O medo está ligado a carência das virtudes cardeais:
1) justiça, 2) prudência, 3) temperança e 4) fortaleza. Assim, no quadro das
virtudes cardeais, o medo está ligado mais apropriadamente a privação de
fortaleza.
Num outro ensaio vamos ver como é que o medo está
também ligado a carência das virtudes teologais (fé, esperança e amor), mais
apropriadamente a privação do amor ao próximo como fonte-origem da fortaleza.
Queremos neste artigo meditar em torno do tema do
medo. Mas antes de entrarmos propriamente nesse tema importa referir que o medo
tem uma dimensão psicológica e uma dimensão ética. Isso pode parecer até mesmo
uma tautologia porque a psicologia também pertence ao campo de estudo da ética.
Não falamos apenas da psicologia prática mas também da psicologia teórica ou
especulativa.
Portanto, o medo é um convite a psicologia e a
psicologia é uma disciplina ética e a ética pertence ao campo dos estudos
gerais dos axios grego, dos valores,
de onde temos a axiologia.
A parte da ética que estuda o medo que é o tema de
que estamos tratando é a parte das virtudes. A virtude é habitus. Portanto, a virtude resulta do hábito. Quando certas práticas
se sedimentam na psique humana elas se tornam habituais, ela se tornam num hábito.
Nem todos os hábitos são virtudes mas apenas os bons habitus. Se temos uma base de dados com uma série de bons ou maus
hábitos podemos construir uma tendência desses hábitos, sejam eles bons ou maus
de modo que a virtude é uma tendência, é um tender, um tender para o bem e o vício
é um tender para o mal.
As acções sempre tendem para um fim, porque tender
para o nada é para nada tender. O que é um absurdo afirmar que há acções que
tendam para o nada. Todas as acções tendem para algo porque algo há e essa é
uma tese de validade universal porque apodíctica, porque necessária.
Na suma teológica, Sto.Tomás de Aquino divide as
virtudes em virtudes cardeais e virtudes teologais. Quatro são as virtudes cardeais,
a saber: 1) justiça, 2) prudência, 3) temperança e 4) fortaleza. As virtudes
teologais são três: 1) fé, 2) esperança e 3) amor.
As virtudes cardeais são aquelas que resultam do hábito.
Quando falamos que virtude é hábito, estamos a falar dessas virtudes, das
virtudes cardeais que também podem ser divididas em virtudes éticas e virtudes
dianoéticas.
As virtudes éticas são o tender a aproximar-se do verdadeiro
para afastar-se do falso no seu dia-a-dia, na sua relação com os outros homens.
As virtudes dianoéticas são o fazer o mesmo exercício na vida intelectual, o
que nos leva ao conceito de honestidade intelectual. Podemos resumir o que
dissemos acerca das virtudes éticas e dianoéticas dizendo que as virtudes
éticas estão no aspecto prático da virtude e as virtudes dianoéticas estão no
aspecto especulativo da virtude.
O tema a que estamos dando o exame que estamos fazendo
aqui está ligado mais directamente ou mais apropriadamente as virtudes cardeais
de modo que não vamos tecer nenhum comentário sobre as virtudes teologais ao
menos que esta se torne necessária.
No quadro das virtudes cardeais vemos que o medo está
ligado a fortaleza que é a coragem. Não estamos dizendo que o medo é oposto da
coragem. De modo nenhum. A coragem opõe-se a covardia. Assim também a ousadia
se opõem a timidez, ao medo.
Ps: num outro ensaio vamos ver como é que o medo está
também ligado a carência (1) das virtudes teologais, mais apropriadamente a carência
do amor, do amor ao próximo como fonte-origem da fortaleza.
Nota:
(1)
Devemos evitar
confundir privação com carência. Só há privação quando há virtualização de uma
das possibilidades de um determinado ente. Por exemplo, um cego está privado de
visão mas ele não carece de visão. A carência se dá quando um determinado ser
não pode actualizar determinada possibilidade por essa pertencer ao conjunto
das suas possibilidades. Por exemplo, uma pedra carece de visão mas não está
privada de visão.
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