A totalidade dessas
artes do espírito e da matéria, a saber: o trivium e o quadrivium, nos leva a
evolução ou mutação do ser tomado comutavelmente, no contexto das leis eternas
do pitagorismo.
As artes liberais foram descobertas na idade média
europeia e elas são compostas por 7 artes divididas em dois agrupamentos, a
saber: o trivium e o quadrivium, sobre o que passo a
discorrer a seguir sob a perspectiva das leis eternas dos pitagóricos.
A palavra trivium
significa três vias ou três caminhos e lida com as três artes do espírito, a
saber: gramática, retórica e lógica.
A gramática é a arte de escrever correctamente. A retórica
é a arte de falar correctamente e, a lógica é a arte de pensar correctamente.
O termo correctamente, aqui, quer dizer sem erros, o que
significa que estamos a tratar do trivium,
das artes do espírito, no plano do axio-antropológico, que é o plano da
praticidade humana e, não no plano do meramente especulativo, o qual procura
chegar a valores mais sólidos, não mais do certo e do errado mas, sim, do
verdadeiro e do falso.
O quadrivium,
por sua vez, significa quatro vias ou quatro caminhos e se refere as quatro
artes da matéria, nomeadamente: aritmética, música, geometria e astronomia.
A aritmética está ligada a música e a geometria está
ligada a astronomia. Na verdade, a música é simplesmente a aplicação da
aritmética e a astronomia é, por sua vez, a geometria aplicada.
Hodiernamente, o trivium
corresponderia ao que se chama letras e o quadrivium
ao que se chama ciências, se bem que, essa distinção seja, até certo ponto,
pueril como veremos mais adiante. Mas, de todo modo, o trivium representa o domínio sobre o espírito e o quadrivium representa o domínio sobre a
matéria.
Vimos, logo no começo deste artigo que, a soma do trivium com o quadrivium nos dá as sete artes liberais.
No seu livro, “Pitágoras e o tema dos números”, o filósofo
brasileiro, Mário Ferreira dos Santos, demonstra que os números, no contexto do
pitagorismo, não são apenas símbolos quantitativos mas, também qualitativos,
aliás, antes qualitativo e depois quantitativo. Na verdade, ele demonstra que
os números, tomados pitagoricamente, expressam leis eternas filosoficamente teorizáveis.
Mário Ferreira dos Santos, por exemplo, diz que para os
pitagóricos, o número 3 simboliza relação, o número 4 representa reciprocidade
e o número 7 simboliza a mutação ou evolução.
Neste contexto, o trivium,
as 3 artes do espírito, podem simbolizar que, a arte do espírito, por ser
triádica, ela é sempre uma relação, uma relação entre a unidade monádica e a
oposição diádica. Onde não há nenhuma relação, a arte do espírito é uma impossibilidade
pura e simples porque ela se dá sempre numa relação.
As 4 artes da matéria, no contexto pitagórico das leis
eternas, o quadrivium, simbolizam a
reciprocidade, uma reciprocidade entre a unidade monádica e a relação triádica,
ou uma reciprocidade da oposição diádica em si mesma. É claro que muito mais
combinações são possíveis mas, para já, para aquilo que é o propósito deste
artigo, julgo ser o exposto suficiente.
A totalidade dessas artes do espírito e da matéria, nos
leva a evolução ou mutação do ser tomado comutavelmente, simbolizada pelo número
7, no contexto das leis eternas do pitagorismo. Essa evolução é a evolução da
harmonia que resulta da combinação da relação com a reciprocidade. Ela, também
poderia resultar da combinação da harmonia com a unidade, da forma com a
oposição.
Todas as leis eternas tendem para a unidade
transcendental, a qual é simbolizada pelo número 10 e, acontece que as artes liberais
vão apenas até a mutação ou evolução e, não podem dar ao seu praticante, por
exemplo, a ascensão, a qual é representada pelo número 9, sem a qual não se
pode chegar a tão almejada unidade transcendental.
Mas isso não constitui nenhum problema ou uma deficiência
das artes liberais até porque o propósito delas não é conduzir o homem a
ascendência e muito menos a unidade transcendental mas apenas a evolução ou
mutação. De facto, mesmo que não tenhamos o domínio completo das artes
liberais, ninguém pode negar que a relação e a reciprocidade são a base da
mudança do ser humano, não apenas essas leis eternas mas, também a forma e a
oposição, a harmonia e a unidade, a relação em si mesma e assim por diante.
Se quisermos mudar o ser humano, eis aí uma sugestão muito
útil, a saber: artes liberais. O indivíduo que seja capaz de dominar artisticamente
a gramática, a retórica, a lógica, a aritmética, a música, a geometria e a
astronomia, descobrir-se-á, ao cabo de algum tempo, um indivíduo mudado,
evoluído, o que significa mais liberdade.
Liberdade não significa que você não está pré-determinado
a nada mas que você vai conseguir, doravante, se orientar no meio da tensão
entre determinismo e livre arbítrio e não pender para o determinismo puro e
cair no calvinismo ou tender para o livre-arbítrio puro e cair no arianismo.
Nos programas escolares, ensinam-se algumas dessas artes
liberais como a gramática, a lógica, a aritmética e a geometria mas, elas não são
ensinadas como arte mas como teoria e até mesmo como mera obrigação escolar e profissional.
Resultado: quando o aluno usa a gramática, a retórica e a lógica, não há aquela
“expressão de impressões” de que falou Benedetto Croce, a qual é a essência
mesma da arte, o que mostra que não há liberdade de espírito possível quando as
pessoas usam as artes liberais de forma não artística mas, conforme
teoricamente pré-determinada.
O mesmo se dá quando falamos do quadrivium, onde a liberdade da matéria também não acontece porque
a aritmética, a música, a geometria e a astronomia não são exercitadas
artisticamente, como arte, mas como uma obrigação escolar ou profissional.
Dessa maneira, é impossível chegar a tal mutação ou
evolução a que as artes liberais se propõem desde a perspectiva pitagórica da
coisa porque em se tratando de artes, isso pressupõe que o estudo do trivium e do quadrivium não estão predeterminados a nenhuma teoria científica e
a nenhuma profissão ou dever escolar. Aliás, a própria expressão artes liberais
chega a ser uma redundância tous court
porque só existe arte liberal. A arte escrava não existe. A própria expressão
arte comercial só é, na verdade, uma interface entre a arte e o seu inverso.
Para quem estiver interessado neste assunto, eu recomendo,
para maior aprofundamento, a leitura do livro da irmã Miriam Joseph com o título
“the trivium and the quadrivium”, o qual pode ser encontrado facilmente no Google, ou a procurar na internet o vídeo da palestra sobre o livro
da irmã Miriam, a qual (palestra) foi organizada pela editora brasileira “É
realizações” e que teve como prelector o saudoso José Monir Nasser.
O aproach
constante do livro da irmã Miriam Joseph e da palestra do Dr. Nasser é
diferente daquele que eu usei aqui pelo que será bastante interessante
consultar esse material que servirá de complemento indispensável para o que eu
escrevi neste artigo, para além de oferecer os fundamentos mais básicos para a compreensão
das artes liberais do trivium e do quadrivium e começar a praticá-las com
vista a alcançar a evolução que com ela se pode alcançar.
ESCRITO POR|XADREQUE SOUSA| shathreksousa@gmail.com
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