Nem tudo que as
pessoas dizem ser lógico de facto o é. Ter um pensamento correcto é algo tão
raro que a maior parte das pessoas só têm opinião embora jurem certeza e não
sabem que estão apenas no campo do verosímil. Porém, ter opinião nem sempre é
mau. A opinião pode ser tomada como sinal de que a pessoa venceu o estado de
dúvida se bem que há quem veja a dúvida como essencial para a descoberta do
fundamento para o conhecimento.
Quem nunca encontrou alguém que respondesse as suas afirmações
com a famosa expressão “é lógico”, porém, quando você vai ver, nenhuma delas
tem a mínima noção do que seja lógica. Esse vício de usar termos cujo
significado desconhecemos é um desserviço a razão porque a edificação dela só
se dá pela percepção, entendimento e compreensão das coisas que vemos, das
palavras que ouvimos e daquilo sobre o qual meditamos em nossos corações de
modo que se eu fico repetindo palavras que não entendo disso não resultará
nenhum proveito para mim.
Quando eu digo: “o gato come o rato” e alguém diz:
isso é lógico, o que é que essa pessoa está querendo dizer com isso? Qualquer
estudioso de lógica sabe que ela é uma disciplina do pensamento mas não
qualquer pensamento mas sim do pensamento correcto. Isso significa que quando
alguém diz que a sentença “o gato come o rato” é lógico, ela está dizendo que o
pensamento encerrado nessa frase é correcto.
Ora, como é que você, assim de cara, diz que um
pensamento é correcto? Para sabermos se um pensamento é correcto há duas vias,
uma directa e outra indirecta. A via directa é a via da intuição. A via
indirecta é a via do raciocínio. A via que o homem mais usa é a via da intuição
e só depois a do raciocínio. Quer dizer, o homem intui primeiro e só depois é
que raciocina.
Outro dado é que quando você diz “isso é lógico”
você está expressando um certo grau de conhecimento de um certo objecto. Na
verdade, nós conhecemos os objectos com gradações diferentes. E para o
entendimento disso é de grande ajuda a teoria dos quatro discursos exposta por
Olavo de Carvalho em “Aristóteles em Nova Perspectiva”. Naquela obra Olavo diz
que os quatro discursos que percorrem toda obra de Aristóteles são: 1) a
poética, 2) a retórica, 3) a dialéctica (tópico) e 4) a lógica (analítica).
Na poética ou no mito-poético entramos no campo do
possível que é também o campo da simbólica. Na retórica entramos no campo da verosimilhança,
daquilo que parece e que parece porque é o que o seu grupo de interesse diz.
Você acredita juntamente com seu grupo. Na dialéctica entramos no campo do
provável. Na lógica entramos no campo daquilo que é certo, o campo da certeza.
Dizer de tal e qual frase, “isto é lógico”, é enunciar
uma certeza. Uma certeza lógica porque há também uma certeza ontológica. A
certeza lógica é aquela adesão firme do intelecto a coisa conhecida sem temor
de erro. Isso é assim porque a lógica sempre parte da mente para as coisas. Se
a sua lógica partir das coisas para a mente isso já não é lógica mas ontologia
de modo que a certeza ontológica é a adesão da coisa conhecida a nossa
estrutura eidético-noética.
Assim, quando você diz “isto é lógico”, isso
significa que a sua mente está aderindo a coisa. Mas isso não significa que
você tem certeza lógica. Para você chegar a isso importa que você faça essa
adesão sem temor de erro. Agora, a certeza não se dá porque sim. Para que haja certeza
é preciso que haja evidência. E só é evidente aquilo que é passível de demonstração,
de prova. A evidência a que se refere não é a evidência solta no ar mas a evidência
da verdade. Portanto, há aqui um triângulo VERDADE, EVIDÊNCIA, CERTEZA.
A semelhança da certeza que pode ser lógica e
ontológica, a verdade também pode ser lógica e ontológica. A verdade é sempre
uma adequação entre dois termos dos quais um desses termos é o intelecto e o
outro a coisa conhecida. Quando há adequação do intelecto com a coisa tem a
verdade lógica. Quando temos a adequação da coisa com o intelecto temos a
verdade ontológica. Ou seja, a verdade ontológica é a verdade da coisa tomada
em si mesma como quando dizemos: este objecto é verdadeiramente ouro.
De tudo isso, podemos ver que aparentemente a
certeza é algo muito simples o que é uma hipérbole mas quando você vai tentar
elaborar a coisa mais intelectualmente ai você vê a complexidade da coisa.
Quando você se dá conta disso, você descobre que, na maior parte das vezes, as
pessoas não têm certeza a respeito do que dizem ou escrevem não passando a
maior parte das coisas que eles dizem de meras opiniões. Uma opinião é aquilo
que está entre a dúvida e a certeza. De modo que quando as pessoas dizem “isto
é lógico” é mais lógico tomar isso apenas como uma opinião (doxa) do que como uma certeza o que não
é um bom sinal para o nosso tempo mas um sinal de perda de capacidade lógica.
Post scriptum:
A proliferação de opinião hoje em dia não apenas
deteriora o valor dessas opiniões mas também mostra que o homem moderno é
incapaz de certeza. Porém, nem tudo é mau com a opinião porque ter a capacidade
de ter opinião já é também um sinal de superação da dúvida se bem que há vozes
que veneram a dúvida como o caminho não apenas da descoberta do EU como em
Descartes mas também da descoberta de algo menos subjectivo e mais objectivo
como as nossas circunstâncias e é isso que faz as ciências.
Uma vez que as ciências estão preocupadas em
responder as questões sobre o “como” isso mostra que elas estudam apenas as
nossas circunstâncias. A ciência não pode resolver o problema do EU que é o
centro do psiquismo humano. Ele pode é apenas resolver as questões ligadas as
circunstâncias desse mesmo EU. Porém, essa é uma questão que vamos desenvolver
em outros artigos futuros.
A ser continuado…
Nenhum comentário:
Postar um comentário