quarta-feira, 9 de maio de 2018

O fim justifica os meios?

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Ora, sendo assim, o julgamento dos meios que se usam em política nos leva para fora do realismo político... Assim, julgar Dhlakama pelos meios que ele usou para conseguir seus objectivos políticos é estar fora da realidade política.


Quando se fala de Afonso Dhlakama, a primeira coisa que aparece na cabeça de qualquer um é a guerra dos 16 anos. Tomando esse capítulo da nossa história como ponto arquimédico para reflexão, a Frelimo olha para Dhlakama como alguém que desestabilizou o país, como  lacaio dos regimes minoritários do apartheid e da Rodhesia.

Enquanto isso, os partidários da Renamo não olham para Dhlakama como um homem que desestabilizou o país numa guerra de quase duas décadas mas como um homem que forçou a mudança do sistema político do país de um sistema comunista para um sistema democrático.

Por outras palavras, temos aqui uma síntese e uma antítese e portanto, o cenário para a discussão dialéctica está montado.

Maquiavel no “Príncipe” diz que o fim justifica os meios. Portanto, o filósofo italiano apregoa, aqui, a neutralidade moral dos meios. Por outras palavras, em política não há meios morais nem imorais mas apenas meios. E, por mais incrível que pareça Maquiavel está montado na razão porque somente o sujeito, neste caso, o homem, pode ser moral ou imoral e não os meios que ele usa para lograr seus intentos.

Agora, todo cientista político, com a excepção de um ou dois, olha para Maquiavel como o pai do realismo político. Ora, sendo assim, o julgamento dos meios que se usam em política nos leva para fora do realismo político e acabamos caindo no idealismo político. Assim, julgar Dhlakama pelos meios que ele usou para conseguir seus objectivos políticos é estar fora da realidade política.

Há analistas que procuram estabelecer a dicotomia entre política e guerra, ou entre um político e um militar. Porém, acontece que essa dicotomia não existe. Já dizia o estratega militar prussiano Clausewitz que “a guerra é a continuação da política por outros meios”. Por outras palavras, guerra é política feita com recurso a violência e não com recurso a palavra falada.

Podemos também entender as declarações dos partidários da Frelimo do ponto de vista da ideologia em torno da qual este partido constrói seu imaginário colectivo. Essa ideologia é o comunismo marxista-leninista. Pertence a Lenine a seguinte frase: “acusem-nos dos crimes que nós cometemos e insulte-nos do que nós mesmos somos”. Essa rotulação inversa do comunismo é seguida com devoção religiosa até hoje. Quando um comunista diz que você é um assassino, ele está querendo dizer que ele é um assassino ou está planeando cometer um assassinato. Portanto, quando os partidários da Frelimo dizem que Dhlakama desestabilizou o país, eles querem dizer que eles é que desestabilizaram o país. Aliás, qualquer guerra sempre tem dois lados.

Podemos também olhar para Dhlakama do ponto de vista dos objectivos que ele queria atingir ou que atingiu com seu movimento de guerrilha e fazer assim uma análise teleológica ou seja, uma análise do fim buscado ou alcançado. Se o fim justifica os meios e o fim desejado foi obtido, então, do ponto de vista do realismo político, o meio usado está justificado.

Agora, podemos, se quisermos, levar a questão para o lado moral da coisa e discutir se o meio usado foi bom ou mau. Contudo, ao fazer isso, saímos do campo da política e entramos no campo da axiologia, da ética e mais propriamente no campo da moral. Porém, qual é a moral que é válida na política? A moral militar, a económica ou a religiosa?

Se calhar, a pessoa que deu a melhor resposta para essa questão foi o filósofo alemão F.Nietzsche (cf. Anticristo) que escreveu que, na política, somente é bom aquilo que ajuda a aumentar o poder ou a sensação de poder e que é mau aquilo que tem o efeito contrário.

B.Russel disse que a política tem como objectivo final o poder. Ele estava montado na razão. O.d.Carvalho define poder como “possibilidade concreta de acção”. Ora, ninguém pode negar que com a guerra dos 16 anos, a possibilidade concreta de acção da Renamo aumentou bastante. Uma possibilidade concreta é aquela que aglutina todos os aspectos dessa possibilidade. Se no princípio a Renamo somente tinha uma possibilidade militar, ela acabou adicionando a essa possibilidade outras como a possibilidade económica e cultural.

Dhlakama é alguém que divide opiniões. Porém, opinião é exactamente isso, uma opinião. Portanto, ela está abaixo da certeza. Geralmente, as pessoas que reprovam as acções do Dhlakama fazem isso por motivos passionais. Por outras palavras, “a Renamo matou um familiar meu, ou destruiu minhas propriedades. Portanto, não gosto do Dhlakama”. Ninguém é obrigado a gostar do Dhlakama. Porém, quando você diz que gosta ou que não gosta você não está tomando conhecimento do objecto que está diante de si, você está apenas entrando dentro de si e projectando naquele objecto aquilo que você está sentindo. Portanto, a imagem que você tem daquele objecto não corresponde a imagem objectiva daquele objecto mas a sua imagem subjectiva.

Não é correcto julgar e condenar alguém por aquilo que nós sentimos a respeito dele mas por aquilo que aquela pessoa fez e nenhum ser humano faz apenas o mal ou apenas o bem. Se fizéssemos apenas o mal, então, seriamos o mal metafísico, seriamos o próprio diabo. E se fizéssemos apenas o bem seriamos o bem metafísico, seriamos o próprio Deus. O ser humano, tomado existencialmente, enfrenta oposição do bem e do mal no seu ser.

Agora, há um aproveitamento político nisso tudo que procura apenas ressaltar a guerra que Dhlakama liderou e escamotear a ordem que emergiu do caos da guerra. É preciso saber distinguir o que é um facto do que é apenas propaganda político-partidária. Um facto é aquilo que aconteceu enquanto propaganda é aquilo que o partido quer que as pessoas pensem que aconteceu. Um exemplo é o que tem sido imposto pela elite globalista de que temos que aceitar como mulher um homem que mudou de sexo e que se veste de mulher. Porém, isso é apenas propaganda porque aquele homem continua sendo homem porque isso está na sua base genética e não há como mudar isso mesmo mudando o sexo, a vestimenta, etc.

Isso não significa que temos duas histórias do Dhlakama. De modo nenhum. Temos apenas uma história. Porém, temos várias interpretações ou pelo menos duas interpretações dessa mesma história. Podemos até falar de duas ou mais narrativas dessa mesma história. Então, a disputa aqui é de interpretações que se fazem ao sabor dos interesses de uma e de outra parte. Isso, contudo, não significa que todas as interpretações são válidas. Isso seria cair no relativismo e negar, assim, a existência de um fundo de realidade sobre o qual apoiamos essas interpretações.

Cientificamente, para sabermos que uma interpretação é válida ou não, temos que fazer duas coisas. Primeiro: temos que verificar a consistência lógica interna dessa interpretação. Segundo: temos que confrontar essa interpretação com a realidade. Porém, como a discussão sobre a guerra dos 16 anos é feita apenas no nível das emoções, não há aqui nenhuma honestidade intelectual e uma vez que não é possível resolver essa questão no campo do mero debate filosófico ou no campo da análise científica tudo o que resta é cada um exprimir as suas emoções mais baixas pensando que está a fazer a análise mais objectiva do mundo, quando as condições para tal nem ao menos estão criadas.

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