração e
isso fica claro naquela polémica entre Ésquiles e Demóstenes. Em que Demóstenes
repete os argumentos propostos por Ésquiles e ainda acrescenta mais argumentos
e depois os refuta um por um de acordo com a verdade dos factos e com a verdade
geralmente aceite pelos gregos.
Quando se diz que a filosofia começou na Grécia não
significa que nos outros povos já não houvesse o afanar ao saber. De modo
nenhum. Há filosofia na Índia, China e em outros povos (2). O que distingue,
entretanto, a filosofia grega da dos outros povos, é que os gregos procuravam
demonstrar a sua tese enquanto a filosofia dos outros povos é, em geral, apenasmente
expositiva. Assim, elas apelam para o pathos
dos ouvintes, pathos tomado aqui
como o simpatético. Então, os que simpatizavam com aquelas ideias aderiam e os
que não simpatizavam se opunham.
É por isso que dissemos que citar muitos autores não
é prova de que você tem espírito filosófico. Isso só prova que você é um
erudito. O filósofo demonstra a sua tese com o mesmo rigor aplicado a geometria
(3). O mesmo se da com a ciência ou na ciência. Não adianta citar tais e quais
cientistas se a tese que você está defendendo é desmentida pela observação e
pela experimentação. O uso abusivo do argumentum
autoritactis no mundo moderno é uma das maiores fraudes que o animal
racional jamais inventou.
Quando Aristóteles, antes de expor as suas ideias,
expunha as dos filósofos que o antecediam, ele não fazia isso com o intuito de
se escorar no argumento de autoridade em preterição da demonstração. De modo
nenhum. Porém, hoje, nós vemos isso. Quer dizer, basta alguém dizer: Newton
disse tal coisa, ou Einstein disse tal e qual coisa, que é suficiente para todo
mundo ficar convencido e aceitar aquilo sem nenhuma discussão como quem aceita
um dogma de religião. Ora, isso não é filosofia e muito menos ciência. Não
importa se Newton disse tal ou qual coisa, o que importa é a realidade. Vamos
observar e experimentar a realidade. O resto é propaganda barata. Não importa
se Kant disse tal ou qual coisa. A questão é: demonstre.
Uma dos argumentos contra a existência de Deus é que
o milagre viola as leis da natureza e portanto é impossível e se não há milagre
não há Deus. Ora, milagre nunca quis dizer isso. A palavra milagre vem de miraculum que significa algo digno de
ser olhado, de ser admirado, mirar ad,
ou seja, olhar para…, portanto, nunca significou uma violação das leis da natureza
mas apenas algo que capta a nossa atenção (ad
tensão) pelo simples facto de não termos uma teoria que sirva de fio de Ariadne
ou fio condutor que ofereça uma explicação coerente daquele evento.
Por que é que nós admiramos o nascimento virginal de
Cristo e não admiramos a nossa imagem na retina de uma câmera fotográfica?
Porque não temos uma explicação científica para o nascimento de Cristo mas
temos uma explicação científica da fotografia. Assim também não temos uma explicação
científica para a ressurreição de Cristo, para as curas milagrosas que têm
acontecido na igreja nesses 2017 anos e outros eventos como as profecias que se
realizam ao pé da letra, etc. A prova de que não temos explicação científica
para isso é que não podemos replicar esses eventos no laboratório mas uma
fotografia pode.
Agora, o céptico porque não consegue admitir essas
coisas diz que elas são fraudes como disse aquele homem de quem falou o casal
Charles e Frances Hunter no livro “Curai os enfermos e ressuscitai os mortos”,
que disse que mesmo que Deus fizesse um milagre na vida dele ele não iria
acreditar que Deus existe. Quer dizer, é o tipo humano que Mário Ferreira dos
Santos qualificou como o homem do entardecer ou o homem crepuscular.
