segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Preço Justo

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Um preço justo não é nem um preço baixo, nem um preço alto. O termo “preço justo” só pode ser entendido como uma figura de linguagem porque somente uma pessoa pode ser justa ou injusta e não um preço porque este não tem unidade de intenção e, portanto, não pode agir. Um preço justo é aquele que consiste em dar ao produtor e ao consumidor o que é seu. Mas quem vai estabelecer o que é justo? Dirão: o estado. Porém, as leis dispostas pelo Estado subordinam-se as leis naturais. Portanto, um preço justo se daria pela articulação das leis dos estados com a lei natural.   


Na escolástica discutiu-se sobre o preço justo. Temos, aqui, duas palavras importantes, sendo a primeira a palavra preço e a segunda, a palavra justo. O preço nos remete a economia. O termo justo nos remete a jurisprudência. Porém, a economia e a jurisprudência (o direito), não são campos do saber que não se cruzam, muito pelo contrário. Sabemos que a economia tem como lei fundamental procurar o máximo de resultado com o mínimo de recurso. Essa lei económica é uma lei universal. A jurisprudência, por seu turno, visa regular a relação que se dá entre os homens, entre as sociedades, entre os países, etc.

Então, de um lado, temos uma lei que nos induz a buscar sempre o máximo com o mínimo, porém, de outro lado, temos uma regra de jogo que nos é imposta pela jurisprudência, o que significa que, malgrado buscar o máximo com o mínimo seja uma lei economia universal, isso não significa que isso tem que ser feito de modo desregrado mas sujeito a uma regra. Essa é a proposta da escolástica.

Se um empresário utilitário não pagar salário a seus trabalhadores e roubar a matéria-prima (sentido moderno do termo) de que sua empresa precisa para produzir, fugir ao fisco, ele terá certamente um máximo de lucro. Contudo, embora ele proceda desse modo “impelido por uma lei económica universal”, não podemos, contudo, nos deixar de questionar sobre a ética desse procedimento.

Temos que nos questionar sobre esse procedimento porque a economia é uma ciência prática, não negamos, contudo, que haja uma parte especulativa. Porém, a economia é essencialmente prática. Como ciência prática, a economia é a ciência da acção humana e toda a acção humana tende para um fim, de modo que dizemos que a economia é uma disciplina ética por ser uma disciplina pragmática e de pragma temos praxis, acção.

Podemos ligar esse assunto do preço justo com um outro assunto igualmente tratado por Tomás de Aquino que é o da lei justa. Para o doutor angélico, uma lei só tem que ser obedecida se ela for justa. De igual modo, também podemos dizer que um preço só deve ser aceito se ele for justo.

Para entendermos mais aprofundadamente o que estamos dizendo vamos classificar as leis, de acordo com Tomás de Aquino, começando das leis superiores até alcançarmos as inferiores:

1)  Lei divina

2)  Lei cósmica

3)  Lei natural

4)  Lei jurídica

A lei divina abarca e subordina a lei cósmica transcendendo-a infinitamente. Esta, por sua vez, abarca e subordina a lei natural e esta abarca e subordina a lei jurídica, de modo que se a lei jurídica entra em contradição com a lei natural, logo, ela é injusta. Se ela se subordina a lei natural, ela é justa. Se ela for justa, segundo Sto.Tomás de Aquino, ela deve ser obedecida mas se for injusta os homens têm o direito natural de resisti-la, desde que dessa acção resulte mais ganho do que perda e voltamos, aqui, a lei económica universal de buscar sempre o máximo com o mínimo.

O que estamos dizendo é que a lei económica universal de buscar o máximo com o mínimo é uma lei universal. Porém, malgrado ser ela universal não significa que no seu aspecto prático ela seja também universal. De modo nenhum. Por quê? Porque a situação de cada indivíduo, de cada sociedade, etc., é sempre particular e concreta, de modo que é preciso perceber a tensão existente entre o universal e o particular e ir elucidando isso, senão caímos em flagrante contradição. A esse exercício é que chamamos de exercer a sabedoria. Exercer a sabedoria não é decorar a “república” de Platão ou o “Organon” de Aristóteles e julgar-se sábio. Exercer a sabedoria é isso que eu acabei de dizer.

