quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Analfabetos, semianalfabetos e analfabetos funcionais

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Até hoje não consegui entender como é que da minha premissa de que algumas pessoas são semianalfabetas e analfabetas funcionais alguém pôde deduzir a conclusão do meu leonino tribalismo, um risco hercúleo contra a nossa preciosa unidade nacional.

O meu ilustre companheiro, ao cometer um non sequitur dessa envergadura demonstrou ser ele próprio um analfabeto funcional e não se deu conta disso ao dar às minhas palavras um sentido que elas não tinham e nem poderiam ter.

Numa conversa que eu tive no ano passado com um companheiro meu, eu disse que alguns dos nossos políticos eram semianalfabetos e que outros tantos eram analfabetos funcionais e que isso não era privilégio exclusivo dos políticos porque até no meio universitário existiam professores que eram semianalfabetos e analfabetos funcionais ao que o meu companheiro sentiu-se ofendidíssimo e disse que eu estava a ser tribalista, e dí-lo com aquela mesma “intensidade passional” (sic) de que falou o poeta William Butler Yeats nos seguintes versos:

“The best lack all conviction
While the Worst are full of passionate intensity”.

Até hoje não consegui entender como é que da minha premissa de que algumas pessoas são semianalfabetas e analfabetas funcionais alguém pôde deduzir a conclusão do meu leonino tribalismo, um risco hercúleo contra a nossa preciosa unidade nacional que de 1975 a 2004 ia do Rovuma ao Maputo mas que a partir de 2004 até ao presente dia, não se sentido suficientemente inclusiva, caiu-lhe em graça ir, também, do Zumbo ao Índico.

O meu ilustre companheiro, ao cometer um non sequitur dessa envergadura demonstrou ser ele próprio um analfabeto funcional e não se deu conta disso ao dar às minhas palavras um sentido que elas não tinham e nem poderiam ter, pior ainda porque para você chegar a uma conclusão, você precisa de duas premissas dadas como autofundantes, autoprobantes, salvo naquelas situações em que uma das premissas é sobejamente conhecida, podendo, neste caso, ser subentendida como acontece nos entimemas, caso contrário é erística vulgar e visa a ganhar um debate sem que se esteja da posse da razão.

Se eu enunciei uma única premissa e não mantive oculta nenhuma outra simplesmente porque o meu plano discursivo era meramente narrativo e não analítico como é que o meu ilustre companheiro chegou a surreal conclusão de que eu era tribalista? Por meio da intuição não é possível porque a intuição é um conhecimento direito, imediato o que desabona in limine a possibilidade de uma conclusão. Por meios racionais, também não é possível porque o conhecimento racional é um conhecimento mediato, ou seja, ele requer a mediação de um termo médio que na minha alocucação estava totalmente ausente.

Ora, se essa conclusão do meu ilustre companheiro não passou pelo filtro da sua inteligência, só pode ser uma mera reacção somática do tipo “gostei, não gostei” sem nenhuma representação mental ou psíquica do objecto mesmo ao qual o interlocutor se refere. Quer dizer, ele está vivendo no reino da total e completa falsidade noética e existencial.

Descartes disse, nas “meditações de filosofia primeira”, que a verdade e a falsidade não estão nas premissas mas sim no juízo, mas acontece que as atitudes, os trejeitos, as emoções que essas pessoas esboçam não correspondem in limine ao seu objecto discursivo, sendo apenas um flatus vocis, um urro do homem da caverna.

Nesse reino da “segunda realidade” como o chamou Musil e Voeglin, as palavras têm por si só um poder de despertar nas pessoas reacções, atitudes, comportamentos, etc., estereotipados ao mero apelo delas independemente do conteúdo a que elas se referem dentro da estrutura da realidade porque o sócio-construtivismo entrou tão fundo nessas pessoas que elas passaram a acreditar que podem mudar a realidade à simples repetição mântrica de certos slogans, topois (lugar-comum), etc.

Mas eu não sou tão idiota assim e desde muito cedo percebi que quele meu companheiro era um comunista enrustido, seu entusiamo russófilo era disso prova irrefutável. Isso é mais do que suficiente para saber como é que um tipo assim pensa e como ele encara um debate mesmo que nunca tenha lido uma linha se quer de Lenine. Aliás, de tanto ouvir pessoas saindo em defesa de Marx, Lenine, Estaline, etc., sem nunca os ter lido já começo a acreditar que para ser comunista não é preciso ler coisa nenhuma porque o comunismo se transmite por osmose.

Aristóteles dizia que um dos requisitos fundamentais para que haja um debate verdadeiro é que os dois debatedores sejam honestos. A fórmula da honestidade intelectual se resume àquelas palavras do filósofo Olavo de Carvalho, a saber, “não dizer que sabe o que não sabe e não dizer que não sabe o que sabe perfeitamente bem”. A ocultação e a falsificação são incompatíveis com a honestidade num debate cujo fim seja encontrar a verdade a busca da qual pressupõe a sinceridade de facto.

