“Vá enganar a seus alunos, a mim não”.
Olavo de Carvalho
*Comentários de Xadreque Sousa em AZUL
terça-feira, 11 de novembro de 2014
Severino Elias Ngoenha,
filósofo moçambicano defende que não existe um partido de esquerda no seu país,
e alerta para a prevalência do neo-liberalismo, “desde a queda do Muro de
Berlim”, em 1989.
Não há partido de esquerda em Moçambique? Então,
a FRELIMO, agora, é partido de direita? Qual a utilidade de tamanha mentira? O
que Ngoenha quer ocultar com essa declaração histérica? Veja, histérico, diz
Olavo de Carvalho, é o individuo qua não acredita no que seus olhos vêem mas,
sim, no seu próprio discurso. Em 1977, no seu quarto(?) congresso, a FRELIMO
declarou-se um partido de orientação marxista-leninista. Desafio o professor
Ngoenha a mostrar nos estatutos do partido FRELIMO quando é que isso mudou. A
cor vermelha da FRELIMO, os planos quinquenais do governo, os congressos
nacionais da FRELIMO, a nossa bandeira nacional, as alianças partidárias
internacionais da FRELIMO prova por A+B o que o professor Ngoenha, desde seu
buraco de avestruz, onde colocou sua cabeça, não quer ver.
Me mostre professor Ngoenha qual é o partido de direita no mundo que têm laços
de amizade com o partido comunista chinês, o partido comunista cubano, o
partido Rússia unida de Putin? Eu digo mais ainda: em Moçambique não somente
existe um partido de esquerda como também todos os partidos são de esquerda, ou
seja, não há nenhum partido de direita neste país. E a prova disso, como já
expliquei num outro artigo, é que a política nacional consiste em meras
disputas de cargos políticos, acusações de crimes de corrupção e má administração.
O debate ideológico que é o verdadeiro debate político acabou em Moçambique já
faz tempo.
Agora, Severino diz que não há partido de esquerda porque o murro de Berlim
caiu. Ora, o murro caiu em Maputo ou em Berlim? Em Berlim. E mesmo assim isso
não eliminou o esquerdismo da Alemanha. O partido da chanceler Ângela Merkel é
um partido de esquerda. Merkel e seu namorado na década de 80 foram militantes
do comunismo. Há uma foto em que ela aparece vestida como um soldado comunista
marchando malgrado seus puxa-sacos terem negado isso, tendo sido desmascarado
logo em seguida. O professor Ngoenha, lá porque leu “o fim da história e o
ultimo homem” do Franz Fukuyama, pensa que entende alguma coisa do comunismo ou
da esquerda internacional, se quiser mas, a verdade é que ele não entende nada
disso.
Veja, um ano depois da queda do murro de Berlim, Fidel Castro, Lula da
Silva, Frei Beto se reuniram em Havana para decidir a criação da unidade
estratégica das esquerdas na América Latina a qual foi fundada na cidade de São
Paulo, Brasil. O nome dessa organização chama-se “Foro de São Paulo”. O lema
dessa organização é “conquistar na América Latina o que foi perdido no leste
europeu”. Fazem parte dessa organização partidos legais como PT-o partido do
Lula e da Dilma Roussef, organizações criminosas como as FARC (Forças armadas
revolucionárias da Colombia), o MIR (Movimiento da Isquierda Revolucionaria)
chileno, etc. a primeira pessoa a denunciar essa organização foi o advogado
Graça Wagner e depois Olavo de Carvalho. No ano passado, na véspera da morte do
Fidel Castro, Graça Salgueiro escreveu o livro “Foro de São Paulo: a mais
perigosa organização da esquerda na América Latina” e Castro leu esse livro quando
estava hospitalizado.
Outro dado: no ano 2000, o filósofo francês Jean François Revel escreveu um
livro sob o título: “La grande Parade”. Nesse livro ele pergunta o seguinte: se
o comunismo acabou, como é possível que volvidos 10 anos, ele esteja mais forte
do que nunca?
Já se tornou moda as pessoas confundirem URSS com comunismo. Ora, o
comunismo surge 60 anos antes da URSS. Na verdade, não é o comunismo que foi
instrumento da URSS mas, sim, a URSS é que foi o instrumento do comunismo. O
comunismo é anterior a URSS e ele sobreviveu a queda da URSS como demonstra
Revel no seu livro e tantos desertores do comunismo com especial destaque para
Anatoly Golintsy e o general Ion Mihai Pacepa. O comunismo não é reformável.
Agora,
Severino fala de neo-liberalismo e nem sabe do que está falando. O neoliberalismo
surge no século XIX como resultado de
pesquisas levadas a cabo de forma independente por William Stanley Jevon na
Inglaterra, Leon Walras na Suíça, Carl Menger em Viena, tendo depois surgido em
cena figuras como Eugene Von Bohm-Bawerk, Ludwig Von Mises e Frederic August
Hayek. Os últimos 4 eram membros da escola austríaca de economia. Esses
economistas teóricos chegaram a conclusão de que os clássicos, principalmente a
escola ricardiana, estavam errados ao postular que o valor de uma mercadoria
era determinado pelo trabalho incorporado e que os agentes económicos se
reduziam as classes sociais. Esses erros foram aproveitados por Marx para fazer
a sua pseudo teoria da mais-valia e do materialismo dialéctico ou histórico
inspirado também em Hegel. Os economistas acima citados demonstraram por A+B
que o valor das mercadorias dependia da sua utilidade marginal e que os agentes
económicos eram os individuos atomisticamente considerados e não classes. De
modo que depois de tudo isso, o individuo precisa ser muito pueril para continuar
a acreditar em Marx, o falso profeta do século XIX, assim como Robespierre foi
o falso profeta do século XVIII.
