“O socialismo só
funciona em dois lugares: no céu, onde ele não é necessário e no inferno, onde
ele já existe"
Ronald Reagan
Essa
sentença de Reagan não é apenas uma paródia do socialismo mas ela encerra uma
grande verdade sobre a mentalidade revolucionária conforme amplamente estudada
pelos filósofos Eric Voeglin, Hannah Arendt e Olavo de Carvalho.
Dessa
sentença de Reagan podemos concluir, por entimema, que a igualdade social
somente pode ser alcançada na outra vida, no plano da eternidade e que qualquer
veleidade de implantar o paraíso socialista na terra é um delírio hipnótico.
Não sei se Reagan leu Eric Voeglin mas, seja
como for, sua sentença tem a cara daquele bom e velho “filósofo da consciência”
de modo que podemos resumir o dito de Reagan naquela famosa expressão voegliana
de “imanentização do escatho” por
meio de uma fé metastática.
Ninguém
nega que o socialismo, ou seja, a igualdade social, é viável. O que se nega é
sua viabilidade no plano histórico. Frederich August Von Hayek diz que, nesta
vida, o socialismo só é viável em comunidades muito pequena onde todo mundo
conhece todo mundo. Ele diz que em comunidades com uma massa populacional muito
grande, o socialismo só seria viável se as autoridades fossem omniscientes, de
outro modo como é que eles fariam a planificação central? É por isso que
Gramsci dizia que o partido-príncipe devia ser “um poder onipotente e invisível
de um imperativo categórico, de um mandamento divino” (sic). Para quê? “Para que
todos se tornem socialistas sem saber” (sic). É claro que como filosofia isso não
vale o esforço de um peido mas como estratégia é temível.
Contudo,
mesmo que não haja nenhum governo omnisciente por mais totalitário que ele seja
o socialismo pode ser viável, porém, viável politicamente mas não economicamente.
Politicamente o socialismo é viável porque o socialismo pressupõe acumulação de
poder nas mãos da elite socialista com vista a implantação do “maravilhoso
mundo novo” de que falou Aldous Huxley e política, conforme já deixei registado
em dezenas de artigos postados neste blog,
é uma disputa de poder como diz Bertrand Russel, ou pelo menos, é assim desde
Maquiavel porque os antigos gregos tinham uma visão diferente daí Aristóteles
dizer que a política tem que ver com a administração da polis com vista o alcance do bem-comum. Porém, Aristóteles estava
errado, a substância da política é o poder, a sua conquista e manutenção ad aeterno enquanto a substância mesmo do
governo é que é o bem-comum. Isso pode parecer um tanto ou quanto confuso
porque, neste país, as pessoas habituaram-se a confundir política com o
exercício de cargos administrativos mais um dos shows de inépcia da nossa classe politica, académica e midiática.
A inviabilidade económica do socialismo foi
demonstrada em 1920 por Ludwig Von Mises no seu livro “o cálculo económico no
socialismo” nos seguintes termos: o que é socialismo? Planificação central. O que
é planificação central? Cálculo de preços. Então, conclui Mises, se você abole
o mercado as mercadorias não terão preço e se elas não tiverem preço não haverá
cálculo de preços e não havendo cálculos de preço não haverá planificação central
e se não há planificação central não há socialismo e assunto encerrado. Quer dizer,
quem tenha acreditado em economia socialista por um minuto que seja é porque
acredita no quadrado redondo.
Ao
dizer que o socialismo funciona no céu e no inferno, Reagan mostra que entendia
muito bem as origens do socialismo que remontam as antigas seitas gnósticas e é
por isso que eu aludi ao Eric Voeglin que ao lado de Hans Hurs Von Baltazar,
James Bilington, etc., é dos maiores estudiosos do assunto.
O
que é o gnosticismo? É uma revolta contra Deus. O gnóstico parte da crença de
que o universo é hostil e a humanidade é inviável. Ora, como pode ser isso se
Deus é o criador do universo e da humanidade, perguntará o leitor. Isso é assim
porque os gnósticos não acreditam que o mundo foi criado ex nihiilo por Deus mas, sim, por um demiurgo, um executor
material. Então, Deus seria um demiurgo mau. By the way, eles acreditam que para mudar esse estado de coisas,
eles devem ter todo o poder, um poder totalitário em suas mãos, eis aqui a
origem do totalitarismo dos movimentos revolucionários e é por isso que eles têm
esse carácter religioso.
O
termo céu e inferno podem ser entendidos literalmente ou apenas simbolicamente.