Lenine discorda totalmente de Aristóteles. Para ele um debate só tem um fim, a saber: o aniquilamento do adversário. Daí aquela famosa máxima que ele enunciou: “insulte-os do que somos e acuse-os dos crimes que cometemos”(sic). Quer dizer, Lenine resume o debate entre polos opostos a luta política nos moldes schimitiano de amigo versus inimigo em que o mais importante não é a busca da verdade mas aquilo que H. Arendt chamava de “character assassination” (sic).

Ora, se estivermos a debater com um adversário desonesto temos o dever moral de denunciar a sua desonestidade e não entrar na sua camisa de força, não deixar que ele molde o debate, mas expor a execração pública seu ardil psicológico. Por outras palavras, não se debate com um adversário desonesto, denuncia-se o ardil psicológico das suas colocações e ponto final.
***
Não é preciso ser nenhum Pascal Bernadin, nenhuma Charlotte Izerbyt, enfim, um expert em educação, para saber que um individuo que não sabe ler nem escrever é um analfabeto. Eu fui alfabetizador de adultos e coordenador da alfabetização e educação de adultos (AEA) por 3 anos na Escola Maxaquene Primária Khovo, portanto, não sou nenhum debutante no assunto.

Fora os indivíduos que não sabem nem ler, nem escrever, existem aqueles que escrevem e lêem erradamente e isso não apenas no nível primário mas até mesmo no ensino superior encontramos pessoas assim com dificuldade enorme de comunicação e expressão escrita e oral na língua de Camões. Esses são os chamados semianalfabetos, sejam eles quem forem, “isso não inflói, nem contribói” como dizia Paulo Francis e nem faz de mim um tribalista.

Um outro nível de analfabetismo é, pois o analfabetismo funcional, o qual é uma deficiência mental, facilmente diagnosticável com recurso à técnica de diagnóstico do Dr. Reuven Feurestein, um psicólogo israelita. Essa deficiência mental manifesta-se pela incapacidade do indivíduo analisar um texto, um discurso, uma frase, etc., de um outro individuo desde a experiência real daquele mesmo individuo.

Um exemplo:

Na república Federal do Brasil, o deputado federal Jair Bolsonaro foi acusado no ano passado de ser um estuprador por ter dito à deputada Maria do Rosário que se ele fosse um estuprador nunca iria estuprá-la porque ela não merecia ser estuprada.

Diante disse, todo mundo caiu de pau em cima do Bolsonaro, desde deputados, jornalistas, STF (Supremo Tribunal Federal), o senado e tutti quanti. Ora, quem acompanha a política interna brasileira, sabe perfeitamente que o deputado Bolsonaro é uma das vozes mais sonantes da campanha anti estupro daquele país, o que deita por terra qualquer possibilidade de que ele seja um estuprador, a não ser, digamos assim, que ele seja um estuprador enrustido e que  é para camuflar o seu instinto de estuprador que ele defende o agravamento da pena de prisão para quem comete esse tipo de delito criminal, chegando até mesmo a propor pena de morte para quem estuprar e matar sua vítima, o que seria um verdadeiro tiro no pé.

Ora, qualquer individuo que tenha pelo menos 2 neurónios sabe que isso é um exemplo de analfabetismo funcional em toda linha, uma deficiência mental manifestada pela incapacidade de relacionar uma coisa com a outra para se chegar a uma conclusão porque a pessoa aprendeu a raciocinar por estereótipos. Quando ouve dizer que alguém é racista sai logo gritando que nem galinha: “Hitler, Nazista, Auschwitz, II Guerra Mundial” mesmo que a vítima do racismo não seja um judeu e que o suposto racista, longe de ser um Alemão loiro e de olhos azuis, seja apenas um mongolóide, um pigmeu da África e assim por diante.

Em Moçambique, os exemplos de analfabetismo funcional medram e abundam que é uma beleza. Em qualquer debate televiso, podemos colher uma amostra mais do que representativa dessa deficiência mental e, o pior de tudo isso é que essas mesmas pessoas são, no final do dia, incensadas como um ersatz, o supra-sumo da inteligência nacional. É o império das “imposturas intelectuais” de que falaram Alan Sokal e Jean Bricmont.

 Quando uma nação chega a esse ponto é que estamos num verdadeiro hospício do Dr. Mabuze de Fritz Lang, um hospício dirigido por loucos. Esse não é um fenómeno exclusivo de Moçambique mas um fenómeno mundial ao qual Moçambique sucumbiu, resignado, como diz aquele verso de António Machado:

Cuan difícil es
Quando todo baja
Não bajar también

Contudo, isso não serve de oblação para a absolvição da nossa culpa colectiva, se é que há algo a que se possa chamar culpa colectiva mas, que Moçambique não faz a vez de uma donzela nisso tudo, nenhum patriotismo por mais zeloso que o seja pode dar-se ao luxo de declinar, porque, vamos usar um nós atenuante, nós é que abrimos as portas á todas essas influências malignas, no final das contas, do sócio-construtivismo que está provado que causa até mesmo lesão no tecido cerebral. Ora, não admira o volume de casos de psicopatia que se tem registado nos últimos tempos que pode dizer-se ser mesmo um zeitgeist, um espírito da época.

ESCRITO POR|XADREQUE SOUSA|shathreksousa@gmail.com

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