Até hoje não consegui entender como é que
da minha premissa de que algumas pessoas são semianalfabetas e analfabetas
funcionais alguém pôde deduzir a conclusão do meu leonino tribalismo, um risco hercúleo
contra a nossa preciosa unidade nacional.
O meu ilustre companheiro, ao cometer um non
sequitur dessa envergadura demonstrou ser ele próprio um analfabeto funcional e
não se deu conta disso ao dar às minhas palavras um sentido que elas não tinham
e nem poderiam ter.
Numa conversa que eu tive no ano passado com um companheiro
meu, eu disse que alguns dos nossos políticos eram semianalfabetos e que outros
tantos eram analfabetos funcionais e que isso não era privilégio exclusivo dos
políticos porque até no meio universitário existiam professores que eram
semianalfabetos e analfabetos funcionais ao que o meu companheiro sentiu-se
ofendidíssimo e disse que eu estava a ser tribalista, e dí-lo com aquela mesma
“intensidade passional” (sic) de que falou o poeta William Butler Yeats nos
seguintes versos:
“The best lack all conviction
While the Worst are full of passionate intensity”.
Até hoje não consegui entender como é que da minha
premissa de que algumas pessoas são semianalfabetas e analfabetas funcionais alguém
pôde deduzir a conclusão do meu leonino tribalismo, um risco hercúleo contra a
nossa preciosa unidade nacional que de 1975 a 2004 ia do Rovuma ao Maputo mas
que a partir de 2004 até ao presente dia, não se sentido suficientemente
inclusiva, caiu-lhe em graça ir, também, do Zumbo ao Índico.
O meu ilustre companheiro, ao cometer um non sequitur dessa envergadura
demonstrou ser ele próprio um analfabeto funcional e não se deu conta disso ao
dar às minhas palavras um sentido que elas não tinham e nem poderiam ter, pior
ainda porque para você chegar a uma conclusão, você precisa de duas premissas
dadas como autofundantes, autoprobantes, salvo naquelas situações em que uma
das premissas é sobejamente conhecida, podendo, neste caso, ser subentendida
como acontece nos entimemas, caso contrário é erística vulgar e visa a ganhar
um debate sem que se esteja da posse da razão.
Se eu enunciei uma única premissa e não mantive oculta
nenhuma outra simplesmente porque o meu plano discursivo era meramente
narrativo e não analítico como é que o meu ilustre companheiro chegou a surreal
conclusão de que eu era tribalista? Por meio da intuição não é possível porque
a intuição é um conhecimento direito, imediato o que desabona in limine a possibilidade de uma
conclusão. Por meios racionais, também não é possível porque o conhecimento
racional é um conhecimento mediato, ou seja, ele requer a mediação de um termo
médio que na minha alocucação estava totalmente ausente.
Ora, se essa conclusão do meu ilustre companheiro não
passou pelo filtro da sua inteligência, só pode ser uma mera reacção somática
do tipo “gostei, não gostei” sem nenhuma representação mental ou psíquica do
objecto mesmo ao qual o interlocutor se refere. Quer dizer, ele está vivendo no
reino da total e completa falsidade noética e existencial.
Descartes disse, nas “meditações de filosofia primeira”, que
a verdade e a falsidade não estão nas premissas mas sim no juízo, mas acontece
que as atitudes, os trejeitos, as emoções que essas pessoas esboçam não correspondem
in limine ao seu objecto discursivo,
sendo apenas um flatus vocis, um urro
do homem da caverna.
Nesse reino da “segunda realidade” como o chamou Musil e
Voeglin, as palavras têm por si só um poder de despertar nas pessoas reacções,
atitudes, comportamentos, etc., estereotipados ao mero apelo delas
independemente do conteúdo a que elas se referem dentro da estrutura da
realidade porque o sócio-construtivismo entrou tão fundo nessas pessoas que
elas passaram a acreditar que podem mudar a realidade à simples repetição
mântrica de certos slogans, topois
(lugar-comum), etc.
Mas eu não sou tão idiota assim e desde muito cedo percebi
que quele meu companheiro era um comunista enrustido, seu entusiamo russófilo era
disso prova irrefutável. Isso é mais do que suficiente para saber como é que um
tipo assim pensa e como ele encara um debate mesmo que nunca tenha lido uma
linha se quer de Lenine. Aliás, de tanto ouvir pessoas saindo em defesa de
Marx, Lenine, Estaline, etc., sem nunca os ter lido já começo a acreditar que
para ser comunista não é preciso ler coisa nenhuma porque o comunismo se
transmite por osmose.
Aristóteles dizia que um dos requisitos fundamentais para
que haja um debate verdadeiro é que os dois debatedores sejam honestos. A
fórmula da honestidade intelectual se resume àquelas palavras do filósofo Olavo
de Carvalho, a saber, “não dizer que sabe o que não sabe e não dizer que não sabe
o que sabe perfeitamente bem”. A ocultação e a falsificação são incompatíveis
com a honestidade num debate cujo fim seja encontrar a verdade a busca da qual
pressupõe a sinceridade de facto.