O milagre não viola as leis da natureza porque o
milagre não é imanente a natureza mas sim transcendente a natureza. Se fosse
imanente, o milagre teria que se subordinar as leis da natureza como o motor de
explosão se subordina as leis da natureza e é por isso que podemos explicar o
funcionamento do motor de explosão. Agora, como explicar aquele caso do Padre
Pio de Pietrechilna de uma criança que enxergava sem pupilas? Como explicar que
Branham, antes de Hitler tomar o poder na Alemanha profetizou que um austríaco
chamado Adolfo Hitler tomaria o poder na Alemanha e levaria o mundo para uma
segunda guerra mundial? Não há explicação científica para isso. Então, como as
pessoas não podem explicar esses eventos maravilhosos, elas os desprezam e
imaginam que varrendo a poeira para debaixo do tapete resolveram a questão e
depois se admiram que sua casa cheire tão mal.
Ora, o que é uma explicação? É uma tentativa de
encontrar um nexo causal. Só que acontece que a ciência trabalha apenas com as
causas hiléticas e eidéticas, ou seja, com as causas materiais e formais. Foi
isso que Galileu queria dizer quando escreveu que a única maneira de se
conseguir um conhecimento objectivo da realidade era preciso considerar apenas
a forma, o peso e o tamanho dos entes reais, enfim, dos corpos.
Ora, acontece que o milagre não tem uma causa formal
e material, senão poderíamos explicá-lo facilmente usando os nossos métodos de medição.
O milagre tem uma causa eficiente que é o próprio Deus e uma causa final
emergente que é a glória do próprio Deus e uma causa final predisponente que é
a salvação do pecador. A causa forma e a causa material são apenas
predisponentes do milagre e não sua causa emergente.
O milagre, então, não viola as leis da natureza. O milagre
abarca e subordina as leis da natureza, transcendendo-as infinitamente porque a
natureza é apenas o campo das possibilidades finitas enquanto o milagre é o
campo das possibilidades infinitas. Portanto, é ridículo imaginar que o
ilimitado pode ser limitado pelo limitado, que o infinito pode ser determinado
ontologicamente pelo finito.
Podíamos fazer referência a outros argumentos contra
a existência de Deus como o argumento de que Deus não existe porque nunca
ninguém o viu. O outro argumento diz que Deus não existe porque se Êle
existisse não haveria mal no mundo, etc. Este e outros argumentos já foram por
nós amplamente refutados em outros artigos com argumentos argutos que não podem
ser impugnados.
De modo que passemos agora a examinar os argumentos
a favor da existência de Deus. Conforme o que foi dito a pouco, os principais
argumentos são os de Sto. Anselmo e os de Sto. Tomás.
O argumento de Sto. Anselmo é conhecido como o
argumento ontológico de Sto. Anselmo. Esse argumento é ontológico porque ele
procura encontrar a prova da existência de Deus no próprio ser de Deus e não na
nossa mente o que demandaria, por conseguinte, um argumento lógico e não um
argumento ontológico. Se procurássemos encontrar a prova da existência de Deus na
nossa psique, então teríamos um argumento psicológico, o que significa que Deus
seria um conteúdo do nosso pensamento e assim por diante.
O argumento ontológico de Sto. Anselmo consiste na
incapacidade do homem pensar em algo mais perfeito do que Deus, o que prova que
Deus existe. Muitos ateístas, ridicularizando esse argumento de sto. Anselmo
dizem que o facto de pensarmos numa montanha de ouro não prova que a montanha
de ouro existe. Ora, sabemos que a montanha é uma realidade e que o ouro também
é uma realidade e sabemos também com todo rigor lógico que da realidade se pode
postular a possibilidade, portanto, da realidade da montanha e da realidade do
ouro pode-se postular a possibilidade de uma montanha de ouro. Não há aqui
nenhuma contradição lógica intrínseca. De modo que esse argumento dos ateus não
procede (3).
O argumento de Sto. Tomás é mais vasto e vamos citar
alguns, aqueles de que nos recordamos e assim temos os seguintes:
1) A prova do movimento: com esse argumento Sto. Tomás
demonstra que Deus existe como o primo
moto imobile de Aristóteles.
