sábado, 10 de fevereiro de 2018

Metafísica

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 “Ser ou não ser, eis a questão fundamental da Metafísica”
Aristóteles


Como é do nosso conhecimento e de todo aquele se dedica ao estudo da filosofia, esta disciplina tem três campos de estudo, os quais são os seguintes:

1)  Metafísica

2)  Gnoseologia

3)  Axiologia

A Gnoseologia é a teoria do conhecimento. A axiologia é a teoria do valor e pode ser divida em estética e ética. A palavra estética vem do grego aisthesis que quer dizer sensação, portanto, a estética que é o afanar-se ao belo e o afastar-se do feio. A ética que é o afanar-se ao verdadeiro e o afastar-se do falso quer dizer costume, mas não costume tomado no seu aspecto prático porque aí teríamos a moral, moris, mas costume tomado enquanto especulativamente, portanto, a ética seria uma especulação em torno do costume, da moris, de modo a alcançar não o núcleo axio antropológico do verdadeiro e do falso mas o núcleo axiológico próprio das ciências que são os valores de verdade e de falsidade.

Enquanto isso, a teoria do conhecimento, a gnoseologia, se debruça sobre como é que se dá o gnoscere, a apreensão do objecto pelo sujeito e aí temos o conhecimento objectivo, mas também há quem alega que no processo de conhecimento o homem não conhece o objecto mas apenas as suas estruturas eidético-noéticas, então, há uma ruptura entre sujeito e objecto.

Quando se estuda a teoria do conhecimento nos deparamos com três tipos de abordagens. Por um lado temos os dogmáticos. Por outro temos os cépticos. E por fim temos os moderados que procuram conciliar os dois extremos porque quer o dogmatismo, quer o cepticismo pecam por seu abstractismo e por seu extremismo.

O dogmatismo afirma a possibilidade do homem conhecer objectivamente o mundo exterior. O cepticismo nega isso. O cepticismo diz que pelo facto do homem não conhecer tudo, então, o conhecimento objectivo é impossível. Ninguém pode negar que o homem não pode conhecer tudo, caso contrário cairíamos no dogmatismo. Porém, também não se pode tomar como demonstrada a impossibilidade do homem conhecer, simplesmente porque não conhece tudo. O homem não conhece tudo, é certo. Mas ele conhece alguma coisa. E por conhecer alguma coisa, ele conhece.

Também dizer que o homem conhece tudo é falso porque há coisas que o homem não conhece. Por exemplo, o homem não conhece a essência de Deus. Mesmo nas religiões superiores, quando um crente diz conhecer a Deus, ele o conhece apenas afectivamente não racionalmente.

Os tipos de conhecimento são: 1) conhecimento racional e 2) conhecimento intuitivo. O conhecimento racional é o conhecimento discursivo. Discurso vem de discorrer, andar daqui para alí e assim por diante. A forma mais famosa de raciocínio é o silogismo, que é um raciocínio em três etapas. Então, temos uma premissa maior, uma premissa menor e finalmente a conclusão. Porém, o silogismo é um mecanismo artificial de raciocínio porque a forma natural de raciocínio do ser humano é a entimema em que há ocultação de uma das premissas.

De qualquer das formas, raciocinar, como dizia Tomás de Aquino, é passar de um conhecimento conhecido para um conhecimento desconhecido. Porém, faz-se isso por meio de um termo médio. Uma das críticas, das grandes críticas contra o silogismo é que ele não nos dá, na verdade, um conhecimento novo porque a conclusão já está, de algum modo, contida nas premissas. Por exemplo: quando se diz aquele famoso silogismo: Todo homem é mortal/Sócrates é homem/Logo, Sócrates é mortal, a mortalidade de Sócrates já está contida na premissa maior porque todo homem significa cada homem, o que diz respeito a Sócrates e a todos os outros homens do passado, do presente e do futuro, se houver um futuro.

Porém, isso não tira o valor do silogismo como um instrumento útil da demonstração. Já dissemos em outros artigos que a filosofia grega distingue-se da filosofia dos outros povos pela sua capacidade de demonstrar as suas teses com o mesmo rigor lógico das demonstrações geométricas (abstracção de segundo grau) como vemos nos pitagóricos, em Euclides, sendo ele também um pitagórico, etc. E já dissemos também que em filosofia a única autoridade é a demonstração. Não adianta servir-se de argumentum autotitactis. Isso não tem nada a ver com filosofia.