Já em 1920 no seu livro “O cálculo económico no socialismo”, Ludwig Von
Mises provou por A+B que economia socialista é um projecto inviável. Ele disse
o seguinte: o que é economia socialista? É planificação central. Como você faz
planificação central? Através do cálculo de preços. Porém, se não há mercado,
as mercadorias não têm preço. Se as mercadorias não têm preço, não há cálculo
de preço. Se não há cálculo de preço não há planificação central. E ponto
final. Quer dizer, quem tenha por um minuto se quer acreditado na economia
socialista é porque acredita no quadrado redondo.
Esquerdismo nunca foi economia porque no momento em que você faz uma
economia socialista ela se torna absolutamente inviável e só o professor
Ngoenha não sabe disso. Ele não sabe a diferença entre um discurso esotérico e
um discurso exotérico. Nem mesmo na URSS que se suponha ser a economia mais
centralizada do mundo era a economia mais anárquica do mundo. Nunca houve um
lugar no mundo onde o governo ignorasse tanto a realidade da sua própria economia
como na URSS onde as estatísticas sobre a economia, não é que elas eram
falseadas, elas eram totalmente inventadas. A economia neoclássica não é
incompatível com o socialismo porque somente existe economia neoclássica, o
resto é cenoura de burro. Veja, a China contínua tão comunista quanto no tempo
de Mao, mas ela tem lá sua economia neo-liberal como disse Deng Xiao Ping: “um
país, dois sistemas”.
O socialismo ou sua fase superior, o comunsimo, não se define por controlar
a economia de todos os lados. O socialismo é uma cultura inteira. Ele se define
por ser um projecto de futuro que para sua materialização requer a total e
completa concentração de poder nas mãos da elite socialista. Eles não precisam
nacionalizar as empresas porque eles mesmos são os donos das empresas e do
estado. Uma das características fundamentais de um partido esquerdista é que
ele não está preparado para aceitar o normal rodízio de poder de um sistema
democrático de governação. É por isso que eu disse, num outro artigo, que
“todos os partidos que pensam que vão conseguir tirar a FRELIMO do poder nos
próximos quarenta anos estão muito loucos”. A FRELIMO não é um partido como
qualquer outro. Ele é um partido revolucionário e já implantou mudanças estruturais
profundas no país de modo que todos são frelimistas sem saberem e qualquer
outro partido que vier a tomar o poder acabará jogando sob a as regras da
FRELIMO como disse Gramsci que seria o efeito da revolução cultural, digo,
fazer do partido “um poder omnipresente e invisível de um imperativo
categórico, de um mandamento divino, de modo que todos se tornem socialistas
sem saberem”(sic). Quer dizer, se você se torna socialista sem saber, então, em
última instância, o socialismo é uma neurose. Neurose, já dizia o psicólogo
Juan Cesar Muller, é uma mentira esquecida na qual você ainda acredita.
O filósofo moçambicano
Severino Elias Ngoenha defende que o acordo ortográfico deve servir para
facilitar a comunicação e não para uniformizar a língua portuguesa. Em
entrevista ao Plataforma Macau, o autor de “Das Independências às Liberdades,
Por uma Dimensão Moçambicana da Consciência Histórico” e de “O Retorno do Bom
Selvagem” considera importante que Moçambique passe da massificação para a
qualidade na educação.
PLATAFORMA MACAU: O
conceito lusofonia surge, atualmente, como um tema polémico entre as diferentes
realidades dos países falantes de língua oficial portuguesa. Como é que observa
esse conceito, tendo em conta, por exemplo, o novo acordo ortográfico?
SEVERINO NGOENHA: Na
verdade, eu não me interessei muito pelo debate. Eu gosto de falar português e
é a língua que uso para escrever e ensinar. Ela é uma língua colonial, vem com
os portugueses, mas nós fizemo-la nossa.
Espera aí! O português não é uma língua colonial ou seja uma língua que é
produto da colonização. O português já se falava em Portugal muito antes de
Vasco da Gama se lançar na busca da rota marítima para as índias e ter
acidentalmente acabado por chegar a Moçambique em 1498. Uma língua colonial
pressupõe que ela é produto da colonização e acontece que a colonização em
África só começa nos finais do século XIX com a conferência de Berlim (1884/5)
e Ngoenha como historiador sabe muito bem disso só que lhe falta honestidade
intelectual suficiente para admiti-lo. Olavo de Carvalho diz que honestidade
intelectual consiste em você “não dizer que sabe o que não sabe e não dizer que
não sabe o que sabe perfeitamente bem” (sic). Mas num país em que todo mundo é
lambe-bota compulsivo e só está preocupado em dar boa impressão, o fingimento é
exaltado a condição de uma segunda natureza.
Depois da
independência, a razão que a adaptámos era ligada à questão da unidade
nacional. Então, nós adquirimos essa língua não por causa dos portugueses, mas
porque era um utensílio, um artefacto cultural que nos servia. Então, não
falamos português para dar prazer aos portugueses e nem para interessar os
brasileiros, falamos esse português por razões sócio-políticas nossas, primeiro
aspeto.
