terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Um mito chamado “Mecanismo de preço”

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O mecanismo de preço não passa de uma paródia mecanicista da economia. O mecanismo de preço não existe. O preço não é uma máquina e não se comporta como tal.


No seu célebre livro “a riqueza das nações”, o filósofo escocês Adam Smith inventa a teoria da mão invísivel para explicar a eficiência do mercado, ou seja, explicar como é que agentes económicos atomistas, seguindo seus instintos egoístas, acabavam contribuindo para um maior bem-estar social do que se se propusessem a fazê-lo intencionalmente, ou melhor dizendo, do que se seguissem um plano, digamos, a moda de uma economia centralmente planificada.

Os economistas têm interpretado a mão invisível de Smith como sendo “o mecanismo de preço”. Essa interpretação é bastante interessante a despeito de os economistas não saberem o que querem dizer com isso a excepção de dois ou três.

O mecanismo de preço não passa de uma paródia mecanicista da economia. O mecanismo de preço não existe. O preço não é uma máquina e não se comporta como tal. Com o advento do mecanicismo com Descartes que foi amplamente absorvido por Newton, entrou na moda crer-se que o mecanicismo era a última palavra do saber, porém, hoje sabemos que não é, mormente com o advento da nova física, a física de Planck, Einstein, etc.

Essa crença de que o mecanicismo era sinónimo de rigor científico serviu de inspiração para que August Compte fundasse o seu positivismo que nada mais foi que uma tentativa de transformar as ciências sociais numa espécie de física no sentido mecanicista. Este foi um dos maiores erros que o pensamento moderno cometeu, o qual perdura até hoje.

Compte inventou sua teoria dos três estados: 1) estado teológico, 2) estado metafísico e 3) estado positivo. É claro que esses estados não correspondem a nenhum momento específico da história da humanidade mas Compte, dentro do seu teatro mental, imaginava que estava falando da realidade ao invés de entes ficcionais.

O positivismo como uma corrente de pensamento que procura interpretar a ordem social falha redondamente em prover essa interpretação. Ao tentar imitar a física, o positivismo assinou seu atestado de impotência no que tange a compreensão dos factos sociais ao mesmo tempo em que é incapaz de fornecer os nexos causais desses mesmos factos, ou seja, explicá-los, pela simples obviedade de que os factos sociais só podem ser compreendidos e não explicados porque eles estão na ordem das ciências culturais e não no das ciências naturais.

O positivismo assim como o idealismo (alemão)são frutos do kantismo. Há filósofos brilhantes mas que por causa do erro de Kant que eles endossaram acabaram resvalando no absurdo e chegando a conclusões pueris e tais são os casos de Hegel, Schopenhauer, etc. É desses erros que surgiram o existencialimso ateu de Sartre, o marxismo, o nihilismo, o desesperismo, etc.

 O erro de Kant que permeia toda sua filosofia foi o de cair no cepticismo, crendo que na impossibilidade de o homem racional conhecer a coisa em si (noumeno), dizendo que esse só podia conhecer os seus fenómenos, o que do ente aparece. Kant caiu nesse erro pueril por não conhecer a teoria dos juízos virtuais de Aristóteles. Na verdade, ele nunca leu Aristoteles. Isso não é de admirar porque há grandes filósofos, grandes mentes que nunca leram Aristóteles tal como Descartes, Leibnitz, etc.

Sendo que o positivismo é procedente do kantismo, ele afirma tal como o kantismo, o cepticismo. É impossível ser um positivista sem recusar o conhecimento da coisa em si e a firmar o conhecimento apenas do fenoménico. É esse pensamento que Compte procura transplantar para as ciências sociais porque reduzindo todo facto social ao fenoménico só lhe resta refugiar-se no método das ciências naturais, ou que as ciências naturais usam para explicar os fenómenos da natureza.

Quando se faz isso, então, caímos no mecanicismo e começamos a olhar para o preço como uma máquina e começamos a falar em mecanismo de preço como se o preço fosse um motor de explosão. É claro que essa é uma visão falseada da realidade.