Nem todos aceitam o raciocínio como um tipo de conhecimento. Esses são aqueles que dizem que conhecemos as coisas, isto é, a totalidade do real, directamente e não indirectamente, imediatamente e não mediatamente por meio de um termo médio. Esses são os intuicionistas. A intuição, o filósofo O.d.carvalho, a define como a percepção imediata de uma presença. Então, a intuição é um conhecimento directo.

Qualquer estudioso da lógica sabe que o raciocínio se funda sobre as verdades axiomáticas, as verdades per se notas, ou seja, aquelas verdades que são evidentes por si mesmas e que, por conseguinte, não carecem de ulterior prova porque são autoprobantes. Como se chegam a essas verdades? Em filosofia, chega-se a verdades per se notas por meio da aplicação da técnica filosófica levada á suas últimas consequências garantidas que são a permanente fiscalização das etapas percorridas tal como ensinadas e praticadas por Sócrates. E esse método filosófico ou técnica filosófica mais especificamente é a dialéctica.

Mário Ferreira dos Santos define a dialéctica como a lógica da existência. Então, a existência tem uma lógica, uma razão, uma lei de proporcionalidade formal intrínseca. Sabido que é que existir é resistir, então, na existência nós temos uma dualidade, uma bivalência. Sendo assim, a existência obedece a lei da dualidade.

Em Hegel, a lógica é polivalente ou trivalente: tese, antítese e síntese. Tese no grego é thesis, que quer dizer conhecimento ou pensamento positivo, tético. E antítese seria, portanto, uma negação da thesis. Então, a thesis é a afirmação e a antithesis é a negação. Do confronto dessas duas polaridades nós temos a sinthesis de onde vem o termo sintético que é um atributo que se predica ao sujeito mas sem ser da essência do sujeito, porque sin é uma negação de modo que síntese é uma negação daquilo que é tético.

Em Sócrates, o método dialéctico aparece em forma de diálogo. Em que há um interrogante que faz as perguntas e um interrogado que responde as perguntas, se limitando a dizer SIM ou NÃO ou, então, a pedir algum esclarecimento em caso de os conceito usados pelo interrogante se lhe apresentarem equívocos, confusos, etc., ou, então apresentar uma objecção. E assim, por meio de demonstração, com recursos a um critério lógico rigoroso, se chega as verdades per se notas que são aquelas que pertencem ao campo da axiomática.

O homem raciocina por cima das verdades descobertas dialecticamente e a dialéctica como vimos não se funda em entes ficcionais mas na existência humana, na própria realidade. Porém, a presença de duas premissas, uma maior e outra menor que levam a uma conclusão auto-evidente não é suficiente para fechar o raciocínio, i.e, não é suficiente para dar ao raciocínio a sua unidade. É daí que filósofos como Olavo de Carvalho falam de um intuicionismo radical porque para eles o que fecha o raciocínio, dando-lhe a sua unidade é a intuição e daí a sua conclusão de O.d.Carvalho, anunciada em tom solene: “todo conhecimento, ou é intuitivo ou é nada”.

Com o que acabamos de dizer, cremos ter dado uma introdução suficientemente ampla, porém não profunda acerca do tema a que nos propomos examinar que é a metafísica.

Conforme o trecho de Aristóteles que citamos no início deste artigo que diz: “ser ou não ser, eis o problema fundamental da metafísica”, podemos dizer que a metafísica estuda o ser e também estuda o não ser malgrado o estudo do não ser ser uma matéria completamente desprezada nas faculdades de filosofia e não merecer também uma atenção especial por parte daqueles que solipsistamente ou autodidacticamente se entregam com todo afinco ao estudo da filosofia em geral e da metafísica em particular.

Podemos dividir o estudo da metafísica em 1) metafísica geral e 2) metafísica especial. A metafísica geral dedica-se ao estudo da ontologia que é o estudo do ser enquanto ser. Porém, de acordo com os nossos propósitos, vamos classificar a metafísica geral não apenas em ontologia mas em ontologia e meontologia em que a ontologia é o estudo do ser enquanto ser e a meontologia é o estudo do nada enquanto nada.

A metafísica especial pode ser dividida nas seguintes disciplinas:

1)  Cosmologia

2)  Teologia

É claro que no estudo da cosmologia não podemos nos furtar a fazer referência a cosmogénese, assim como no estudo da teologia não podemos passar sem fazer referência a teodicéia que vem de theo que é Deus e Dikhe que é justiça. Mas esses são temas de que nos ocupamos em outros artigos e que, certamente, voltaremos a nos ocupar futuramente em outros escritos.