Já não estou a entender mais nada. Como é que a língua portuguesa é ao
mesmo tempo uma língua colonial e uma língua que adquirimos não por causa dos
portugueses? Ora, Severino diz que falamos português porque fomos colonizados,
ora, diz que falamos português por razões sociopolíticas. Ora, o Severino tem
que escolher uma coisa ou outra porque as duas ao mesmo tempo é uma
impossibilidade lógica pura e simples como desenhar um quadrado redondo. Se não
falamos português por causa dos portugueses, então, a língua portuguesa é causa suis, ela caiu de pára-quedas no
solo moçambicano.
O que o Severino está dizendo é como uma mulher que é estuprada e depois
diz: “eu não fui estuprada. Eu é que abri as minhas pernas”. E imagina que
dizendo isso está se fazendo de superior e não percebe que está se fazer de
idiota. Idiota vem do grego idios que
quer dizer o mesmo, portanto, refere-se ao individuo que nada mais enxerga para
além de si próprio e analisa o mundo a partir da sua pequenez provinciana.
É por essas e outras que eu digo que Ngoenha não é filósofo sob hipótese
nenhuma. Ele não tem uma mente ordenadora que lhe permite encontrar a unidade
do saber na unidade da consciência e vice-versa.
Porquê? Porque a condição número zero para quem deseja ser filósofo, i.e., um
amante da sabedoria é o true outspeak,
ou seja, a sinceridade de facto. A palavra sincera tem uma origem muito
interessante. Conta-se que um fabricador de vasos de barro no seu processo de
fabricação dos vasos verificou que alguns vasos estavam rachados e outros não
depois de terem sido colocados ao sol para secagem. Então, ele pegando na cera,
ia preenchendo as fissuras dos vasos que tinham racha. Então, quando os
compradores vinham, ele perguntava: você quer vasos com cera ou sem cera. E o
comprador que tinha uma boa posse dizia: sem cera. Esta é a origem da palavra
sincera. Infelizmente, Severino é um vaso com cera e não um vaso sem cera.
O segundo aspeto, o
português que nós falamos foi se libertando dos portugueses e integrando
conteúdos linguísticos e culturais próprios de Moçambique, a partir das nossas
línguas locais. O português do Brasil por exemplo fez isso mais do que nós, tem
uma série de palavras que ressoam das influências locais e externas, sem nunca
se preocuparem em fazer uma espécie de português comum de Portugal. Isto é uma
dinâmica normal e acontece muitos países. Uma língua não tem de ter nenhum tipo
de pureza.
Ferdinand Saussure, o pai da linguística moderna, dizia que “a língua é um
sistema”. Ora, um sistema pressupõe algo hermeticamente fechado em si mesmo. Se
assim fosse, as línguas não sofreriam nenhuma mutação. Na biologia, a teoria
geral da evolução diz que “evolução é o aparecimento de novos órgãos ou de
novas funções em órgãos já existentes”. Se transpuséssemos isso para a língua
chegaríamos a conclusão de que a evolução da língua é impossível porque a
língua não pode exercer nenhuma outra função que não aquela que ela exerce, i.e.,
a função de comunicação no sentido mais elástico possível deste termo. De modo
que, o mais correcto seria dizer que as línguas sofrem adaptações e não que
elas evoluem. Aliás, quando se fala em evolução isso mostra que você sabe para
onde as línguas estão tendendo e no que elas vão se transformar no futuro porque
há nisso implícito a ideia de progresso. Mas como o futuro só pode ser
conjecturado e não conhecido, falar que as línguas estão em constante evolução
encerra um juízo lógico falso.
O português que se fala em Moçambique, Brasil, Angola, São Tomé,
Cabo-verde, Guiné-Bissau, etc., não é diferente do português de Portugal. Se
fosse diferente não nos entenderíamos uns com outros dentro da CPLP. É claro
que existe uma variação de país para país dentro da lusofonia mas isso não faz
do português falado em Moçambique diferente do de Brazil ou Portugal porque a diferença
aí é meramente acidental e não substancial. Não existe 2, 3, 4, etc., línguas portuguesas.
Existe uma só e o que se fala nas ex-colónias são apenas variantes ou dialectos
do Português tal como falado pelos portugueses.
Há uma diferença muito grande entre a variante de português falado em Moçambique
e o português falado, por exemplo, no Brasil. Oralmente, nas camadas populares
fala-se uma variante de português que traz no seu bojo palavras de algumas
línguas locais tais como: “maningue, txovar, txunar, matabichar, etc.”., porém,
ao nível da escrita, continuamos maciçamente a escrever sem esses
estrangeirismos.
Se uma língua não deve ter nenhum tipo de pureza já é complicado. Imagine
que alguém chegue para você e diga: “O Zeitgeist of last siécle foi maningue
bueno”. Quem compreenderia a minha mensagem? Severino não compreende que a
falta de pureza na língua cria ruídos na comunicação e impossibilita a
compreensão adequada da mensagem.
P.M: Então, de alguma
forma, Ngoenha é contra o acordo ortográfico?
S.N: Ora, se o acordo
ortográfico visa facilitar a comunicação e a escrita, de livros e
bibliografias, entre os países que falam uma língua comum muito bem. Mas, se
visa, pelo contrário, uniformizar a língua através do Instituto Camões e etc. é
uma espécie de neocolonialismo que querem trazer, então é inaceitável. Esse
discurso, na minha opinião, depende daquilo que se pretende. O acordo pode ser
positivo se permitir que os vários mundos culturais que falam português possam
exprimir a própria identidade, os próprios contratos sociais no país. Mas se é
para impor uma língua única e fazer com que haja um único modelo de língua
português é completamente aberrante e anacrónico, em termos históricos.
