…a natureza,
tomada aqui no sentido d..aquilo que nasce com a coisa, significa que há uma
simultaneidade entre a natureza e a coisa e não uma sucessão... Portanto,
afirmar que primeiro o homem vem ao mundo e só depois constrói a sua natureza
com base na acção histórica é uma hipótese absurda. O homem e a sua natureza
humana emergem juntos.
O termo natureza vem do latim natura, então, temos nascor, que é nascer. Portanto, natureza é aquilo que nasce com...Deste modo, quando falamos de natureza humana queremos nos referir a aquilo que nasce com o ser humano ou então, aquilo que o homem é considerando-o desde a sua essência.
Há uma expressão de Ortega y Gasset sobre a natureza
humana que passamos a citar: “o homem não tem natureza, tem história”. Então,
Ortega nega a natureza humana para afirmar a história. Essa tendência, de
tender, de reduzir todo acontecer humano a história é o que se chama
historicismo. Não apenas o acontecer humano tomado antropologicamente,
culturalmente, etc., mas também todo acontecer de origem físico-química,
biológica, matemática, etc.
Na verdade, quando Ortega y Gasset diz que o homem
não tem natureza, ele não está dizendo exactamente que o homem não tem
natureza. Ele está apenas dizendo que a natureza humana é produto da história.
Ele está dizendo que a natureza humana é a
posteriori e não a priori.
Na verdade, o que Ortega y Gasset está fazendo é
apenasmente confundindo natureza com factos. Conforme já vimos em outros
artigos facto é aquilo que começou a ser, ou seja, que teve um começo no seu
ser. Ora, tudo que tem um começo no seu ser é, segundo a última divisão do ser,
um ser nec ab aeterno nec a semetipsu,
ou seja, um ser que não é eterno e que procede de outro.
Enquanto isso, a natureza, não tomada aqui no
sentido de natureza física de átomo e energia mas no sentido de natura, de
nascor, de aquilo que nasce com a coisa, tem um sentido totalmente diferente.
Ao nascer com a coisa isso significa que há uma simultaneidade entre a natureza
e a coisa e não uma sucessão como se dá com os factos. Portanto, afirmar que
primeiro o homem vem ao mundo e só depois constrói a sua natureza com base na acção
histórica é uma hipótese absurda.
O homem já nasce com a natureza humana, o que significa
afirmar que o homem já nasce homem. Se essa natureza se actualiza mais em
alguns homens do que em outros isso em nada corrobora contra a nossa tese. A
natureza humana é inata e estabelece um diferencial entre o homem e os animais.
Essa diferença específica que cria uma ruptura eidética do homem com o animal
é, pois, a racionalidade.
O homem é homem não porque ele evoluiu de espécies
inferiores mas porque ele tem racionalidade. Essa racionalidade é a lei da
proporcionalidade formal intrínseca que faz do homem o que ele é. Os animais
não têm esse logos. Eles têm um
outro logos. A lei da
proporcionalidade intrínseca que rege os animais é outra e que faz deles o que
eles são.
Infelizmente,
muitos têm caído em ismos, como o historicismo, e não são apenas indivíduos de
nenhuma notoriedade que o fazem mas também indivíduos de grande notoriedade
como o próprio Ortega y Gasset, Spengler e tutti
quanti.
Splengler
chegou mesmo a dizer que “a realidade é história”. Ora, o termo realidade vem
de res, que quer dizer coisa, o que
se refere ao mundo dos sentidos. Então, o que chamamos de realidade é o mundo
sensível, o qual está colocado ou fundado sobre o eu e o eu por seu turno está
fundado sobre o ser como diria Lavelle. Então, a realidade é esse conjunto de
possibilidades finitas, as quais captamos por meio dos nossos sentidos.
Sabemos que para Aristóteles, o conhecimento começa
pelos sentidos. É dele a frase: “nada está no intelecto que não tenha estado
primeiro nos sentidos”. Por meio dos sentidos nós temos a experiência daquilo
que é sensível. A experiência do que é sensível nos leva as ciências naturais
como a física, a química, etc. Ora, dizer que a realidade é história é tentar
explicar a força da gravidade pela conexão do sentido dos factos que se deram
quando Newton teve a intuição dessa teoria e afirmar que os nexos causais que
explicam a força da gravidade são produto da história.
Ninguém nega a importância da história. Quer dizer,
ninguém nega mais ou menos porque assim como o historicismo nega a perspectiva
das outras disciplinas do saber culto, essas outras quando levadas ao extremo
acabam também negando a perspectiva da história. Porém, importa esclarecer que
uma coisa é o facto da descoberta de uma teoria científica e outra
completamente diferente é a própria teoria científica. A descoberta da lei da gravitação
universal por Newton é uma coisa. Ela é história. Ela é um facto histórico
porque é irrepetível, ou seja, não vai aparecer mais alguém a descobrir essa
lei. Ela já foi descoberta. Porém, a própria lei da gravitação universal não
tem nada que ver com a história. Por meio da história podemos ter a compreensão
da descoberta dessa lei, ou seja, as conexões de sentido que nos vão dar a
compreensão dos factos históricos associados a essa descoberta, porém, a história
não pode nos dar os nexos de causa e efeito do movimento dos corpos na mecânica
terrestre e celeste.
Outro exemplo: a história pode nos dar a compreensão
do momento cultural em que Pitágoras descobriu o teorema de Pitágoras. Porém,
você saber em que circunstâncias históricas o filósofo de Samos descobriu o
teorema de Pitágoras não explica por que a soma do quadrado dos catetos é igual
ao quadrado da hipotenusa. Para você saber isso, você tem que apreender o nexo
causal entre a hipotenusa e os seus catetos, o que está fora do âmbito da história.
Portanto, a realidade não é apenas história. Ela é
também biologia, física, química, poesia, política, sociologia, religião, etc.
Portanto, o historicismo peca por seu extremismo e abstractismo.
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