"A
política é apenas um meio; o fim é a cultura".
George Lukács
Num verdadeiro sistema
democrático é muito fácil derrubar ou tirar um adversário do poder. Uma pequena
acusação de corrupção ou de má administração é mais do que suficiente para pôr
um impeachment no governante e
tirá-lo do seu cargo. Mas num sistema pseudodemocrático, a pura crença de que
esses factores possam ter o mesmo efeito já deve ser tomado como prova de
insanidade mental.
Um verdadeiro sistema
democrático é aquele em que os partidos aceitam revezar-se no poder uns com os
outros. Mas num sistema democrático de faz de conta, o normal rodízio de poder
é tão impossível quanto a vaca voadora que Sto. Tomás de Aquino acreditou ter
passado pela sua janela.
Um sistema democrático
torna-se numa democracia de faz de conta quando o partido que está no poder é
essencialmente um partido revolucionário, pouco importando se ele chegou ao
poder por via do sufrágio universal ou se por via da insurreição armada,
tendo-se, posteriormente transmutado de um movimento de guerrilha em um partido
político. Tudo isso é apenas mero acidente e não a substância da coisa. Na
verdade, o meio é o que menos conta. O que importa é em nome de quê você está
agindo, ou seja, qual é o esquema de poder que está por detrás das várias
acções, unificando todas as intenções.
O fenômeno
revolucionário é o fenômeno mais importante dos tempos modernos, porém, ainda
assim, poucas pessoas estão capacitadas para entender aquilo que o filósofo
Olavo de Carvalho chama de “mentalidade revolucionária”. Resultado: põe-se a
pontificar acerca de coisas que não entendem porque nada estudaram, chegando
até mesmo a profetizar que partidos revolucionários como a FRELIMO são
invencíveis, o que me faz lembrar aqueles que em Apocalipse adoraram a besta
dizendo: “quem pode batalhar contra ela”? Os quais não têm seus nomes escritos
no livro da vida do cordeiro.
Gramsci diz que o objectivo
da revolução cultural é fazer com que todo mundo se torne comunista sem saber
de de tal modo que o partido se torne num poder onipresente, invisível, de um
imperativo categórico, de um mandamento divino. Por outras palavras, quando um
partido revolucionário ascende ao poder, ele aparelha as instituições de tal
modo que ele possa se perpetuar no poder
ad eterno.
Um partido
revolucionário que chega ao poder por meio de uma insurreição armada tende a
eliminar com recurso ao uso da violência de toda e qualquer oposição política e
a estabelecer um regime totalitário de partido único. Mas quando o mesmo partido
revolucionário chega ao poder por via das eleições, ele vai “enrabando a
oposição com vaseline” como diz Olavo de Carvalho. Quer dizer, eles não
destroem abruptamente a oposição, mas a esvaziam do seu conteúdo ideológico de
tal modo que ela se transmuta em uma oposição meramente biônica e sirva de
caixa de ressonância da elite revolucionária sem saber. E porquê eles nunca
sabem? Porque foram transformados em idiotas úteis, para usar a expressão de
Lenine.
Ora, uma vez que o
partido revolucionário tende a eliminar seus adversários, quer fisicamente, quer
politicamente, o que resta fazer, ou seja, como é que se pode tirá-los do poder
num regime que se pretenda democrático? Esta pergunta parece um tanto ou quanto
ingênua porque parece que a resposta é bastante simples. Ou seja, as pessoas
podem dizer que num sistema democrático só pode tirar-se um partido do poder
por meio do voto. Mas acontece que quando o partido que está no poder é um
partido revolucionário, isso não serve porque eles vão roubar os votos. Aliás,
Lenine sempre disse que numa eleição “o mais importante não é quem vota mas
quem controla os votos”. Por conseguinte, se um partido quer vencer o partido
no poder por meio de eleições num sistema democrático, ele tem que controlar os
votos. Mas, como fazer isso?
Nos países sob
governos de partidos revolucionários as pessoas vivem sob uma nuvem de medo
terrificante de dia e de noite. Todo mundo está descontente e completamente
confuso e, por conseguinte, não sabe como se orientar no meio da confusão em
torno. Aliás, como diz Gramsci, num sistema assim, todo mundo é comunista sem
saber. Ora, se todo mundo é comunista sem saber é óbvio que as suas acções vão
beneficiar sempre e sempre o partido comunista independente do que elas mesmo
dizem. Como quebrar isso e impor um pouco de equilíbrio no diálogo político
interno de tal modo que todas as facções tenham direito de voz?
A resposta para esta
questão está na seguinte frase de George Lukács: "A política é apenas um meio; o fim é a cultura". Sempre
tenho dito para as pessoas do meu círculo de convivência: “não façam política.
Façam meta-política”. Porquê? Porque fazer política num país em que o governo
está sob um partido revolucionário é dar um tiro no próprio pé. Ela vai ser
sempre e em toda parte inviável. E neste país temos visto muitos acadêmicos
serem assassinados porque querem fazer política, quando, na verdade deviam
fazer outra coisa, deviam fazer meta-política e esquecerem a política.
Num país sob um governo de um partido revolucionário só se pode quebrar
a hegemonia do partido no poder de quatro maneiras e passo a mencioná-las;
1.
Intervenção divina
2.
Mudança da ordem
internacional
3.
Revolução cultural
4.
Insurreição armada
Neste artigo, quero me focar nas duas últimas estratégias. A revolução
cultural como Gramsci a idealizou consiste na lenta e progressiva ocupação de
espaços na mídia, universidades, igrejas e assim por diante. Esse processo pode
durar uma geração inteira, ou seja, estamos a falar de trinta, quarenta anos
para se ter algum resultado. Sem isso,
não adianta tentar fazer política, i.e., tentar conquistar ou preservar o
poder. Sem isso não adianta tentar fazer nenhuma insurreição armada.
E no que tange a insurreição armada é sempre bom olhar para trás e dar
ouvidos a quem já fez uma e com sucesso e esse fulano foi Lenine. Este grande
ideólogo do comunismo do século passado disse que a revolução se faz do
exterior. Portanto, tentar fazer uma insurreição política ou militar do
interior é um suicídio.
Mas convém lembrar, mais uma vez, que toda e qualquer acção começa com
a especulação acerca das possibilidades de acção. E que qualquer especulação
acerca das possibilidades de acção começa com a especulação acerca de como a
realidade funciona.
Quando Marx dizia na sua 12 a tese contra Feuerbach que não
se tratava de interpretar a realidade, mas de transformá-la, ele deixou aí
claro para todo mundo qual é a essência da ideologia revolucionária. Agora, não
se pode superar o movimento revolucionário endossando-o, mas sim substituindo-o
e substitui-lo é colocar o seu inverso em seu lugar, ou seja, se os
revolucionários estão mais prometeicamente preocupados em transformar o mundo,
os reacionários, os conservadores deviam estar mais preocupados em compreendê-lo
acima de qualquer outra preocupação.
ESCRITO POR|XADREQUE SOUSA| shathreksousa@gmail
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