O aumento da tarifa de
transporte não vai lidar com o problema da escassez da oferta de transporte dada
sua ineficácia em deslocar essa oferta para um nível mais alto, o que só pode
ser conseguido por meio da mudança nas variáveis exógenas ao modelo tradicional
da oferta de transporte.
O aumento das tarifas de transporte é uma das muitas
soluções que têm sido apresentadas para lidar com a crise de transporte com que
o país se encontra abraços mormente nas cidades de Maputo e Matola desde 2004,
sendo o aumento das tarifas a principal medida sugerida, quer pelos
transportadores, quer por alguns políticos. Contudo, antes de se sugerir
qualquer solução é inexorável que se compreenda o problema em sua profundidade
e, no entanto, parece que ninguém quer compreendê-lo, se limitando cada um a
esconder-se por detrás de conjecturas e de imaginação, daí esse problema que já
tem barbas brancas não ter um fim à vista.
O que está acontecendo na cidade de Maputo e Matola é que
há poucos “chapas” disponíveis para atender a demanda por chapa da população
dessas duas cidades. Ora, se há poucos “chapas” a circular, isso significa que
estamos perante uma crise caracterizada pela escassez de oferta de transporte. Portanto,
o problema está identificado e ele chama-se escassez de oferta de serviços de
transporte.
Ora, sendo que há escassez da oferta de serviços de
transportes, isso significa que quem oferece esses serviços de transportes,
seja o conselho municipal, a associação dos transportadores, etc., deve tomar
uma decisão sobre como alocar de forma alternativa os escassos carros
existentes de modo a satisfazer as necessidades de transporte. É a isto que L.V.
Mises chamou de acção humana e, no final das contas, toda ciência económica é isso,
o uso racional e alternativo de recursos escassos.
Ora, uma alocação alternativa significaria colocar os
carros a circular naquelas rotas em que eles podem ser mais rentáveis que são,
obviamente, aquelas rotas com maior demanda de serviços de transporte. Contudo,
essa decisão depende do tipo de sistema de transporte que se tem no país, ou
seja, se se trata de um sistema mais centralizado a volta do serviço público de
transporte ou se se trata de um sistema em que impera uma maior liberdade de
mercado no sector do transporte para dar resposta aos problemas económicos
fundamentais: “o quê, como e para quem”? Contudo, não importa qual seja o
sistema, o que tem que haver é uma coisa chamada unidade de intenção, caso
contrário, nenhuma acção humana será possível.
Identificamos no início deste artigo que a crise de
transporte que assola Maputo e Matola é uma crise de escassez de oferta de
transporte. Ora, quando falamos do aumento das tarifas como uma solução para
lidar com a crise, a primeira coisa que qualquer estudante de economia deveria
fazer é olhar para o “modelo tradicional da oferta” de transporte e ver qual é
o papel das tarifas nesse modelo.
Não é preciso ser nenhum expert para saber que as tarifas, no que tange ao modelo
tradicional da oferta de transporte entram como variável endógena ou interna do
modelo. By the way, sabemos também
que as variáveis endógenas provocam um movimento ao longo da curva da oferta já
que estamos a falar da oferta ao passo que as variáveis exógenas provocam um deslocamento
da curva da oferta. Por outras palavras, o aumento das tarifas não vai aumentar
a oferta de transporte, ele vai apenas aumentar as quantidades oferecidas dos
serviços de transporte. Para haver uma alteração da oferta de transporte é
inexorável operar mudanças nas variáveis exógenas cuja vantagem é conseguir
maior oferta de transporte sem o aumento das tarifas ao passo que a mudança nas
variáveis endógenas gera incremento das quantidades de transporte mas com
aumento das tarifas.
Por outras palavras, o aumento da tarifa não vai lidar com
o problema dada sua ineficácia em deslocar a oferta de transporte, o que só
pode ser conseguido por meio da mudança nas variáveis exógenas.
Samuelson e Nordhaus (1998) apontam como determinantes da
oferta os seguintes:
1. Tecnologia;
2. Dimensão do mercado;
3. Custo dos factores de produção;
4. Políticas governamentais;
5. Factores específicos.
Quando falo de tecnologia, refiro-me as diferentes
combinações de transporte público com transporte privado que vai nos dar o
ponto óptimo da produção dos transportes que é aquele que vai minimizar os
custos ou maximizar os benefícios a partir do ponto de tangência do isocusto com
a isoquanta. A tecnologia permite minimizar custos e maximizar os ganhos.
Obviamente que uma combinação óptima dos transportes públicos com os transportes
privados pode conduzir a uma variação positiva da função de produção dos
transportes e como esta está directamente ligada a oferta dos transportes esta
vai aumentar mas sem o respectivo aumento das tarifas.
Sabe-se que o mercado é o lugar geométrico, real ou
virtual onde se dá o encontro entre a procura e a oferta, ou ainda, como dizem
os clássicos, o mercado é a ordem natural das coisas. Ora, a dimensão do
mercado, neste caso, tem a ver com o tamanho da população que faz uso desses
serviços de transporte público e ou privado. Quanto maior for o mercado, a
expectativa de lucro dos transportadores será igualmente alta, o que os induzirá
a aumentar a oferta de transporte porque este é o objectivo do produtor considerado
desde a perspectiva da racionalidade económica, i.e., maximizar o lucro.
A aquisição das viaturas representa um custo que, depois,
será deduzido das receitas totais das transportadoras com vista a obtenção de
lucro contabilístico. Naturalmente que quanto mais alto for o custo das
viaturas, teremos menor oferta de transporte mormente porque os transportadores
não têm como transferir esses custos para os consumidores desses serviços uma
vez que as tarifas são fixadas por lei, não havendo, portanto, flexibilidade de
ajustamento das tarifas que mostram-se tão rígidas no curto prazo.
As políticas governamentais podem incentivar ou
desencorajar o aumento da oferta de transporte. Não me refiro apenas a política
de transporte mas também a outros tipos de política governamental como a política
comercial (cambial e comercial) uma vez que os carros são importados do resto
do mundo. A política das obras públicas como estradas também é importante que
se lhe leve em conta. A política monetária, mormente na sua vertente de
créditos ligados a aquisição de carros para transporte de passageiros, política
de combustíveis e assim por diante.
Por fim, existem os chamados factores específicos, os
quais podem ser cíclicos ou sazonais ou ainda variar de rota para rota, de
município para município e de hora para hora, que devem, normativamente, ser acautelados
quando se analisam os determinantes da oferta de transporte porque todos esses
determinantes têm o potencial de deslocar a oferta, o que a tarifa de
transporte não é capaz de fazer dado que aumenta apenas as quantidades
oferecidas dos serviços de transporte que podem ser medidas pelo número de
viagens ao passo que o aumento da oferta significaria o aumento de número de
carros colocados no serviço de transporte de passageiros.
Eis aqui a diferença substancial entre oferta de
transporte e quantidade de transporte, ou seja, enquanto o primeiro expressa
uma relação funcional entre a quantidade oferecida de transporte e o seu preço
relativo, a quantidade oferecida é apenas um dos termos dessa relação e mede
essa relação em apenas um ponto determinado da mesma.
ESCRITO POR|XADREQUE SOUSA|shathreksousa@gmail.com
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