Mas neste momento, o que nos interessa é apenas olhar para a metafísica do ponto de vista da sua questão fundamental, a questão do ser e do não ser, ou seja, a questão da ontologia e da meontologia.

Já fizemos questão de dizer há pouco que a ontologia estuda o ser enquanto ser porque o ser também pode ser tomado não enquanto ser essendo, isto é, enquanto ente. E aí não teríamos uma abordagem ontológica do ser mas uma abordagem ôntica porque o ente, ou seja, o ser tomado enquanto ente pertence ao contexto beta, ele é composto na sua tectónica de forma e matéria em que a forma nos dá sua estrutura eidética e a matéria nos dá a sua estrutura hiléctica. Mas o ser tomado enquanto ser pertence ao contexto alfa e ele não é composto mas simples, ele é puro acto.

Então, comecemos o estudo da ontologia dizendo que a ontologia vem de ontos que quer dizer ser e logos, razão, nomos, etc. Portanto, a ontologia é o estudo do ser. Porém, como já fizemos questão de dizer, não é qualquer estudo do ser porque a ôntica também nos dá o estudo do ser mas o estudo do ser enquanto ser.

Em seguida, vamos conceituar o objecto da disciplina que aqui estamos examinando. O que é o ser? Quando fazemos essa pergunta, a primeira coisa que aparece na nossa mente é que estamos tentando definir alguma coisa e aí caímos num grande embaraço porque não se pode definir o ser. O ser é um grande indefinível.

Os gregos diziam que definir é declarar o lugar ontológico de um ser ou determinar a essência de um objecto. Essa visão é partilhada por Sócrates e por Platão. Olhando a coisa por esse prisma, bem vê-se que o ser é indefinível, ou seja, o ser não pode ser definido porque ele é a própria definição. Se o ser não é, não pode ser definido porque para que alguma coisa possa ser definida é necessário que ela seja alguma coisa. Portanto, o meon também não pode ser definido.

Quando dizemos que o homem é um animal racional estamos definindo o homem. Essa definição é uma boa definição porque obedece aos critérios de uma boa definição que são os seguintes:

1-  O termo a definir não entra na definição;

2-  A definição deve ser recíproca;

3-   A definição não deve ser negativa;

4-  A definição deve convir ao definido e só ao definido.

Não se pode falar de definição sem se falar de termos porque se definem termos que são a expressão verbalizada ou verbal do conceito e não se pode falar de termos sem se falar de conceitos que são a representação mental de um objecto. Então, o conceito é um esquema eidético. Descartes tomava o conceito como sinónimo de ideia. Porém, ele estava errado. Ideia é a forma de um objecto.

Quando se estudam os conceitos sabemos que os conceitos tem notas que os integram e definem. Essas notas são a extensão e a compreensão. A extensão é o número de indivíduos que são abrangidos por aquele conceito, por exemplo o conceito de homem se aplica não somente aos africanos mas se aplicam também indistintamente aos europeus, aos asiáticos, aos americanos, etc. A compreensão nos dá as notas que vão tornando aquele conceito menos confuso para nós e, portanto, mais claro a nossa mente. Portanto, a compreensão seria a conexão ou a implicação de sentido que nos permite captar o nexo daquele conceito com o conceituado.

Quando conceituamos o animal vemos que esse conceito devido a sua extensão é confuso para nós porque ele se aplica tanto aos animais irracionais como aos racionais mas quando adicionamos ao conceito animal a nota homem este se torna menos confuso. Em que é que o homem se distingue dos outros animais? Ele se distingue dos outros pela sua racionalidade, então, a racionalidade é a diferença específica da espécie homem em relação ao seu género próximo o animal. Então, definir uma espécie é dizer qual é a sua diferença específica. O que é o animal? Podemos dizer que o animal é aquilo que tem anima, alma, que é movido por uma alma. Então, o animal seria um ser animado mas as plantas também são seres animados mas nem por isso dizemos que as plantas são animais. Não obstante, o animal é um conceito confuso porque ele se aplica tanto aos racionais quanto aos irracionais. Sendo um termo geral, o animal não pode ser definido porque definir é definir uma espécie ou seja apresentar a diferença específica de uma espécie em relação ao seu género próximo.