2) Prova da causa eficiente: com esse argumento ele
prova que Deus é a causa de todo o ser.
Esses são apenas alguns argumentos que usamos para
provar a existência de Deus no Aquinatense. A prova do movimento não é uma
prova física como se Deus fosse um motor físico. Isso é apenas metafórico. O
que Aristóteles faz aqui com seu primo
moto imobile é uma filosofia da física. O que ele quer, na verdade, é
demonstrar Deus como o fundamento último da realidade.
Louis Lavelle diz que o mundo sensível, que é aquilo
a que chamamos de realidade, se funda sobre o eu, o qual reside na memória que
é a “retenção do tempo” (O.d.Carvalho) e o eu por sua vez se funda sobre o ser.
Portanto, o fundamento último da realidade não é o eu mas o ser e o ser em sua
plenitude é a semetipsu et ab eterno
e Êsse é o Deus das religiões, das religiões superiores.
A prova da causa eficiente é metafísica. Na verdade,
todas as provas que Tomás de Aquino oferece são metafísicas. Portanto, se prova
a Deus metafisicamente. Enquanto, Sto. Anselmo apela para o nosso pensar em
algo mais perfeito que Deus. Ou seja, ele apela para uma prova lógica. O pensar
tem a ver com lógica. Ele é o objecto da lógica assim como o pensamento é o
objecto da psicologia.
Pensar em algo mais perfeito do que Deus é
impossível. Há aqui uma contradição formal intrínseca.
Quando S.Paulo, na sua Epístola aos romanos diz que
é possível conhecer a Deus pela natureza e natureza é phisis, física, não quer dizer que Deus é a natureza e cair no
panteísmo de Spinoza. De modo nenhum. Ele quer apenas, como Aristóteles, dizer
que o conhecimento começa pelos sentidos. Não apenas o conhecimento físico mas
também o conhecimento metafísico como o conhecimento de Deus. Então, como é que
a partir dos dados dos sentidos é possível chegar a ideia de Deus? Quer para Aristóteles,
quer para os escolásticos, você faz isso por meio da abstracção de modo que a abstracção
tal como Aristóteles estudou e que depois foi aprofundada pelos escolásticos é
o fundamento da metafísica no seu sentido ascensional porque no seu sentido
descensional você acaba desembocando no platonismo que é também uma via de
igual valor, quer dizer, nós chegamos a ideia de Deus quer pela abstracção de Aristóteles,
quer pela via dos conceitos tal como propugnado por Platão, quer pela via da iluminação
divina de Agostinho.
Posto isto, passemos a examinar o deísmo.
Não raras vezes suscita-se confusão entre deísmo e
teísmo. Mas não há razões para que tal ocorra. A proximidade na escrita e na
fonética, ou seja, a paronimidade entre essas duas palavras não deve ser motivo
de confusão. Já explicamos que teísmo é a afirmação de um Deus pessoal conforme
patente nas religiões superiores. Diferentemente disso, o deísmo é a negação,
não de Deus, mas de um Deus pessoal. De modo que o deísta não é ateu. O ateu
nega categoricamente a existência de qualquer divindade. O deísmo admite a
existência de Deus, só que nega que Êle seja uma pessoa.
Para o deísta, Deus é uma força impessoal da
natureza. Alguns acusam Leibnitz de ter sido um deísta. Porém, os que isto
dizem revelam claramente que nunca leram uma linha sequer de Leibnitz.
A concepção deísta de Deus, ou seja, de um deus
impessoal, é a mesma que encontramos no movimento Nova Era de Alice Bailey que
prega um falso misticismo conforme diz René Guenón. Se Deus é uma força da
natureza, então caímos no panteísmo e não nos apercebemos.
Quando Deus aparece a Moisés no alto do Monte Sinai
ele fala com Moisés. Quando Moisés pergunta: qual é o seu nome? Ele diz: Eu Sou
quem Eu Sou. EU é um pronome pessoal. Um búfalo não pode dizer a palavra EU. O
papagaio pode até imitar isso mas ele não tem consciência do que estará
dizendo. Nenhuma força da natureza, seja ela um terremoto, um trovão, etc., pode
dizer a palavra EU.
