terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Confusão entre cultura e entretenimento

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O objectivo da aquisição de cultura não é o exibicionismo barato, o pedantismo ou o show-business. Longe disso, a aquisição de cultura visa a formação da personalidade do indivíduo, caso contrário, não importa quantos livros de história, filosofia, religião, poesia, etc., o indivíduo leia, ele será apenas um diletante para usar o vocabulário de Ortega y Gasset, um individuo que está apenas se divertindo com os livros mas que nunca chegará a ser um homem eticamente maduro, um spoudaios como o chamou Aristóteles.

Em Moçambique, cultura é marrabenta, capulana, matapa, enquanto na europa ocidental e nos EUA, cultura é se expressar correctamente na sua língua, quer em termos orais, quer em termos escritos e ser senhor e possuidor de um vasto saber não especializado.

Ora, essa coisa de confundir cultura com diversão, com entretenimento, é um fenômeno conhecido apenas em países culturalmente subdesenvolvidos. Uma cultura subdesenvolvida é aquela que vive de importação como disse Olavo de Carvalho e, num país assim, a alta cultura é uma impossibilidade pura e simples, é um quadrado redondo.

É deprimente ver como neste país não se pode conversar de igual para igual com um médico acerca de literatura de ficção; não se pode conversar de igual para igual com um economista acerca de religião comparada; não se pode conversar de igual para igual com um engenheiro acerca da filosofia escolástica; não se pode conversar de igual para igual com um sociólogo acerca da poesia grega e assim por diante.

Uma das perguntas mais frequentes que as pessoas sempre me fazem ao me saberem leitor de livros de filosofia, política, religião, literatura de ficção, etc., é sobre a utilidade de todas essas leituras ou o que é que elas têm a ver com a minha formação enquanto economista. O que mais me deixa triste é que essas perguntas não vêem da massa popular não instruída mas de indivíduos com formação universitária. É bastante lamentável ter que explicar para essas pessoas que não se adquire cultura por causa do que faremos com ela mas por causa do que a cultura fará connosco.

Num artigo publicado neste blog no ano passado, eu escrevi que os moçambicanos são muito dinheirista, que eles só acreditam na força do dinheiro, sendo assim, eles medem tudo em termos de dinheiro. Ora, essa visão dinheirista da realidade, essa visão economicista da realidade, por assim dizer, é a prova insofismável daquilo que eu venho dizendo sobre os danos causados a este país em decorrência do marxismo cultural imposto massivamente aos moçambicanos nos anos de chumbo.

Por outras palavras, segundo os moçambicanos, salvo raríssimas excepções, você só deve ler um livro de Shakespeare, Dostoievisky, Stendal ou escutar uma cantata de Bach, Paganini, ou ainda contemplar uma pintura de Velasquez, da Vinci, etc., se isso lhe der dinheiro, caso contrário, você é tido por bobo risível e o desprezo que os estudantes das ciências naturais mostram pelas humanas é disso prova insofismável.

É interessante notar que antes do século XX, os homens de ciência eram versados em filosofia e teologia e não apenas em ciências naturais. Tal foi o caso de Leibniz. Euler, o matemático, foi assim. Maxwell tinha interesse em teologia, Newton também o tinha e tive a oportunidade de ler um livro seu publicado a título póstumo, um “comentário de Daniel e Apocalipse” e assim por diante.

A ruptura da ciência com a filosofia e a teologia está na origem dos grandes erros científicos dos últimos 3 séculos como evolucionismo de Darwin, genes egoísta de Dawkin, Partícula de Deus e assim por diante. De facto, temos assistido a uma constante repetição de velhos erros que já foram refutados a milênios por Platão e Aristóteles e pela escolástica.

O culto da ciência como um campo de fenômenos hermeticamente fechado está na origem da “crise do mundo moderno” que está ligado a incapacidade de a ciência moderna compreender o homem como diz René Guenon. Essa incapacidade resulta da ruptura com a tradição no sentido mais restrito e da ruptura com a cultura no sentido mais elástico do termo mas, não a cultura popular, a cultura do homem-massa que se guia pelo espírito de rebanho mas a alta cultura literária, a erudição filosófica, enfim, a autoconsciência de um povo como a chamou Roger Scruton.

Infelizmente, neste país, cultura é um adorno, um apêndice a que as pessoas recorrem para participar de concursos televisivos, disputando prêmios que só servem para encher o ego de uns quantos imbecis ao invés de despertar nas pessoas a consciência dos valores em torno do qual o povo constrói o seu imaginário colectivo.
Na verdade, o que vemos nesses programas televisivos nem se quer chega a ser cultura mas um simulacro de cultura, um pedantismo. 

Ora, o objectivo da aquisição de cultura não é o exibicionismo barato, o pedantismo ou o show-business, longe disso, a aquisição de cultura visa a formação da personalidade do indivíduo, caso contrário, não importa quantos livros de história, filosofia, religião, poesia, etc., o indivíduo leia, ele será apenas um diletante para usar o vocabulário de Ortega y Gasset, um individuo que está apenas se divertindo mas que nunca chegará a ser um homem eticamente maduro, um spoudaios como o chamou Aristóteles.

ESCRITO POR|XADREQUE SOUSA|shathreksousa@gmail.com

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