O ser não é um género próximo, ele é um género supremo mas em todo caso é um género e os géneros não se definem mas apenas as espécies. Abaixo das espécies, daquilo que é específico, temos o particular e abaixo do particular temos o singular. Então, temos hierarquicamente conceitos:

1)  Universais

2)  Gerais

3)  Específicos ou particulares

4)  Singulares

Tudo isso é a classificação do conceito apenasmente segundo a sua extensão. Quer os conceitos universais que são os géneros supremos, quer os singulares são indefinidos por definição.

Então, não podemos definir o ser. Porém, o que é que você faz quando você não consegue definir uma coisa? Você, pelo menos, descreve aquela coisa. Por exemplo, hoje em dia, quase todo mundo tem telemóvel mas se você pedir para as pessoas darem uma definição lógica ou formal de telemóvel ninguém será capaz de fazê-lo com a excepção de duas ou três pessoas. Porém, se elas são incapazes de definir o telemóvel, elas podem pelo menos descrever o telemóvel e a descrição é também aceite como uma definição.

Quando olhamos para os tipos de definição temos:

1)  Definição nominal ou formal de acordo com o étimo do termo a ser definido;

2)  Definição real que pode ser explicativa ou construtiva. A definição explicativa é própria das ciências naturais. Explicar vem de ex (fora) e plicare que é fazer as pregar, enrugar, de onde explicar significar desfazer as pregas, desenrugar, enfim, descortinar os nexos causais e, é por isso que dissemos que a ciência é conhecimento pelas causas. A definição construtiva é aquela que encontramos na geometria. Geo é terra e metro é medição. Então, a geometria é a medição da terra. A geometria funda-se na abstracção do segundo grau que é aquela em que dado um ente vai-se abstrair ou seja separar mentalmente do ente a sua propriedade, a sua matéria sensível e tomar-se o ente apenas nos seus aspectos extensistas, no seu aspecto extensivo que pode ser contínuo e aí temos as figuras geométricas e discreto e aí temos os números, os aritmoi mathematikoi, os números matemáticos que é muito mais do que aquilo que vulgarmente se concebe como número, pois o número é olhado apenas na sua categoria quantitativa como uma multiplicidade medida pela unidade como o definia Aristóteles, porém, os pitagóricos, que foram grandes estudiosos dos números, concebiam-no como forma, daí o número, para os pitagóricos, ser uma lei de proporcionalidade intrínseca ou tectónica e não apenas extensista ou predisponente como se concebe hodiernamente.

3)  Definição descritiva, que é aquela em que vamos enumerando os aspectos mais salientes de um objecto. Nesse sentido, é possível definir o ser, descrevendo-o apenas, mas não no sentido de determiná-lo, de circunscrevê-lo.

Suarez diz que o ser é aptidão para existir. Isso não é uma definição. Isso é apenas um atributo do ser, um atributo que é da essência do próprio ser porque um ser que não existe, ou seja, que não tem a potência do existir não pode ser.

Já vimos, em outros artigos, que existir é dar-se fora de suas causas. É ter um ex sistere, ou seja, ter um sistere fora de si mesmo. Dar-se fora de suas causas. Então, o ser tem uma causa.

Partindo da causa do ser, podemos dividir o ser em função dessas várias causas que, em Aristóteles são quatro conforme passamos a expor:

1)  Causa eficiente

2)  Causa material

3)  Causa formal

4)  Causa final

Então, podemos dividir o ser na sua divisão primeira e também na sua divisão última. O ser, na sua divisão última, consiste em ser a se e em ser abalio. O ser a se é aquele que procede de si mesmo, ele é causa sui, ele é causa eficiente de si mesmo. Ele não recebe seu ser de um outro. Então, ele necessariamente é ad aeterno. O ser ab alius é aquele que recebe o seu ser de um outro. O ser ab alius pode ser ad aeterno mas também pode não ser. Por último temos o ser nec ad aeterno sed non a semetipsu.

Para além do ser, vimos que a metafísica também estuda o não ser e aí temos a meontologia, de meon que é o nada. Então, o não ser é o nada. Este nada não é um nada absoluto porque o nada absoluto seria aniquilação do próprio nada. O nada a que nos referimos aqui é o nada relativo porque alguma coisa há e essa tese de que alguma coisa há que é aquela sobre a qual Mário Ferreira dos Santos construiu toda a sua filosofia positiva e concreta, é uma tese que encerra um juízo necessário, um juízo apoditicamente demonstrado e válido no sentido de Kant.

