segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Não façam política. Façam metapolítica

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"A política é apenas um meio; o fim é a cultura".

George Lukács


Num verdadeiro sistema democrático é muito fácil derrubar ou tirar um adversário do poder. Uma pequena acusação de corrupção ou de má administração é mais do que suficiente para pôr um impeachment no governante e tirá-lo do seu cargo. Mas num sistema pseudodemocrático, a pura crença de que esses factores possam ter o mesmo efeito já deve ser tomado como prova de insanidade mental.

Um verdadeiro sistema democrático é aquele em que os partidos aceitam revezar-se no poder uns com os outros. Mas num sistema democrático de faz de conta, o normal rodízio de poder é tão impossível quanto a vaca voadora que Sto. Tomás de Aquino acreditou ter passado pela sua janela.

Um sistema democrático torna-se numa democracia de faz de conta quando o partido que está no poder é essencialmente um partido revolucionário, pouco importando se ele chegou ao poder por via do sufrágio universal ou se por via da insurreição armada, tendo-se, posteriormente transmutado de um movimento de guerrilha em um partido político. Tudo isso é apenas mero acidente e não a substância da coisa. Na verdade, o meio é o que menos conta. O que importa é em nome de quê você está agindo, ou seja, qual é o esquema de poder que está por detrás das várias acções, unificando todas as intenções.

O fenômeno revolucionário é o fenômeno mais importante dos tempos modernos, porém, ainda assim, poucas pessoas estão capacitadas para entender aquilo que o filósofo Olavo de Carvalho chama de “mentalidade revolucionária”. Resultado: põe-se a pontificar acerca de coisas que não entendem porque nada estudaram, chegando até mesmo a profetizar que partidos revolucionários como a FRELIMO são invencíveis, o que me faz lembrar aqueles que em Apocalipse adoraram a besta dizendo: “quem pode batalhar contra ela”? Os quais não têm seus nomes escritos no livro da vida do cordeiro.

Gramsci diz que o objectivo da revolução cultural é fazer com que todo mundo se torne comunista sem saber de de tal modo que o partido se torne num poder onipresente, invisível, de um imperativo categórico, de um mandamento divino. Por outras palavras, quando um partido revolucionário ascende ao poder, ele aparelha as instituições de tal modo que ele possa se perpetuar no poder ad eterno.

Um partido revolucionário que chega ao poder por meio de uma insurreição armada tende a eliminar com recurso ao uso da violência de toda e qualquer oposição política e a estabelecer um regime totalitário de partido único. Mas quando o mesmo partido revolucionário chega ao poder por via das eleições, ele vai “enrabando a oposição com vaseline” como diz Olavo de Carvalho. Quer dizer, eles não destroem abruptamente a oposição, mas a esvaziam do seu conteúdo ideológico de tal modo que ela se transmuta em uma oposição meramente biônica e sirva de caixa de ressonância da elite revolucionária sem saber. E porquê eles nunca sabem? Porque foram transformados em idiotas úteis, para usar a expressão de Lenine.

Ora, uma vez que o partido revolucionário tende a eliminar seus adversários, quer fisicamente, quer politicamente, o que resta fazer, ou seja, como é que se pode tirá-los do poder num regime que se pretenda democrático? Esta pergunta parece um tanto ou quanto ingênua porque parece que a resposta é bastante simples. Ou seja, as pessoas podem dizer que num sistema democrático só pode tirar-se um partido do poder por meio do voto. Mas acontece que quando o partido que está no poder é um partido revolucionário, isso não serve porque eles vão roubar os votos. Aliás, Lenine sempre disse que numa eleição “o mais importante não é quem vota mas quem controla os votos”. Por conseguinte, se um partido quer vencer o partido no poder por meio de eleições num sistema democrático, ele tem que controlar os votos. Mas, como fazer isso?

Nos países sob governos de partidos revolucionários as pessoas vivem sob uma nuvem de medo terrificante de dia e de noite. Todo mundo está descontente e completamente confuso e, por conseguinte, não sabe como se orientar no meio da confusão em torno. Aliás, como diz Gramsci, num sistema assim, todo mundo é comunista sem saber. Ora, se todo mundo é comunista sem saber é óbvio que as suas acções vão beneficiar sempre e sempre o partido comunista independente do que elas mesmo dizem. Como quebrar isso e impor um pouco de equilíbrio no diálogo político interno de tal modo que todas as facções tenham direito de voz?

A resposta para esta questão está na seguinte frase de George Lukács: "A política é apenas um meio; o fim é a cultura". Sempre tenho dito para as pessoas do meu círculo de convivência: “não façam política. Façam meta-política”. Porquê? Porque fazer política num país em que o governo está sob um partido revolucionário é dar um tiro no próprio pé. Ela vai ser sempre e em toda parte inviável. E neste país temos visto muitos acadêmicos serem assassinados porque querem fazer política, quando, na verdade deviam fazer outra coisa, deviam fazer meta-política e esquecerem a política.

Num país sob um governo de um partido revolucionário só se pode quebrar a hegemonia do partido no poder de quatro maneiras e passo a mencioná-las;
1.           Intervenção divina
2.           Mudança da ordem internacional
3.           Revolução cultural
4.           Insurreição armada

Neste artigo, quero me focar nas duas últimas estratégias. A revolução cultural como Gramsci a idealizou consiste na lenta e progressiva ocupação de espaços na mídia, universidades, igrejas e assim por diante. Esse processo pode durar uma geração inteira, ou seja, estamos a falar de trinta, quarenta anos para se ter algum resultado.  Sem isso, não adianta tentar fazer política, i.e., tentar conquistar ou preservar o poder. Sem isso não adianta tentar fazer nenhuma insurreição armada.

E no que tange a insurreição armada é sempre bom olhar para trás e dar ouvidos a quem já fez uma e com sucesso e esse fulano foi Lenine. Este grande ideólogo do comunismo do século passado disse que a revolução se faz do exterior. Portanto, tentar fazer uma insurreição política ou militar do interior é um suicídio.

Mas convém lembrar, mais uma vez, que toda e qualquer acção começa com a especulação acerca das possibilidades de acção. E que qualquer especulação acerca das possibilidades de acção começa com a especulação acerca de como a realidade funciona.

Quando Marx dizia na sua 12 a tese contra Feuerbach que não se tratava de interpretar a realidade, mas de transformá-la, ele deixou aí claro para todo mundo qual é a essência da ideologia revolucionária. Agora, não se pode superar o movimento revolucionário endossando-o, mas sim substituindo-o e substitui-lo é colocar o seu inverso em seu lugar, ou seja, se os revolucionários estão mais prometeicamente preocupados em transformar o mundo, os reacionários, os conservadores deviam estar mais preocupados em compreendê-lo acima de qualquer outra preocupação.

ESCRITO POR|XADREQUE SOUSA| shathreksousa@gmail

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