Facilitar a comunicação? Livros? O que não facilita a comunicação é a
destruição da pureza da língua de que Severino é paladino. Quando falamos de
livro entramos num outro assunto porque a língua que nós falamos é um produto
colectivo mas daí até isso se traduzir em livro por meio de um escritor são
outros quinhentos porque um escritor, diz Olavo, é aquele para quem as palavras
têm um sentido que vai para além do seu sentido dicionarizado. De modo que uma
coisa é a linguagem que cada escritor emprega nos seus escritos a qual joga com
nuances que não estão registadas em parte alguma e é a isso que chamamos estilo
e outra coisa é o sentido da língua usada pela colectividade social a qual tem
apenas o sentido de comunicação sociologicamente considerada.
Severino diz que a uniformização da língua seria um neo-colonialismo. Isso
é uma palhaçada atroz. Neste país, você dificilmente consegue um emprego bom se
não souber falar inglês. Nas nossas escolas públicas ensina-se inglês e
francês. Não é isso neocolonização, sr. Severino Ngoenha? Nas nossas escolas
ensina-se literatura portuguesa e brasileira, principalmente. Não é isto neocolonialismo?
O que dizer, então, do ensino de filosofia que ao invés de se ensinar as
asneiras pensamentais de Nogoenha, Castiano, etc., ensina Platão, Aristóteles,
Husserl, etc.? não é isto neocolonialismo? Não é neocolonialismo quando se
ensina a física de Galilleu, Newton, Laplace, Maxwell, Faraday, Planck,
Schrodinger, Heisenberg, Bohr e Einstein, todos eles brancos racistas
colonizadores dos coitados dos africanos?
Um recado para o professor Severino é aquela sentença do filósofo Olavo de
Carvalho dirigida ao professor de história, Bertone de Oliveira Sousa: “vá
enganar a seus alunos, a mim não” (sic).
MODELO EDUCATIVO
“DISPENDIOSO E PESADO”
P.M: São quase 40 anos
de independência em Moçambique, em sua opinião, qual é estágio da educação no
país?
S.N: Depois da
independência nós apostámos na massificação da educação em Moçambique.
Aumentámos escolas primárias, aumentamos escola secundárias e universidades,
tanto que atualmente andamos com cerca de 50 universidades entre públicas e
privadas distribuídas no país – isto tem aspectos positivos. Houve um esforço
real de dar acesso a um número maior de indivíduos.
A massificação
coincide com a saída dos professores formados, que eram portugueses. Isso levou
que o governo instaurasse o famoso 8 de Março, com ideias de ter professores
que substituíssem os portugueses. O que quer dizer que a geração nossa que foi
aquela que pertence ao chamado 8 de Março foi chamada a trabalhar, de um lado,
para substituir os professores que saíram, de outro, para massificar a
educação. Ora, foi uma massificação, de um lado, em detrimento da qualidade.
A grande luta da
educação em Moçambique é, de um lado, como fazer com que concomitantemente a
massificação tenha qualidade. Ou seja, a entrada de um número maior de pessoas
no sistema educativo tenha maior qualidade. Qualidade, definindo-a em palavras
simples, seria o cumprimento dos objetivos que em cada ciclo de formação
estabelece como sendo conhecimento necessário para pessoa transitar para o
ciclo seguinte. Se nós definimos que a escola primária tem de ensinar as
crianças a ler e a escrever é preciso que as crianças, no fim deste ciclo
primário, saibam ler e escrever. Quando na escola primária as pessoas não sabem
ler nem escrever, quer dizer que o ensino primário não cumpriu com seus deveres
em termos de formação. Portanto, o ensino secundário, também, não vai cumprir
com o seu. Consequentemente, a universidade não vai cumprir com o seu. E dado
que em Moçambique o primeiro ciclo não está cumprir podemos de dizer que o conjunto
não está cumprir. Isto não é uma crítica é uma aposta que temos de ter,
continuarmos na massificação, abrindo a escola para todos, mas, ao mesmo tempo,
começarmos a lutar para que esse ensinamento atinja os objetivos definidos
pelas políticas de educação.
Eu já disse que a melhor política de transporte é não ter política nenhuma.
E volto a dizer a mesma coisa em relação a educação que a melhor política de
educação é não ter política nenhuma. Os EUA já tiveram a melhor educação do
mundo, porém, quando no século passado eles resolveram criar a secretaria da
educação e deram ouvidos àquele imbecil de John Dewey que alguns ainda
consideram um grande filósofo, a educação nos EUA caiu para níveis nunca antes
vistos e os pais começaram a reclamar que seus filhos estavam ficando cada vez
mais burros. É só você ler o livro da Charlotte Hyzerbite “the deliberate
dumbing down of America”. Isso não está acontecendo apenas nos EUA mas também
no mundo inteiro. Se nos EUA a coisa já está assim imagine como não estará em Moçambique.
Eu fui professor de alfabetização de adultos na Escola Maxaquene Khovo por 3
anos. Depois fui professor de Introdução a economia e Matemática financeira no
Instituto Médio Profissional de Contabilidade e Gestão Empresarial e depois fui
professor de Macroeconomia e Investigação operacional no Instituto Superior de Gestão
de Negócios. Portanto, bem vê-se que não sou nenhum debutant e que falo com conhecimento de causa.