Nas grandes religiões monoteístas do mundo como o judaísmo, o cristianismo e o islamismo, Deus criou todas as coisas do nada. Parece uma contradição porque do nada nada pode ser. Isso é certo. Mas esse nada do qual nada pode ser é um nada absoluto (nihilum), o qual é uma total e completa negação do ser. Porem, o nada ao qual se refere as religiões do qual Deus criou tudo quanto é, é apenasmente uma potência não actualizada, ou seja, é o ser tomado enquanto virtualmente e não actualmente, que seria o ser em acto como o é o próprio Deus.

O estudo da meontologia não pode ser desligado do estudo da ontologia e nem este último daquele primeiro porque, como diziam Aristóteles e os escolásticos, “nada passa da potência para o acto sem ser por meio de algo que já esteja em acto”. O que está em potência? É o nada, o nada relativo (nihil). O que está em acto? É o ser. Deste modo, o nada não pode ser o princípio do ser. O ser so pode ter princípio ou em si mesmo e aí seria um ser a semetipsu ou, então, ter o seu princípio em um outro ser e aí temos o ser ab alius.

No capítulo inaugural da génesis, temos a seguinte revelação: “no princípio criou Deus os céus e a terra, E a terra era sem forma e vazia”. O que significa “no princípio”? Se dissemos que antes da criação não havia tempo, então, esse princípio não pode ser concebido temporalmente como princípio do ano que é Janeiro, princípio da semana que é domingo e assim por diante.

Sabemos que a filosofia é o afanar-se ao saber. Mas não qualquer saber. Veja que o termo filosofia foi criado por Pitágoras. Então, é preciso retornar ao pitagorismo para ver o que era sabedoria para o filósofo de Samos. Para Pitágoras a sabedoria era a mathesis suprema, a mathesis megiste. Mathesis é o conhecimento ou pensamento positivo. Megiste quer dizer supremo, máximo. Então, mathesis megiste de onde vem a mathematica, mathemo mais thesis, quer dizer instrução suprema, quer dizer o máximo pensamento positivo, quer dizer o supremo conhecimento positivo.

Porquê é que isso é importante? Isso é importante porque a mathesis ou matesis (em portugês) é que vai estudar os princípios enquanto princípios. Se tomarmos o termo princípio temporalmente, então teremos que admitir que antes de Deus criar o mundo ele criou o cronos, o tempo. Mas se o tempo surge mais tarde com a criação dos luminares, i.e., do sol, da lua e das estrelas que é o que vai marcar o tempo, então, o princípio, naquele trecho do Génesis, tem que ter um outro significado.

Não podemos confundir princípio com causa. Toda causa é um princípio mas nem todo princípio é uma causa. Conforme demonstramos em artigos anteriores, uma causa é aquilo que dá o ser a outro. O pai dá o ser ao filho, logo, ele é causa do filho e o filho é o efeito daquele. O pai é causa formal e material do filho porque o filho tem a forma do pai e é feito da matéria de que é feito pai.

Agora, nem todo princípio é causa de…por exemplo, tomemos o ponto. Sabemos que o ponto é o princípio da linha e que a linha é o princípio do plano e o plano o princípio do cubo. Porém, seria totalmente falso dizer que o ponto é causa da linha, que a linha é causa do plano e que o plano é causa do cubo. O ponto não pode ser causa da linha. Nem uma causa eficiente, nem uma causa material, nem uma causa formal e muito menos uma causa final.

Dessarte, se a expressão “no princípio” não pode ter um sentido temporal, então ele tem que ter um sentido intemporal, um sentido ad aeterno. Não nos esqueçamos que a mathesis, que é a sabedoria suprema, das verdades per se notas, que convêm a axiomática, é a ciência dos princípios enquanto princípios. Ora, isso corrobora o que estamos dizendo acerca da expressão que estamos analisando de que ela não se refere a uma unidade temporal mas intemporal, portanto, no princípio quer dizer no próprio Deus, no próprio ser supremo, na própria sabedoria suprema, que no cristianismo é o próprio Cristo, o logos, a lei da proporcionalidade intrínseca.

Por último, examinemos a parte que diz que “a terra era sem forma e vazia”. Uma coisa sem forma é uma matéria amorfa. É matéria pura. Ela era vazia, não no sentido do nada absoluto (nihilum) mas no sentido do nada relativo (nihil). Ela era vazia no sentido em que ela carecia de ser ab alius e não de ser a se porque diz a revelação da génesis que o Espírito de Deus (ser a se) se movia sobre a face das águas.

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