A ideia do mecanicismo nos conduz a uma outra ideia que é a do determinismo do movimento desse mecanismo. Pelos cálculos da astro-física podemos determinar onde estarão o corpo celeste A, B, C no tempo x, y, z. Crer que podemos fazer o mesmo com os preços é acreditar num quadrado redondo. Esse positivismo nas ciências sociais deu origem a construção de milhares de modelos, principalmente na economia, porém, nunca nenhum desses modelos conseguiu prever as várias crises financeiras nacionais e internacionais, eles nunca conseguiram prever nenhuma crise económica. Porquê? Eis a pergunta.

Não queremos, de modo algum, desmerecer os esforços gigantescos e esplendorosos feitos na área da física mecânica mas apenas dar uma notícia que é que o mecanismo, conforme já está arqui-provado, só funciona no universo macrofísico, enquanto no campo da microfísica como a física atómica e subatómica, ela falha redondamente.

Partindo desse ponto, podíamos ser tentados a pensar que o mecanicismo funciona na macroeconomia, por exemplo, e não na microeconomia. Porém, sabe-se que ela não funciona nem num, nem noutro campo. Nunca conseguiu-se prever a crise das taxas de juro e das taxas de câmbio com recurso aos nossos modelos mecanicistas mais famosamente conhecidos como modelos econométricos.

Esses modelos falharam, falham e continuarão falhando pelos séculos dos séculos porque o fundamento da realidade económica é microeconómica e não macroeconómica. A macroeconomia é uma ficção que você constrói por cima da microeconomia. As taxas de juro, as taxas de câmbio, conhecidos também como os grandes preços não valem nada sem a existência dos pequenos preços ou preços relativos como os preços da banana, do pão, do combustível, etc.

No campo do micro, não há determinismo mas sim livre-arbítrio, de modo que você não pode ter uma equação para explicar isso. Você pode dizer: no verão, o preço da geleira será mais alto, porém, isso não impede que um vendedor, agindo na contra-mão da racionalidade económica, decida vender suas geleiras a um preço promocional.

Uma vez que o consumidor e o produtor agem conforme seu livre-arbítrio e não conforme a uma regra predeterminada, prever as suas acções é um empreedimento probabilístico infrutífero. Com isso não se quer desencorajar a actividade especulativa das ciências sociais e sua produção de leis gerais. Porém, importa não perder de vista que uma coisa são as leis gerais e que outras bem diferentes são a realidade específica e concreta de cada indivíduo, de cada actor social.

Por exemplo, em economia, sabe-se que a lei da procura de um bem normal diz o seguinte: “coeteris paribus, se o preço de um bem X aumentar, a quantidade procurada desse bem irá reduzir”. Ora, o que isso é a não ser apenas uma regra geral. Porém, o consumidor deve reduzir sempre a quantidade demandada do bem X quando seu preço aumentar? Não me parece sensato. Não somos uma máquina, de modo que temos que examinar a nossa situação particular e concreta e elucidar a tensão que existe entre aquela regra geral e a nossa situação particular e concreta. É a isso que se chama o exercício da sabedoria.

Porém, neste país, as pessoas só se limitam a repetir o que está contido nos manuais sem, ao menos, deixar passar aquilo pelo filtro da sua inteligência. Elas imaginam que por decorarem e repetirem que nem papagaios todas as regras gerais, ou leis, das suas disciplinas académicas que isso é sinónimo de inteligência e não sabem que inteligência, longe de ser a capacidade operacional, conforme é medida pelos testes de Q.I, (1) é a capacidade de descobrir a verdade.

Nunca encontrei ninguém neste país, nem mesmo entre os professores mais conceituados de ciência económica que não se debruçassem sobre “o mecanismo de preço” com  ares de quem estava anunciando a última palavra do saber, a panaceia para todos os males, sem se dar conta do grande erro de que estava sendo paladino.

Nota:

(1)          Eu acredito no Q.I., mas não nos testes de Q.I. porque estes não medem a inteligência mas sim a capacidade operacional, que é algo totalmente diferente. 

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