Toda religião tem um aspecto esotérico e um aspecto
exotérico. O aspecto esotérico é para os iniciados. O aspecto exotérico é para
os catecúmenos, é para as massas, os não iniciados. O aspecto esotérico do
islam é o sufismo que é praticado nas tariqas.
Tariqa quer dizer caminho. Então, a tariqa é um caminho esotérico para a haqiqa que é a verdade através da qual
se dá a integração da alma individual no divino, no ser supremo. Nas tariqas se praticam ritos que o
mussulmano comum não pratica. Isso não é uma heresia. Isso vem desde Maomé. São
ritos voluntários e não obrigatórios.
Há uma discussão muito grande entre René Guenón e
seu discípulo Frithjof Schuon acerca do esoterismo cristão. Guenón defendia a
existência de um esoterismo cristão, o que foi negado por Schuon. Isso levou
Guenón a cortar as relações com Schuon. Porém, eu tenho cá pra mim que Guenón
estava montado na razão.
Quando Cristo pregava e ensinava nos seus dias, o
evangelho diz que Ele o fazia por parábolas. Parábola quer dizer comparação.
Porém, o evangelho diz que Ele falava claramente aos seus discípulos. Qual a
razão? Dizia Ele: “a vós vos é dado conhecer os mistérios do Reino de Deus mas
aos outros tudo lhes será dito por parábolas para que vendo não percebam,
ouvindo não entendam”. Porém, o próprio Cristo quando interrogado por Caifás disse:
“Eu nada disse em oculto”. Só com isso já se pode depreender que o cristianismo
é um jogo de luz e trevas. Trevas para os que estão fora do Reino e Luz para os
que estão dentro. O que é isso senão um aspecto exotérico e outro esotérico?
O esoterismo cristão tem aqui que ser bem entendido
e não confundido como vulgarmente o é com o ocultismo, com práticas de rituais
ocultos, satânicos, etc. Não devemos cair no erro de pensar que o aspecto
esotérico do cristianismo é a maçonaria, a cabala judaíca, etc. O esoterismo cristão
se prende a busca de caminhos interiores e não exteriores. Sendo Cristo, o
entendimento divino, esse caminho interior é o caminho do intelecto. É por isso
que algumas práticas ascépticas que entraram no cristianismo na idade média e
mesmo depois não tem nada a ver com cristianismo porque elas servem para
embotar o entendimento do homem ao invés de iluminá-lo.
Tendo tratado do deísmo podemos agora tratar do agnosticismo.
A palavra agnóstico de vem de a-privativo
mais gnosis que quer dizer
conhecimento. Portanto, o agnóstico nega que podemos ter conhecimento de Deus.
Ele nega que podemos apreender de Deus o que é apreensível porque para ele em
Deus nada há que seja apreensível. Sendo que não podemos ter conhecimento de
Deus, o agnóstico não sabe se Deus existe ou se Deus não existe. Ele não é um
teísta nem um deísta e ele também não é um ateu. Ele simplesmente não sabe se
Deus existe ou se não existe e nega a possibilidade do homem chegar a conhecer
a Deus seja por quaisquer vias que for, seja por meio da conceptualização
pitagórico-platónica, seja por meio da abstracção aristotélica e muito menos
por meio da iluminação divina agostiniana. Portanto, um agnóstico é um néscio.
Não devemos confundir o agnóstico com o gnóstico.
Enquanto o agnóstico nega que podemos conhecer a Deus, o gnóstico apregoa a salvação
pelo conhecimento.
O estudo do gnosticismo mereceu uma grande atenção
no século XX por parte não apenas de alguns teólogos como o famoso teólogo Hans
Hurs Von Balthazar mas também por parte de estudiosos da política como Eric
Voeglin, Thomas Cohn, James Billington só para citar as mais poderosas mentes.