O que colocamos na cabeça das pessoas é que a educação é para todos,
mormente a educação superior. Então, nos metemos a massificá-la. Agora, não se
faz educação sem ter pessoas preparadas para ensinar. Que alguém tenha ficado 5
anos numa universidade do fundo de quintal não faz dele um professor. Concordo
plenamente com Arthur Schopennhauer, quando no seu livro “Parerga e Paralipomeno”,
ele diz que só pode ensinar alguma coisa aquele que é um estudioso daquela
coisa. E ser um estudioso não é para todos. É só ler “La Vie Intelectuelle” de
A.D.Sertillange para ver o quão trabalhoso isso é. De modo que dizer que os
professores estão a sonegar conhecimento aos alunos não faz nenhum sentido
porque para você sonegar conhecimento você deve ter conhecimento. Agora, há uma
palestra feita pelo falecido professor de física, o italiano Dr. Pierre Luigi Piazi,
em que ele dizia, já aos 70 anos, que ele havia lido 3000 livros na sua vida. O
filósofo Olavo de Carvalho diz que você deve ler pelo menos 80 livros da sua
especialidade por ano para você se manter actualizado com o que está
acontecendo na sua área de especialidade. Porém, isso em Moçambique é
impossível. As pessoas fazem licenciatura, mestrado e doutoramento apenas lendo
slides e nunca leram um livro sequer
na sua porca vida e depois querem ser professores universitários quando não
estão qualificados para serem sequer professor de escola primária.
Falar em mais financiamento para a educação também não faz muito sentido.
Leia o livro de Ivan Ilitch “sociedade sem escola” e você verá que as
estatísticas acerca da educação no mundo todo mostram que, nos últimos tempos,
a qualidade da educação caiu no mundo todo ao mesmo tempo em que as verbas
desembolsadas para a educação aumentaram a olhos vistos. Isso mostra que há uma
correlação negativa entre qualidade de educação e financiamento da educação.
Essa coisa da massificação da educação ou como alguns dizem “democratização
da educação” é uma das maiores fraudes jamais vistas. O ministério da educação,
neste país, espalhou milhares de charlatães para enganar milhões de crianças.
Estão a democratizar “merda”. Isso não é educação. “Isso é engenharia
comportamental para formar o cidadãozinho, bem comportadinho da nova ordem
mundial”, como diz Olavo. Quer dizer, isto é adestramento, isto é
condicionamento clássico dos cães de Pavlov.
Não sou a favor de uma sociedade sem escola como diz Ivan Ilitch, mas de
uma sociedade sem escolas públicas, ou seja, uma sociedade em que a educação, a
tarefa de educar seja devolvida as comunidades e não a funcionários públicos
anónimos e mal-intencionados que não estão interessados em educar porque não
tem nada para ensinar. Olavo tem razão quando diz que a diferença entre crime
organizado e educação é que pelo menos o crime é organizado.
Uma das querelas recorrentes que se tem apresentado é que não pode haver
qualidade de educação enquanto um professor estiver para 50, 100, 200 alunos.
Que o número máximo ideal de alunos por turma deve ser 25. “Ser ou não ser, eis
a questão”, já dizia Hamlet. Se o problema é o número de alunos por turma como
é que se explica que alunos de mestrado tenham a mesma deficiência de um aluno
da escola primária ou do ensino básico? No mestrado as turmas são pequenas, no
doutoramento mais pequenas ainda porém quando ouvimos e lemos o que muitos dos
nossos mestres e Phd’s falam e
escrevem sentimos vontade de vomitar. Isso mostra que o problema não é o número
de alunos por turma ou pelo menos não é esse o problema-chave da nossa
educação.
Qualquer um que tenha estudado no tempo da colónia sabe que a educação era
acessível para muito poucas pessoas mas era educação. Porém, quando os tais
portugueses de que fala o professor Ngoenha abandonaram o país aí começou o
nosso problema educacional. Vejamos, por exemplo, na nossa literatura, quem são
os nossos maiores escritores de todos os tempos? Temos José Craveirinha, Noémia
de Sousa, os irmãos Albazine, Rui de Noronha. Quem são os escritores que
surgiram depois da independência que possam ombrear de igual para igual com
aqueles gigantes? Se calhar um ou dois.
O grande problema da educação no mundo chama-se socio-construtivimso de
Jean Piaget, Levi Vigotsky e Emílie Ferrero. Como se não bastasse isso,
adicionamos a isso as ideias daquele cocainómano, o Michel Foucault, e fizemos
aquela asneira tamanha da “passagem automática” porque as crianças, coitadas,
sentiam-se oprimidas quando reprovavam. Num país em que o diploma é tomado como
a mais elevada expressão do conhecimento, num país em que notas obtidas com
base em cábulas são elogiadas a despeito de notas obtidas por mérito próprio, só
pode dar nisso. O lema: “você não precisa estudar muito porque você vai
aprender tudo no mercado de trabalho” está destruindo este país. Neste país, o
conhecimento é objecto de piada. Quando os estudantes universitários vêm um
outro estudante universitário a ler, eles ridicularizam, dizendo: “você estuda
mais do que quem?”. E são esses escarnecedores que amanhã serão reitores de
universidade, directores de curso, directores de escola, ministro e vice-ministro
de educação.