O mesmo se dá com as leis divinas. Quando Deus diz, nos dez mandamentos: “não matarás”, essa é uma lei universal e abstracta. Porém, cada indivíduo humano tem que ter a sabedoria de aplicar essa lei universal e abstracta na sua situação particular e concreta. Então, aí, surge a questão: eu não devo matar sempre ou em quais e tais situações devo e não devo fazê-lo? Caso contrário, as nações não teriam exércitos. Os pais de família assistiriam seus filhos e mulheres serem mortos, violados e violentados sem fazer nada mesmo tendo a possibilidade de mandar o “desgraçado” para o inferno.

Então, o que seria um preço justo? Não seria apenas aquele que nos permite ter o máximo de lucro com o mínimo de custo mas aquele que também não fere a lei da natureza. Ora, a natureza, como é entendida hoje pelas ciências, é um campo de fenómenos devidamente delimitado e acessível apenas ao método da observação e da experimentação, ou como diria o físico Adauto Lourenço, natureza é átomos e energia, pese embora hoje não saibamos o que é energia, assim como não sabemos o que é vida. Uma lei expressa uma regularidade. Qual seria a lei da natureza? O determinismo ou o livre arbítrio? Ora, sem o determinismo não haveria o livre arbítrio e sem o livre arbítrio não haveria o determinismo.

Então, vamos dizer que a natureza, considerada desde a perspectiva mecanicista que é a perspectiva macrofísica, é determinística. Porém, quando entramos no mundo da microfísica, a física atómica e subatómica, aí já se fala de indeterminismo de Heisenberg que se ob põe ao determinismo de Schrodinger.

O mesmo pode dizer-se em relação a economia porque a economia imita (mimesis) a física. Na Macroeconomia, reina o determinismo e na Microeconomia reina o indeterminismo ou seja o possibilismo.

Quando se fala em preço justo as pessoas pensam logo em preço baixo. Porém, preço justo não é nem preço baixo nem preço alto. Estamos vivendo numa civilização que nos veio importada do ocidente porque nunca fomos capazes de criar uma como os incas, os astecas, etc. A civilização ocidental, de que somos partícipes (metexis), funda-se em três bases:

1)  Filosofia grega

2)  Direito romano

3)  Moral tradicional cristã

É claro que há países que tem mais ou menos cada uma dessas bases consideradas não extensistamente mas no seu grau intensista.

O direito romano apregoava que a justiça é dar a cada um o que é de cada um. Então, um preço justo seria aquele em que o vendedor e o comprador teriam apenas aquilo que lhes convém porque, na verdade, o que vemos é o vendedor ficar com uma parte da utilidade que convêm ao comprador e assim por diante.

Não queremos, aqui, entrar na discussão acerca da mais-valia que, apesar de ser um termo muito popularizado de Marx, encerra um conceito errado porque essa teoria se baseia numa outra teoria errada que é a teoria de valor da escola neo-ricardiana. Hoje nós sabemos, por meio de William Stanley Jevons, Leon Walras, Carl Menger, Eugen Von Bohm Bawerk e Ludwig Von Mises, que o valor não tem nada a ver com o trabalho incorporado na mercadoria como cria Marx pela influência dos neo-ricardianos mas sim na utilidade marginal. Portanto, uma mercadoria pode ter sido produzida a duras penas, com um volume enorme de mão-de-obra e, ainda assim, ser de baixo valor económico por ter uma utilidade marginal baixa para os consumidores. Portanto, quem quer que tenha acreditado na teoria da mais-valia por um minuto sequer é porque tem Q.I.12.

É claro que falar em preço justo é apenas uma figura de linguagem, é uma personificação, porque somente uma pessoa pode ser justa ou injusta. Nem mesmo uma sociedade pode ser justa mas apenas uma pessoa. A justiça ou a injustiça está na acção humana, portanto, para ser-se justo ou injusto é preciso agir e para agir é preciso ser uma pessoa. Uma sociedade nunca pode agir porque ela é impessoal e como tal ela é incapaz de unidade de intenção. Quando se diz que a organização tal agiu não é que aquela organização agiu, literalmente, denotativamente. Isso é uma metonímia. Isso é tomar a parte pelo todo porque numa organização sempre há duas ou três pessoas que agem em nome do colectivo.

Se um vendedor pratica um preço injusto não é que o preço que ele está praticando é injusto mas ele mesmo é que é injusto. Na verdade, só podemos falar de um preço justo ou injusto quando há uma lei que diz qual deve ser o preço para tal e qual bem ou serviço. Isso seria comunismo puro e simples. Não havendo isso, a percepção do justo e do injusto fica profundamente confusa. 

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