Esses homens descobriram um vínculo do comunismo com as seitas gnósticas. Não
apenas o comunismo mas todos os movimentos de massa que podemos chamar de
revolucionários, incluindo o movimento de Thomas Munzer. De modo que a
mentalidade revolucionária é uma mentalidade gnóstica.
O gnóstico é um crente. Ele crê em Deus, só que ele
imagina que Deus é mau. Um demiurgo. Então, para o gnóstico, Deus é mau, o
universo é hostil e a humanidade é inviável. Tomado por esse terror do cosmos,
o gnóstico imagina que só há uma única via de salvação para ele. Que é ele se
transformar em deus. Então, para isso ele tem que se evadir do cosmos. Nós
encontramos isso nos escritos de juventude de Marx quando ele diz que vai
destronar Deus e colocar seu trono bem acima do trono de Deus (cf. Marx &
Satan, Richard Wumbrand). Em Lenine, Bakunin, etc., é a mesma coisa. Esses
camaradas não eram ateus, eles eram gnósticos.
No nazismo também encontramos essa ligação com o
gnosticismo. Aliás, não podemos nos esquecer que o nazismo também é um
movimento de massa, também é revolucionário. As pessoas dizem que o nazismo era
de direita, porém é preciso ser muito pueril para acreditar nisso. Nazismo quer
dizer Nacional Socialismo e COMINTER quer dizer internacional comunista. Quer
dizer, o socialismo nacional é nazismo. O socialismo internacional é comunismo.
Qualquer historiador digno desse nome e que faz história nos moldes do bom e
velho Leopold Von Ranke, que dizia que o papel do historiador é registar os
factos tal como eles se deram, sabe disso.
Quem é que não sabe houve que houve um acordo
firmado pela URSS e os nazistas, um pacto que ficou conhecido por pacto
Ribentrop-Molotov?
Portanto, o
gnosticismo como qualquer outra ideologia é, como dizia E.Voeglin, uma revolta
contra Deus e contra o homem. Hoje em dia, ao se colocar o meio ambiente, o
homossexualismo, o abortismo, o sex-lib, a teoria do género, os extra-terrestre
acima da lei de Deus e acima do próprio homem, desembocamos num novo
gnosticismo.
Cada um desses movimentos é um movimento
revolucionário porque a implementação do seu objecto requer a total e completa
concentração de poder nas mãos das elites desses movimentos. Isso se refere não
apenas ao quarto poder de Burke, a mídia, mas também o poder militar, o poder
económico e o poder religioso. Veja que toda a grande mídia faz eco a
reivindicação de cada um desses movimentos. A teologia de libertação que é uma
criação da KGB faz eco aos interesses de cada um desses movimentos, tendo o
Papa Francisco a cabeça. As fundações bilionárias, a elite bancária ocidental,
faz apologia de cada um desses movimentos tendo George Soros a cabeça. Daqui a
pouco assistiremos os capacetes azuis dar ONU invadindo países africanos e
asiáticos porque esses não cedem as pressões dos abortistas, gaysistas,
aquecimentistas, etc.
Notas:
(1)
Alguns
estudiosos, como Olavo de Carvalho, atribuem a paternidade da escolástica a
Bóecio, autor da “Consolação da filosofia”.
(2)
A filosofia dos
hindus, chineses, enfim, dos povos orientais é aquilo a que se chama filosofia
perene ou tradicionalista cujos maiores expoentes foram René Guenón, Martin
Lings, Frithjof Schuon, Ananda, Coomaraswamy, Rama Coomaraswamy, Titus
Buckardt. Essa filosofia é fundamentalmente metafísica baseada no simbolismo
oriental.
(3)
Aquilo que é
objecto de nosso pensamento distingue-se do próprio pensamento. Assim, ou ele
está apenas no nosso pensamento ou ele está apenas na realidade ou nos dois. Se
está apenas no nosso pensamento, logo é apenas uma ficção. Se está apenas na
realidade, logo, ele não pode ser pensado porque não temos esquema
eidético-noético para acomodá-lo. Se está nos dois, então, podemos pensá-lo
sempre cum fundamento in re.
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