Na escola pitagórica havia um letreiro colado na porta: “não entre aqui se você
não for geómetra”. Devia-se fazer a mesma coisa nas escolas: “só entre aqui se você
quiser conhecimento. Se quiser apenas um diploma, faça o favor de ir cortar
cana”. Só há uma maneira de salvar a educação deste país e esta é as empresas
não contratarem para funcionário os indivíduos mediante seus diplomas e curriculum vitae totalmente copiado da internet
mas sim em função do que esses indivíduos sabem fazer. Por exemplo, você quer
contratar um economista e na entrevista você pergunta coisas tais como: “Qual é
seu nome? Qual foi a sua nota na disciplina X? Quantos anos você tem?”. É claro que você quer ser enganado. É claro que
vão impingir-lhe gato por lebre. E é isso que se faz nas entrevistas. Se você
quer um economista a sério dê a ele um problema económico real e peça para ele
resolver. Como é que você vai contratar um funcionário de laboratório que não
sabe trabalhar com um microscópio? Como é que você vai contratar para professor
de literatura quem não tem nenhum livro de poesia ou de ficção publicado? Como
é que você vai contratar para professor de filosofia quem não tem nenhuma
filosofia? Porém, em Moçambique isso não importa, o que importa é termos um diploma
que nos habilite a ser funcionário público.
O segundo aspecto é
mais adequação entre escola e sociedade. Eu insisto muito na agricultura. Nós
nos últimos anos formamos especialistas licenciados e mestrados, mas a produção
alimentar de Moçambique depende necessariamente da agricultura tradicional.
Quer dizer que a universidade não está a ter uma incidência sobre a sociedade.
A mesma coisa na arquitetura, quando olhamos quantos arquitetos vemos que
apenas servem para construir prédios nas cidades, mas não melhoraram a condição
de habitação em Moçambique. A mesma coisa para as ciências sociais. Quando você
planta uma empresa como a Mozal (multinacional de produção de alumínio) numa
zona habitacional, sabendo que é uma empresa que produz poluição enorme, quer
dizer que não houve uma concertação com todos os saberes. Você vê aí que há uma
discrepância entre aquilo que nós podemos saber e meter a disposição da sociedade
e aquilo que é feito em termos de infraestrutura para o bem da população. A
função da escola não é simplesmente acumular os saberes, é utilizar o saber
para melhorar as nossas condições de vidas. É contribuir para que a sociedade
possa evoluir. Deve existir uma espécie de matrimónio entre as necessidades
reais e o saber da escola.
Uma coisa é ciência e outra é técnica. A França já foi o centro cultural do
mundo, porém hoje, ela é uma potência de segunda classe. Na há um lugar no
mundo onde a ciência tenha avançado mais espectacularmente do que no velho
continente. Contudo, foi nos EUA onde a técnica mais avançou e não é debalde
que os norte-americanos têm a fama de serem pragmáticos porque eles mostraram
para o mundo que todos os problemas práticos têm solução.
O que fez materialmente os EUA foi a técnica aliada ao espírito
empreendedor do povo norte-americano. Em Moçambique, um indivíduo forma-se em
engenharia, economia, ciências políticas, medicina, etc., tendo como finalidade
apenas se tornar funcionário público ou ir conseguir um emprego numa empresa
privada na melhor das hipóteses. Deste modo, o agrónomo, o arquitecto, só irão
para o campo se o estado ou a empresa privada de que eles são funcionários lhes
mandar para lá. Por outras palavras, todo estudante universitário ou a maior
parte dos estudantes universitários quer ser classe média. Ninguém quer ser
dono de empresa.
Meu professor de empreendedorismo costumava dizer que só existem dois tipos
de empreendedores, a saber: empreendedor por necessidade e empreendedor por
oportunidade. Necessidade aqui não é no sentido de necessário ou seja aquilo
que Mário Ferreira dos Santos chamava de “negação do não”, mas sim carência
como alguém que trabalha numa empresa X mas como seu rendimento salarial não é
suficiente para cobrir as despesas mensais da sua família, a sua esposa o ajuda
vendendo bolinhos no quintal de casa. De modo que não é dizendo que as pessoas
devem ir ao distrito empreender que elas irão para lá. Eu creio que esse é um
processo espontâneo dadas as oportunidades. Agora, as pessoas que dizem que os
jovens licenciados, mestrados, devem ir ao distrito, elas mesmas não vão. Quer
dizer, padecem de uma terrível dissonância cognitiva e não sabem porque não
percebem que suas palavras são desmentidas pelo seu próprio acto.
Na Europa e nos EUA também existem agrónomos mas nem por isso estão todos
eles no campo. A agricultura nos EUA é feita por 2, 3 pessoas numa fazenda
enorme do tamanho de 5, 6 campos de futebol. Não se pode confundir agrónomo com
agricultor ou arquitecto com pedreiro como está fazendo o professor Ngoenha.
Não nos esqueçamos que antes de as pessoas se concentrarem nas grandes
cidades, elas estavam, em primeiro lugar, concentradas no campo. Elas não
saíram do campo para a cidade por um decreto governamental. De modo nenhum.
Eles saíram por causa da oportunidade de trabalhar nas fábricas que estavam
surgindo e que malgrado as péssimas condições de trabalho, elas ganhavam muito
mais do que fazendo machamba. A única situação na história em que uma população
foi movida de um lugar para outro foi nos países comunistas no âmbito da
colectivização da agricultura como aconteceu na URSS onde morreram cerca de 80 milhões
de pessoas no tempo de Lenine e na China onde morreram 40 milhões de pessoa sob
Mao. Em outros países como Moçambique isso também aconteceu no âmbito da
operação produção e parece que estão com saudades daquele tempo malfadado e é
por isso que até fizeram questão de colocar na constituição da república que “a
agricultura é a base da nossa economia”, o que eu não vou comentar neste artigo
porque já comentei em dois artigos postados neste blog.
P.M: Como seria feito
esse “matrimónio” entre as necessidades reais dos moçambicanos e o saber da
escola?
