terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Teísmo, Ateísmo e Deísmo

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O debate sobre a existência de Deus tem sido dos mais antigos e interessantes no mundo. Há, fundamentalmente, três correntes, a saber: teísmo, ateísmo e deísmo. O ateísmo nega a existência de Deus ao mesmo tempo que diviniza o espaço e o tempo e eleva a matéria a condição de um novo deus. O teísmo diz que Deus é uma pessoa. O deísmo diz que Deus é uma força impessoal da natureza, caindo, assim, em panteísmo.


Nos últimos tempos, é espantoso ver o tamanho crescimento do ateísmo no mundo, principalmente naquela camada social de indivíduos que se supõe ser a mais esclarecida da sociedade e que, por ser a mais esclarecida, devia, ipso facto, ser mais dada a certezas do que a dúvidas, porém, ao invés disso, encontramos nessa camada uma proliferação de opiniões e de dúvidas tão pueris a mais não poder.

A crença de que o ateísmo está ganhando, cada vez mais, espaço no mundo não deve ser tomada muito a sério, uma vez que nem sempre há honestidade do lado dos que professam o ateísmo porque “se Deus não existe, tudo é permitido” (cf. Dostoieviski, Irmãos Karamazov), de modo que importa “ser prudente como as serpentes” para não cairmos em propagandas falsas do ateísmo militante.

No mundo, não há apenas ateísmo, nele há também teísmo, deísmo e outras concepções daquele a quem os filósofos chamam de o ser supremo, o Deus das religiões. Em seguida, vamos examinar cada uma dessas terminologias.

O teísmo vem de theo que quer dizer Deus e Deus, por sua vez, significa aquele que vê e é por isso que ele é providente. Sendo assim, tudo está patente aos seus olhos, tomado olho aqui não no sentido literal mas metafórico (metaphorein, substituição) porque seria um absurdo supor que Deus tenha olhos como nós os temos. O olho é símbolo da percepção que é receber as imagens, os fantasmas, a imago, dos objectos sobre os quais fantasmatas construímos a nossa razão ou entendimento.

O teísmo é a concepção teológica que afirma que Deus é uma pessoa. O termo pessoa vem de persona que quer dizer máscara tal como acontece nas artes cénicas. Na concepção teológico-cristã, Deus é-nos apresentado como um Ser trino, ou seja, um Ser que se manifesta em 3 pessoas, a saber: Pai, Filho e Espírito Santo.

Pai quer dizer a vontade divina. Filho quer dizer a inteligência divina. É por isso que Cristo é apresentado como logos, a razão divina, a inteligência divina. O Espírito Santo quer dizer o amor divino e já explicamos em um outro artigo que esse amor está na sua colocação intelectual, é o amore intellectuale, o ágape dos pitagóricos, o amor platónico.

Para Aristoteles, pessoa é uma substância racional de natureza individual. Raciocínio tem a ver com a capacidade discursiva a qual, segundo S.Tomás de Aquino, nos permite passar de um conhecimento para outro. Na verdade, raciocínio é a passagem de um conhecimento para outro. Substância é hipokeimenon em grego, em que hipo quer dizer por baixo, de onde substância significa o que está por baixo. Em latim, esse termo tem o mesmo significado, ou seja ele é sub estare, estar por baixo. Portanto, não é um acidente. Natureza vem de naturo, aquilo que nasce, que nasceu. Individual (in divisus) quer dizer não divisível porque carece de composição.

Essa definição não pode ser aplicada ao Ser Supremo porque incapaz de captar seu lugar ontológico. Se a essência de Deus é ser inteligência pura, então, estamos perante uma definição que só se aplica aos entes do contexto beta e não aos do contexto alfa porque Deus não intelige de forma racional, ou seja, de forma discursiva por meio de um termo médio mas sim de forma directa, imediata, intuitiva.

Para além dessa definição, temos aquela dada por Cícero que é mais uma definição de cunho jurídico porque Cícero era romano, quando ele diz que pessoa é um sujeito de direito e deveres. Direito, já dizia Simon Weil, é o dever de outrem. É um absurdo supor que o direito divino tem sua causa em um outro que não ele, no dever de um outro porque, neste caso, Deus não seria o primo moto imobile de que Aristoteles falou, de modo que Deus e o direito divino são causa sui.

Sendo Deus uma pessoa, os teístas acreditam que podemos ter uma relação pessoal com o Ser Supremo. Sendo uma pessoa, então, podemos dirigir a ele as nossas preces, as nossas orações. O que é oracao senão uma conversação com o Ser Supremo?

Os deístas, por sua vez, negam a a concepção pessoal de Deus. Para os deístas, Deus é impessoal, é uma força impessoal, inconsciente, da força da natureza. Essa concepção é a mesma da escola teosófica de Madame Blavatsky, que foi denunciado por Guenón como promotora de um pseudo-esoterismo, uma falsa iniciação. Há muitos por aí que dizem que não acreditam que Deus seja uma pessoa, que ele possa intervir na vida das pessoas em resposta as suas orações porque, para elas Deus é uma força impessoal da natureza, caindo assim no panteísmo. Essas pessoas nunca orou na sua porca vida e, portanto, não tem legitimidade para falar sobre se a oração funciona ou se não funciona (1)

Para além dos teístas e deístas, há também os a-teístas. Esse “a” privativo mostra a negação da ideia de Deus, quer como pessoa, quer como não-pessoa. Para os ateístas não há um Ser Supremo, não há Deus.

Neste século, Richard Dawkins é de longe a voz mais sonante do ateísmo. Sua obra “God, a delusion” tem sido uma espécie de Bíblia do ateísmo. É certo que as ideias que Dawkins expõe, ou as pseudo-ideias que ele expõe nessa, tem a base em Spengler “God, a failed hipothesys” que é a verdadeira Bíblia do ateísmo. É nesse livro do Spengler que indivíduos como Dawkins, Dennet, Hitchens buscaram a base para suas obras, embora nem todos eles reconheçam isso.

Não havendo Deus, os ateus explicam tudo com base no acaso. Para eles, toda a beleza e ordem que há no universo é fruto do acaso. Dizer que isso é um absurdo chega a ser um eufemismo. A negação de um ser supremo causa e fonte de tudo quanto há nada mais é que a negação do ser e a afirmação do nada. O que é o acaso? É uma lotaria desportiva. Como é que uma loteria, um acaso, pode criar as leis que regem o universo? Como poderia ele criar a ordem? A ordem não vem do caos. O mais não vem do menos (2). O ser não vem do nada (3).

Notas:

(1)          Orar não é o mesmo que dizer palavras. Só há verdadeira oração quando o Espírito Santo inspira as palavras que saem da sua boca. Por outras palavras, somente há oração verdadeira quando não somos nós que falamos mas o Espírito de Deus em nós.

(2)          Cf. René Guenón, o Reino das quantidades.

(3)          Cf. Mário Ferreira dos Santos, A sabedoria do Ser e do Nada.

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