Lenine discorda totalmente de Aristóteles. Para ele um
debate só tem um fim, a saber: o aniquilamento do adversário. Daí aquela famosa
máxima que ele enunciou: “insulte-os do que somos e acuse-os dos crimes que
cometemos”(sic). Quer dizer, Lenine resume o debate entre polos opostos a luta
política nos moldes schimitiano de amigo versus
inimigo em que o mais importante não é a busca da verdade mas aquilo que H. Arendt
chamava de “character assassination” (sic).
Ora, se estivermos a debater com um adversário desonesto
temos o dever moral de denunciar a sua desonestidade e não entrar na sua camisa de força, não
deixar que ele molde o debate, mas expor a execração pública seu ardil
psicológico. Por outras palavras, não se debate com um adversário desonesto,
denuncia-se o ardil psicológico das suas colocações e ponto final.
***
Não é preciso ser nenhum Pascal Bernadin, nenhuma
Charlotte Izerbyt, enfim, um expert
em educação, para saber que um individuo que não sabe ler nem escrever é um
analfabeto. Eu fui alfabetizador de adultos e coordenador da alfabetização e
educação de adultos (AEA) por 3 anos na Escola Maxaquene Primária Khovo,
portanto, não sou nenhum debutante no assunto.
Fora os indivíduos que não sabem nem ler, nem escrever,
existem aqueles que escrevem e lêem erradamente e isso não apenas no nível
primário mas até mesmo no ensino superior encontramos pessoas assim com
dificuldade enorme de comunicação e expressão escrita e oral na língua de
Camões. Esses são os chamados semianalfabetos, sejam eles quem forem, “isso não
inflói, nem contribói” como dizia Paulo Francis e nem faz de mim um tribalista.
Um outro nível de analfabetismo é, pois o analfabetismo
funcional, o qual é uma deficiência mental, facilmente diagnosticável com
recurso à técnica de diagnóstico do Dr. Reuven Feurestein, um psicólogo
israelita. Essa deficiência mental manifesta-se pela incapacidade do indivíduo
analisar um texto, um discurso, uma frase, etc., de um outro individuo desde a
experiência real daquele mesmo individuo.
Um exemplo:
Na república Federal do Brasil, o deputado federal Jair
Bolsonaro foi acusado no ano passado de ser um estuprador por ter dito à
deputada Maria do Rosário que se ele fosse um estuprador nunca iria estuprá-la
porque ela não merecia ser estuprada.
Diante disse, todo mundo caiu de pau em cima do Bolsonaro,
desde deputados, jornalistas, STF (Supremo Tribunal Federal), o senado e tutti quanti. Ora, quem acompanha a
política interna brasileira, sabe perfeitamente que o deputado Bolsonaro é uma
das vozes mais sonantes da campanha anti estupro daquele país, o que deita por
terra qualquer possibilidade de que ele seja um estuprador, a não ser, digamos assim,
que ele seja um estuprador enrustido e que é para camuflar o seu instinto de
estuprador que ele defende o agravamento da pena de prisão para quem comete esse
tipo de delito criminal, chegando até mesmo a propor pena de morte para quem estuprar
e matar sua vítima, o que seria um verdadeiro tiro no pé.
Ora, qualquer individuo que tenha pelo menos 2 neurónios
sabe que isso é um exemplo de analfabetismo funcional em toda linha, uma deficiência
mental manifestada pela incapacidade de relacionar uma coisa com a outra para
se chegar a uma conclusão porque a pessoa aprendeu a raciocinar por estereótipos.
Quando ouve dizer que alguém é racista sai logo gritando que nem galinha: “Hitler,
Nazista, Auschwitz, II Guerra Mundial” mesmo que a vítima do racismo não seja
um judeu e que o suposto racista, longe de ser um Alemão loiro e de olhos
azuis, seja apenas um mongolóide, um pigmeu da África e assim por diante.
Em Moçambique, os exemplos de analfabetismo funcional
medram e abundam que é uma beleza. Em qualquer debate televiso, podemos colher
uma amostra mais do que representativa dessa deficiência mental e, o pior de
tudo isso é que essas mesmas pessoas são, no final do dia, incensadas como um
ersatz, o supra-sumo da inteligência nacional. É o império das “imposturas
intelectuais” de que falaram Alan Sokal e Jean Bricmont.
Quando uma nação
chega a esse ponto é que estamos num verdadeiro hospício do Dr. Mabuze de Fritz
Lang, um hospício dirigido por loucos. Esse não é um fenómeno exclusivo de
Moçambique mas um fenómeno mundial ao qual Moçambique sucumbiu, resignado, como
diz aquele verso de António Machado:
Cuan difícil es
Quando todo baja
Não bajar también
Contudo, isso não serve de oblação para a absolvição da
nossa culpa colectiva, se é que há algo a que se possa chamar culpa colectiva
mas, que Moçambique não faz a vez de uma donzela nisso tudo, nenhum patriotismo
por mais zeloso que o seja pode dar-se ao luxo de declinar, porque, vamos usar
um nós atenuante, nós é que abrimos as portas á todas essas influências malignas, no
final das contas, do sócio-construtivismo que está provado que causa até mesmo
lesão no tecido cerebral. Ora, não admira o volume de casos de psicopatia que
se tem registado nos últimos tempos que pode dizer-se ser mesmo um zeitgeist, um espírito da época.
ESCRITO POR|XADREQUE SOUSA|shathreksousa@gmail.com
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