S.N: É muito simples.
O que acontece é que muitas vezes as populações não têm o saber da escola. Por
exemplo, há lugares em Moçambique que há determinadas plantas que as populações
locais usam para fazer sopa, entretanto, em outros lugares, as mesmas plantas
não são usadas. Simplesmente porque as populações não sabem qual é a utilidade
de tais plantas. Um acordo entre as universidades e as autoridades políticas
poderia levar a criação políticas plantações extensivas e, ao mesmo tempo,
podia desenvolver uma educação cívica para as pessoas porque há crianças a morrer
à fome enquanto a terra tem plantas que se comem mas as pessoas não sabem.
Segundo, nestes mesmos
distritos, quando são criadas infraestruturas podia haver uma discussão, um
estudo de viabilidade para o bem-estar social. Outro exemplo é que Moçambique
produz muita fruta, e a fruta, a manga exemplo, nós comemos no seu devido
tempo. Depois de comer, metade da manga agente deita fora. Dois meses depois as
pessoas passam fome porque não tem o que comer. Ora, a universidade devia usar
o seu saber para ensinar como devíamos conserva-la. A conservação da manga pode
ser pensada por universitários, mas as Pequenas e Médias Empresas (PME) podiam
criar objetos para melhor conservação deste produto. Para que haja disposição
deste mesmo produto no momento em que não há manga. Por exemplo, no Brasil
todas as frutas são usadas para fazer sumo. Nós continuamos a tomar os sumos
importados enquanto somo grandes produtores de frutas. Entretanto, para
melhorar estes aspectos é preciso haver saber e investimento de grandes e de
pequenas e medias empresas para que este tipo de conservação seja possível.
Então, quer dizer que há espaço para que haja diálogo entre o saber universitário
e aquilo que são as necessidades práticas das populações.
Tudo isso que Severino disse não tem nada que ver com os universitários.
Veja, a economia subdivide-se em 3 sectores. O sector primário, o sector secundário
e o sector terciário. Nenhum desses tem que ver com universidade. Quando é que
a universidade entra? Ela entra quando surge um sector pouco conhecido neste
país, aliás, nada conhecido, chamado de sector terciário superior ou sector
quaternário. Nesse sector temos sim um casamento entre empresas e
universidades. E em Moçambique não temos um sector quaternário. Não há nenhuma
empresa neste país que esteja financiando uma pesquisa num produto que depois
vai ser comercializado por ela diferentemente do que acontece nos EUA e na
Europa em que as universidades inventam novos modelos de telefone, computador,
aviões, etc., sob patrocínio das empresas que actuam nesses ramos de
actividade.
Não há nada que se produza neste país em termos de pesquisa que não tenha
sido produzido a 2, 3 séculos pelos europeus e norte-americanos. De modo que as
nossas pesquisas são apenas de confirmação na melhor das hipóteses porque, na
maior parte das vezes, é apenas uma pesquisa de divulgação do que os outros já
pesquisaram. Não é por acaso que aqui os plágios são cometidos com a mesma constância
com que se muda de cueca. É uma coisa calamitosa.
O europeu e o norte-americano inventaram o telescópio, o rádio, o televisor,
o microscópio, o automóvel, o avião, o computador, etc. O moçambicano só porque
está olhando a salmonela através do microscópio diz que está fazendo pesquisa.
O moçambicano só porque pegou na sua chave de fenda e abriu um computador diz
que está fazendo pesquisa? Mas que pesquisa? Por ventura você está trazendo
algo de novo? Nada. O que você está acrescentando em termos de conhecimento
para a história do telescópio, rádio, televisão, etc.? Nada. Porém, isso é que
é pesquisa e investigação em Moçambique. Aliás, dizem até que temos cientistas
em Moçambique, vejam só. Só não entendo como é que um país que todos os anos
forma cientistas em quantidades industriais não tenha conseguido produzir
nenhuma teoria científica em 40 anos de independência? Não é para Galileu,
Newton e Einstein ficarem mordidos de inveja dos moçambicanos? Essa confusão
entre técnica e ciência é de me deixar com dó dos moçambicanos. Que temos
técnicos em Moçambique e até bons técnicos, lá isso ninguém pode negar. Porém,
cientistas…isso é outra história.
P.M: Uma das questões
mais polémicas quando se trata da educação em Moçambique está relacionada com
influência da mão externa nos modelos adaptados na educação moçambicana. Na sua
opinião, o modelo de educação adoptado pelo país é adequado à realidade
moçambicana?
S.N: A nossa educação
não corresponde às necessidades locais. Observe, há dois de modelos
fundamentais; o francês de grande cultura, primeira coisa neste modelo é fazer
o décimo segundo ano. Neste modelo, o aluno estuda filosofia, economia, física,
química, matemática entre outros. O estudante termina com 18 ou 19 anos, mas
não sabe fazer realmente nada. Ele tem apenas uma abertura cultural larga. Daí,
vai para universidade e quando ele chega na universidade ele forma-se em
direito ou economia etc., aí é que ele começa a integrar o mundo do trabalho.
Na nossa sociedade, o Estado investe para formação do primário e secundário,
mas, muitas vezes, o jovem chega aos 18 anos não tem lugar na universidade e
não sabe fazer nada na prática. Resultado; o Estado investiu muito para alguém
que depois fica desempregado, o nosso investimento perdeu-se. Os pais
investiram muita malformação deste jovem e depois tem de continuar a pagar para
que ele possa viver. Ele investiu muito na formação dele e chega nessa idade
não pode continuar e aí fica frustrado, aí é que entram as drogas.