Sendo Reagan um conservador e sendo um dos pilares do conservadorismo a apologia
da moral tradicional judeo-cristã, podemos dizer que Reagan estava falando do
céu e do inferno no sentido literal mas sendo ele também um ex-actor podemos
dizer que ele também estava falando no sentido figurado. Na verdade, como disse
um filósofo judeu antes de Cristo que a Bíblia pode ser interpretada
literalmente ou simbolicamente. Por outras palavras, o que ontem foi um facto
hoje pode ser um símbolo e o que hoje é um símbolo amanhã pode tornar-se num
facto.
Literalmente,
o céu, tal como aparece no vocabulário da mística judaica é o trono de Deus,
mas no vocabulário da mística cristã é um lugar de repouso existencial para
aqueles que crêem em Cristo e fazem o bem ao seu semelhante. Em sentido
figurado pode ser entendido como o universo das ideias arquetípicas platónicas.
O inferno, por sua vez, é um lugar de castigo para os maus, é o sofrimento
existencial. Figurativamente, ele pode ser interpretado como um lugar de degradação
moral, política, económica, social, etc.
No
céu, o socialismo funciona porque, sendo o céu o próprio paraíso a que aspiram
os socialistas, o socialismo encontra no céu a sua total e completa realização.
Quando Reagan diz que o socialismo, no céu, malgrado seja funcional, ele não é necessário,
ele só está querendo mostrar que a igualdade social é apenas assertória no que
tange ao juízo que fazemos do próprio paraíso. Por outras palavras, não é a
igualdade social que faz o céu mas é o céu que faz a igualdade social de modo
que tentar viabilizar a igualdade social aqui na terra para fazer da terra um
paraíso edénico não passa de metonímia, uma inversão metafísica do nexo
causa-efeito.
Reagan
também diz que o socialismo funciona no inferno onde ele já existe. Veja,
Norberto Bobbio dizia que o remédio para os problemas da democracia era mais
democracia enquanto isso Thomas Jefferson acreditava que mais democracia
acabaria desembocando em ditadura. Que há problemas de igualdade na terra
ninguém pode negar porém, acreditar que o remédio para os problemas da igualdade
é mais igualdade é cometer um non
sequitur tão mastodonticamente ilógico quanto a crença de Bobbio da
democracia como causa suis.
Simone
Weil dizia que “estar no inferno é a pessoa por engano pensar que está no céu”(sic).
Quer dizer, a tentativa de implantar a igualdade social aqui na terra só fá-la
transformar-se no seu contrário. Isso é que é o inferno, ou seja, a caricatura demoníaca
do paraíso. Ao querer fazer da URSS, China, Cambodja, um estado muito melhor do
que os EUA, Inglaterra e França, Stalin, Mao Tse Tung e Pol Pot acabaram matando
mais de 100 milhões de civis inermes que eles haviam prometido libertar dos
malditos capitalistas burgueses. Que eles foram libertos ninguém pode negar. Eles
foram libertos da sua existência humana. Ao invés de transformar os seus países
nos maravilhosos paraísos socialistas que eles prometeram, transformaram-no num
inferno dantesco ao alcance de todos.
O
termo existir como já assinalei em outros artigos vem do latim ex sistere que significa situar-se fora
de si. Uma breve leitura do romance do escritor cubano Leonardo Padura “le
hombre que amaba a los peros”, depreende-se claramente que o estado de coisas imposto
pela maior utopia que o homem já inventou na China sob Mao Tse Tung, URSS sob
Lenine e Stalin, Cambodja sob Pol Pot, Cuba sob Che Guevara e os irmãos Castro,
etc., não parecia coisa de homens. Uma breve leitura do “livro negro do comunismo”,
de Stefan Courtois, um ex-comunista, também não o deixará ileso. Reagan estava
montado na razão quando discursando diante de uma plateia de evangélicos disse
que “a URSS é o eixo do mal”(sic). Que pode ser o eixo do mal a não ser o
próprio inferno? Havia igualdade na URSS? Sim. Uma igualdade nivelada por baixo
a qual somente existe num regime escravocrata e não é para menos porque se você
abole o mercado, você abole, automaticamente, os preços das mercadorias. O trabalho
é uma mercadoria e se ele passa a não ter preço ou salário, o que é que sobra? Sobra
o trabalho escravo.
Não
concordo com Cristophen Hitchens (recentemente falecido) na quase totalidade dos
delírios ateísticos acerca da religião, porém, quando ele diz que a Coréia do
Norte é um campo de concentração nas mãos da família Kim, ele acertou na mosca
em cheio. Quer queiramos, quer não, este é o único socialismo viável que alguma
vez existiu conforme documentado nos anais da história.
ESCRITOPOR|XADREQUE SOUSA|shathreksousa@gmail.com
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