Já no outro modelo,
diferente, chamado modelo “saber fazer”, imagina que depois do nono ano o jovem
tivesse feito quatro anos de especialização (informática, química ou outra).
Nada lhe impede que no fim ciclo ele vá para universidade, entretanto, mesmo
que ele não vá para universidade ele vai fazer alguma coisa, porque aprendeu o
saber fazer. Mesmo que ele vá para universidade, ele pode ao mesmo tempo
trabalhar. Isto aligeira o peso sobre a família, a sociedade e até o Estado. O
modelo que nós estamos a trilhar, que é o modelo português mas de origem
francesa, é extremamente dispendioso para nós como sociedade e como família,
mas também é pesado os próprios indivíduos. Azarias Chavisso –
Moçambique in “Plataforma Macau”
É claro que os modelos de educação não devem ser transportados ipsis literis de um país para outro. Um
modelo é apenas uma simplificação da realidade. Quando o professor de Matemática
ensina que 2+2=4, isso não é para ser decorado. É para o aluno apreender a
norma ou a sequência lógica dessa operação matemática de modo que ele esteja
apto para resolver questões análogas como 5+5, 1+1, 9+9 e assim por diante. Se
os franceses fazem 2+2=4, temos que estar aptos a fazer 5+5=10.
Cada país tem sua realidade cultural específica, i.e., seu próprio sistema
de valores em torno do qual sua população constrói seu imaginário colectivo. A
educação deve levar em conta isso mais do que tudo. O que Severino está
defendendo é, em última instância, transformar o ensino secundário nacional num
ensino técnico profissional para que os alunos que não conseguirem lugar numa
universidade tenham emprego mais facilmente. Em outras palavras, a finalidade
da educação para Ngoenha não é aquilo que a educação pode fazer connosco mas
sim o que podemos fazer com a educação. O que a educação faz connosco? Ela nos
torna culto. O que nós fazemos com a educação? Usamos a educação como um cavalo
de batalha no mercado de trabalho.
Se queremos saber o que é educação temos que ir consultar os melhores
educadores que o mundo já teve. Temos que ir consultar o ensino do vedanta na China,
temos que ir consultar Sócrates na Grécia, temos que ir consultar Cristo em
Israel, temos que ir consultar os escolásticos na europa medieval, etc. Formar
para o mercado de trabalho sempre foi coisa de sofistas. Os verdadeiros
educadores educavam para a vida e não para o trabalho assalariado. Quando surge
o ensino público e as universidades na idade média, não havia empresas em que você
podia dar entrada seu diploma para se candidatar a alguma vaga. Quem quisesse
ter o que comer tinha que se tornar padre, ou ir para guerra como um soldado e
viver como um soldado ou ser um herói de guerra e ser premiado pela população
com terras, gados, servos e se tornar um aristocrata.
O diploma não valia nada. Tanto isso é verdade que os homens não aceitavam
deixar-se alfabetizar. Eles só queriam saber de brincar ao jogo de capa e
espada porque aí eles podiam exibir sua virilidade e serem levados para o exército.
A educação era coisa de padres, mulheres e crianças. E depois vêm as feministas
dizerem que na idade média os homens proibiam as mulheres de irem para a
escola. Não sei de que idade média é que elas estão falando. Talvez dos seus
delírios auto-hipnóticos. Veja, o Carlos Magno, o imperador do império
carolíngio, só se deixou alfabetizar aos 30 anos mas a muito contragosto.
Naquela altura em que a educação não era um trampolim para se conseguir um
emprego e subir na vida, existiram estudiosos de verdade. Você tinha
professores de verdade e alunos de verdade como disse Macróbio ao jovem Aurélio
Agostinho que mais tarde tornar-se-ia Sto. Agostinho de Hipona: “convence-me a
aceitá-lo como meu aluno”. Hoje em dia seria: “pague-me bem para que eu lhe dê
um diploma que faça de você um funcionário público com a reforma garantida”.
Agora, dizer que os ex-alunos, por não terem entrado para a universidade vão
para as drogas não é verdade de modo nenhum. O professor Severino Ngoenha tem
que trazer provas disso, estudos que provam isso porque quando olhamos para
escolas como Josina Machel na Cidade de Maputo vemos que nem é preciso os
jovens deixarem de ser alunos para começarem a envolver-se com as drogas pois
os jovens se tornam drogados mal entram para a escola. Elas aprendem a fumar cannabis e a consumir cocaína dentro da
escola e eu, pessoalmente, conheço muitas pessoas que aprenderam a fumar cannabis na escola. Portanto, não venha
o professor Ngoenha tentar beatificar a escola como se fosse um solo sagrado
onde os alunos entram corrompidos pela sociedade e saem um São Bento. E não só:
é nas escolas que os alunos aprendem a perder a sua virgindade ou o Sr. Ngoenha
nunca ouviu falar das gravidezes nas escolas que já se tornaram endémicas? Haja
saco, meu Deus do céu!
Severino Elias Ngoenha - Nasceu em Maputo, no ano de
1962. Possui graduação em Teologia e é Doutorado em Filosofia pela Universidade
Gregoriana de Roma. No ano de 2010, integrou o Departamento de Filosofia da
Universidade Pedagógica de Moçambique. É professor associado do Departamento de
Antropologia e Sociologia da Universidade de Lausanne, Suíça. As suas pesquisas
situam-se na área de antropologia, pensamento africano, filosofia da educação e
interculturalidade.
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